O globo, n.30755 , 20/10/2017. PAÍS, p.4

PGR VÊ GEDDEL COMO CHEFE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

ANDRÉ SOUZA

 

 

Raquel defende que ex-ministro continue preso; Fachin concorda

Em parecer no qual defendeu a manutenção da prisão do ex-ministro Geddel Vieira Lima, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que ele parece ter assumido a posição de “líder de organização criminosa” que desviou dinheiro público. Ela também defendeu a abertura de inquérito contra o irmão de Geddel, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), argumentando que, “mais do que indícios, há prova” de materialidade do crime. Lúcio é suspeito de ter ajudado a ocultar R$ 51 milhões encontrados no “bunker” de Geddel em Salvador.

O ministro Edson Fachin atendeu ao pedido de Dodge e manteve a prisão, dizendo ter observado em Geddel “a efetiva propensão à reiteração delitiva que, neste momento, só se afigura possível de ser repelida com a mais grave das medidas cautelares”.

“Realço que é investigada uma poderosa organização criminosa que teria se infiltrado nos altos escalões da Administração Pública, e que seria integrada, segundo indícios já coligidos, por um exMinistro de Estado e o ex-Presidente da Câmara dos Deputados”, escreveu Raquel Dodge, referindo-se a Geddel e a Eduardo Cunha.

Geddel foi preso em julho por ordem do juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília. Dias depois, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região mandou soltá-lo. Em setembro, porém, após a descoberta dos R$ 51 milhões em um apartamento a menos de 1km de onde ele mora, foi preso novamente. O ministro do STF concordou com o parecer de Dodge em outros dois pontos: determinou a conversão da prisão preventiva de Gustavo Ferraz, ex-diretor-geral da Defesa Civil de Salvador, em prisão domiciliar; e mandou que medidas semelhantes fossem aplicadas a Job Ribeiro Brandão, assessor de Lúcio Vieira Lima. Digitais dos dois foram encontradas no bunker de Geddel. Tanto Brandão como Ferraz ficarão sob monitoramento eletrônico e pagarão fiança de cem salários mínimos.

Em parecer no dia 16 de outubro, Raquel escreveu que Geddel “monitorou e constrangeu Raquel Pitta, esposa de Lúcio Bolonha Funaro, doleiro e colaborador da justiça, com a intenção de influenciar o marido a não colaborar com as investigações”. Assim, concluiu: “Em um primeiro momento, Geddel Quadros Vieira Lima violou a ordem pública e pôs em risco a aplicação da lei penal ao embaraçar investigação de crimes praticados por organização criminosa. Num segundo momento, passados nem dois meses do primeiro, reiterou a prática criminosa (reiteração delitiva) ao ocultar mais de cinquenta milhões de reais de origem criminosa. Fez muito em pouco tempo”.

Quando foi preso pela segunda vez, Geddel ficou calado durante depoimento. A cautela pode se justificar por um motivo simples: segundo ele próprio contou à Polícia Federal (PF), seu advogado sumiu. Ele só apareceu no fim da audiência, quando as perguntas já tinham sido feitas.

Em 5 de outubro, Raquel Dodge pediu abertura de inquérito para investigar participação de Lúcio na ocultação do dinheiro. Seis dias depois, Fachin determinou a abertura da investigação.

“A instauração de inquérito criminal pressupõe indícios mínimos de materialidade e autoria de fato definido como crime. No caso concreto, mais do que indícios, há prova da materialidade delitiva do crime de ocultação de mais de cinquenta milhões de reais — dinheiro decorrente de propina, ao que apontam as investigações — escondidos em malas naquele apartamento de Salvador”, escreveu Raquel.

“Várias persecuções criminais de combate à corrupção dos últimos anos trazem indícios de que Geddel Quadros Vieira Lima — e possivelmente seu irmão, o deputado federal Lúcio Quadros Vieira Lima — tem se valido de interpostas pessoas para prática de crimes”, acrescentou a procuradora-geral.

Procurado, Lúcio Vieira Lima disse que não teve acesso aos autos e que apenas seu advogado poderia comentar. O GLOBO tentou contato com a defesa de Geddel, mas não conseguiu.