Título: Temor de decidir
Autor: Valadares, João ; Gama, Júnia
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2012, Política, p. 2

Maioria dos integrantes da CAE do Senado evita se posicionar sobre o fim do 14º e 15º salários, que será votado no dia 20

Após a garantia do senador Delcídio Amaral (PT-MS) de que o projeto para acabar com a farra dos salários extras vai à votação no próximo dia 20, a maioria dos senadores que integram a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) fugiu do tema. Levantamento realizado pelo Correio, desde terça-feira da semana passada, aponta que, dos 27 integrantes da comissão, 14 preferiram não se manifestar sobre o assunto e 11 declararam ser contra o recebimento dos rendimentos adicionais. O senador Ivo Cassol (PP-RO) foi o único que admitiu abertamente o desejo de continuar ganhando dois salários a mais do que qualquer trabalhador brasileiro. O senador Luiz Henrique (PMDB-SC) estava se recuperando de uma cirurgia e, por isso, não falou.

Para Ivo Cassol, o salário de R$ 26,7 mil pago aos senadores é muito pouco. Ele afirmou que utiliza grande parte do dinheiro com o pagamento de remédios e tratamento para pessoas pobres. No início da semana passada, logo depois de a Receita Federal instaurar procedimento investigatório para apurar o calote no IR, líderes de bancada fizeram uma defesa veemente da extinção da benesse. Nos bastidores do Senado, no entanto, o sentimento era de descontentamento.

A maioria dos 27 senadores alega não poder emitir opiniões sobre o tema por não conhecer o projeto. É o caso, entre outros, do senador Lobão Filho (PMDB-MA), vice-presidente da CAE. Ele sustenta que "ainda" não tem uma definição sobre o assunto porque não teve tempo de analisar a proposta, apresentada há mais de um ano pela então senadora e atual ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann.

Falta de tempo

A justificativa de Lobão Filho esbarra no fato de tratar-se de um texto de apenas duas páginas, que pode ser lido em poucos minutos. O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), ao ser procurado, alegou que precisava ler antes o projeto. Depois de fazer isso, ele posicionou-se favoravelmente à eliminação dos pagamentos.

Há casos esdrúxulos como o do senador João Vicente (PTB-PI). O gabinete do parlamentar disse ao Correio que o senador votaria "a favor do que o plenário aprovasse". Quando a reportagem insistiu para que João Vicente se posicionasse, a assessoria respondeu que ele poderia ser "o último a votar", para acompanhar a decisão da maioria.

Para o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), os senadores que alegam estar "refletindo" sobre o tema estão, na verdade, esquivando-se do ônus de defender a manutenção dos benefícios. "Os 14 que não se posicionaram são todos a favor de manter os salários extras, mas não têm coragem de falar", avalia. O professor teme que, caso a sociedade não fiscalize a aprovação do projeto, os parlamentares acabem rejeitando o texto. Segundo a secretaria-geral do Senado, a apreciação do projeto em questão é feita por voto aberto, a não ser que um dos senadores apresente um requerimento definindo que o voto seja secreto. Nesse caso, a escolha de cada parlamentar não seria conhecida pelo público. "Se na hora da votação não houver fiscalização, eles devem manter os salários. Caso o voto seja aberto é diferente, porque o ônus político de rejeitar um projeto desses é muito grande", acredita Caldas.

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 12/03/2012 02:42