O Estado de São Paulo, n.45279 , 06/10/2017. Política , p.A8

 

 

 

 

 

Battisti fica preso por ‘tentativa de fuga’

Juiz converte em preventiva prisão em flagrante do italiano alegando que ele ‘procurava se evadir do território nacional’ por temer extradi

Por: Fausto Macedo / Julia Affonso / Luiz Vassallo

 

Fausto Macedo

Julia Affonso

Luiz Vassallo

 

O juiz Odilon de Oliveira, da 3.ª Vara Federal de Campo Grande, decretou ontem a prisão preventiva de Cesare Battisti, condenado por homicídio na Itália, apontando “tentativa de fuga” dele por temer ser extraditado para seu país de origem, onde foi condenado à prisão perpétua por terrorismo nos 1970. Battisti havia sido preso em flagrante anteontem, tentando atravessar a fronteira do Brasil com a Bolívia. Com ele, a Polícia Federal apreendeu US$ 6 mil e ¤ 1.300, além de “documentos diversos” e o que os agentes rotularam de “objeto não classificado”.

“A ordem pública recomenda a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva”, afirmou o juiz. “O contexto geral da ocorrência faz concluir, ao menos em caráter provisório, que Cesare Battisti procurava se evadir do território nacional, temendo ser efetivamente extraditado.”

O magistrado afirmou ainda que “considerava essa tentativa de fuga, nos limites de uma convicção provisória, dever ser ela levada em conta também para efeitos de garantia da efetiva aplicação da lei penal”.

A defesa do italiano afirmou que vai recorrer da prisão preventiva . Battisti chegou algemado à sala de audiência do Fórum Federal de Corumbá (MS) por volta das 15h30. Battisti foi ouvido por meio de videoconferência. Odilon estava em seu gabinete, em Campo Grande.

 

Indiciamento. A Polícia Federal indiciou Battisti pelos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Em seu interrogatório, ele disse que iria participar de uma pescaria com dois amigos e fazer compras no país vizinho.

Battisti foi condenado na Itália à prisão perpétua pela participação em quatro assassinatos ocorridos entre os anos de 1977 e 1979, quando fazia parte do grupo Proletários Armados pelo Comunismo. Ele nega. Depois de passar por diversos países, ele vive no Brasil desde 2004.

Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a extradição de Battisti para a Itália, mas ressalvou que a decisão final sobre o assunto cabia ao presidente da República. No último dia de seu segundo mandato, em 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decreto no qual negou ao governo italiano o seu pedido de extradição.

Battisti disse à PF que “não receia ser extraditado para a Itália, em que pese um recente novo pedido do governo italiano”. Interrogado pelo delegado Iuri de Oliveira, da Delegacia da PF em Corumbá, Battisti afirmou que “está protegido juridicamente contra uma extradição, pois o ministro César Peluso ( do STF, aposentado) já julgou que a prescrição para os crimes pelos quais foi acusado teria encerrado em 2013”.

“Além disso, um decreto presidencial não pode ser revisto após cinco anos e a decisão do presidente Lula que concedeu o visto permanente ocorreu há mais de cinco anos”, disse ele no depoimento. Battisti, que se declara escritor, afirmou que no Brasil já foi preso pelo processo de extradição.

O governo italiano insiste para que ele seja enviado ao país europeu. No dia 27 de setembro, os advogados de Battisti entraram com um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal para barrar a possibilidade de extradição, deportação ou expulsão pelo presidente da República. O relator do caso é o ministro Luiz Fux.

 

Dinheiro. No interrogatório da Polícia Federal, sobre os dólares e euros que o italiano levava ao ser detido, Battisti afirmou que não sabia da necessidade de declarar o valor e que “tal quantia não foi sacada às vésperas da viagem, correspondendo a dinheiro que já tinha em casa há algum tempo”.

 

Cesare Battisti prestou depoimento por videoconferência do Fórum Federal de Corumbá na tarde de ontem

 

‘Temor’

“A ordem pública recomenda a conversão da prisão em flagrante em preventiva. O contexto geral da ocorrência faz concluir, ao menos em caráter provisório, que Cesare Battisti, procurava se evadir do território nacional, temendo ser extraditado.”

Odilon de Oliveira

JUIZ FEDERAL

 

 

 

 

Defesa recorre ao STF e vê ‘tratamento diferenciado’

Para advogado, prisão preventiva não é ‘cabível’; Battisti negou tentativa de fuga e disse ter ido à Bolívia comprar casacos
Por: Rafael Moraes Moura / Breno Pires / José Maria Tomazela

 

Em petição encaminhada ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF), a defesa de Cesare Battisti alegou que o ex-ativista italiano foi alvo de “tratamento diferenciado”, ao ser detido em Corumbá (MS), anteontem, na fronteira com a Bolívia.

“O episódio deixa claro haver em relação ao paciente um tratamento diferenciado a ponto das autoridades policiais terem inserido elementos exagerados e inverídicos no auto de flagrante, apenas para manter o paciente custodiado, gerando enorme repercussão nacional e internacional, com único intento de provocar comoção a favor de sua expulsão do País”, afirmaram os advogados de Battisti.

Os defensores do ex-ativista declararam também que vão entrar com um habeas corpus contra a prisão preventiva. “A medida não era cabível”, disse o advogado Maarouf Fahd Maaraouf. Ele participou da audiência, por meio de videoconferência, em Corumbá, onde Battisti está detido.

Com a decisão, o ex-ativista passaria a noite de ontem na sede da Polícia Federal, em Corumbá, mas deverá ser transferido para um presídio federal, assim que a vaga for confirmada.

 

Casacos. Interrogado pelo juiz, Battisti negou que tivesse a intenção de fugir e alegou que pretendia apenas comprar casacos de couro e vinhos na Bolívia. Os produtos, afirmou, se destinavam aos dois amigos brasileiros que o acompanhavam.

O ex-ativista italiano disse ainda que tem residência fixa e trabalho em São Paulo, recebendo de R$ 8 mil a R$ 10 mil por mês. Ele declarou que pretendia fazer as compras em um shopping que achava estar no lado brasileiro da fronteira.

Procuradas pelo Estado, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal não haviam se manifestado até a conclusão desta edição. /RAFAEL MORAES MOURA, BRENO PIRES e JOSÉ MARIA TOMAZELA

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