O Estado de São Paulo, n. 45283, 10/10/2017. Economia, p.B7

 

 

 

 

 

O destino da MP 784

Por: Marcelo Barbosa

Chegou o momento da discussão e deliberação, na Câmara dos Deputados, do projeto de lei de conversão da Medida Provisória n.º 784/17, que visa disciplinar o processo administrativo sancionador da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Banco Central do Brasil.

Há pontos do projeto que merecem ajustes, como a dispensa do reconhecimento da ilicitude para admissibilidade de propostas de termos de compromisso, a qual não constava do texto original da medida provisória. Não havendo tal dispensa, provavelmente presenciaremos a extinção, por desuso, do termo de compromisso, instrumento de utilidade inquestionável – e, por tabela, a inépcia do fundo de desenvolvimento do mercado, uma vez que este seria alimentado com recursos oriundos de ter- mos de compromissos.

No entanto, outros aspectos importantes vêm sofrendo críticas que merecem uma segunda análise.

Por exemplo, a elevação dos valores máximos das penalidades. Alguns críticos simplesmente torceram seus narizes para a ordem de grandeza do aumento. Outros se preocuparam em apontar argumentos menos pedestres e contribuíram com propostas alternativas, como a de fixação de múltiplos no lugar de valores.

Há que se considerar, entretanto, que o incremento de valores máximos está sendo proposto após longuíssimo período durante o qual não apenas incidiu a desvalorização monetária como também o mercado se desenvolveu enormemente e todos os valores envolvidos atingiram patamares muito superiores aos anteriormente vigentes.

Além disso, é preciso considerar que os novos “tetos” serão aplicados em caráter excepcional e de forma devidamente fundamentada, tal como já ocorria em relação aos valores máximos hoje vigentes. A definição dos valores das penalidades no caso concreto depende- rá, como se sabe, de regras de dosimetria que a CVM fixará após processo de discussão que incluirá audiência pública. Tais regras refletirão os parâmetros que garantirão a devida proporcionalidade na aplicação das penalidades.

Discute-se também a imposição, ao acusado, do ônus de provar aquilo que alega, como se isso afrontasse as normas processuais hoje em vigor. Na realidade, o projeto de lei de conversão não alivia o acusador do ônus de provar suas alegações. Os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência não afas- tam do acusado o dever de consubstanciar, por meio de provas, o que alega. Neste ponto, o projeto cuidou apenas de fechar a porta para defesas sem substância, que na prática acabam tornando ainda mais difícil o exercício do poder do Estado de dissuadir condutas ilícitas no âmbito do mercado de capitais.

Houve também questionamentos quanto à forma de estruturação do Fundo de Desenvolvimento do Mercado de Valores Mobiliários. Entretanto, a despeito da natureza meramente contábil do Fundo e das limitações decorrentes do regime jurídico dos gastos públicos, a existência do Fundo representa um avanço importante.

Suas finalidades são de interesse público inquestionável: desenvolvimento do mercado de valores mobiliários e inclusão financeira, através de projetos a serem estruturados pela CVM, de acordo com diretrizes que serão fixadas pelo Conselho Monetário Nacional.

O Fundo será um meio de realização de importantes políticas públicas. Ainda que seus recursos estejam sujeitos a restrições já conhecidas, é mais do que possível se construir, por meio de diretrizes adequadas e projetos bem estruturados, um caminho para sustentar a formação de capitais para investimento em mercado de valores mobiliários.

Discutiu-se, também, a utilização dos recursos do Fundo para realizar a indenização dos investidores que tenham sido lesados pelas condutas objeto do termo de compromisso. Ocorre que tal preocupação já está adequa- damente atendida, uma vez que a lei já prevê, como obrigação daquele que propõe o termo de compromisso, indenizar os prejuízos causados.

É preferível, portanto, que se mantenha a destinação originalmente proposta para o Fundo, e trabalhar, junto ao Conselho Monetário Nacional, ouvindo-se os agentes de mercado, na definição de projetos que sejam efetivas ferramentas de desenvolvimento de mercado.

Há que se considerar, ainda, que a CVM passará a poder recorrer ao acordo de leniência, tendo, com isso, mais um instrumento que, bem utilizado, poderá contribuir de forma efetiva para o fortalecimento de sua capacidade de disciplinar o mercado.

Os deputados têm diante de si a importante missão pública de discutir o projeto, promovendo no texto os ajustes que entenderem pertinentes para que os órgãos reguladores sejam finalmente dotados dos instrumentos necessários à preservação da higidez do Sistema Financeiro Nacional.

 

 

 

 

Revisão de Orçamento de 2018 pode ser adiada

Por: Adriana Fernandes

 

Adriana Fernandes / BRASÍLIA

 

A área econômica do governo vê com grande preocupação a possibilidade de o governo adiar para depois da votação da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer o envio da revisão da proposta de Orçamento de 2018 e de medidas que vão sustentar o aumento das receitas no ano que vem. Entre elas, a elevação da contribuição previdenciária de 11% para 14% dos servidores e o adiamento da revisão de aumentos salariais previstos para 2018.

Em meio às negociações para barrar a segunda denúncia, pelos crimes de organização criminosa e obstrução de Justiça, o presidente desistiu de marcar uma data para o envio da revisão do Orçamento de 2018, com medidas para conter gastos com os servidores e aumento de receitas, como tributação de fundos exclusivos, voltados a clientes de alta renda. Como essas medidas são impopulares, ele foi aconselhado por aliados políticos a deixá-las em banho-maria.

No entanto, R$ 2 bilhões devem ser liberados na próxima semana, apurou o Estadão/Broadcast. Isso pode ajudar a aumentar o desbloqueio de emendas. Pela legislação, a liberação das emendas parlamentares obriga- tórias é feita de acordo com um porcentual proporcional ao volume liberado.

O valor é adicional aos R$ 9,8 bilhões do total de R$ 12,8 bilhões de despesas do Poder Executivo que foram descontingenciados. O restante está numa reserva a ser liberada que pode aumentar o valor das emendas. O desbloqueio de R$ 12,8 bilhões abriu espaço legal para a liberação de R$ 1 bilhão em emendas.

A área econômica está insistindo para a que revisão do projeto de Orçamento seja encaminhada logo para que os prazos de tramitação no Congresso comecem contar. Do contrário, ficam apertados e complicam as negociações até o fim do ano, explicou um técnico.