O Estado de São Paulo, n. 45279, 06/10/2017. Economia, p.B1

 

 

 

 

 

Câmara quer tirar executivos da gestão das empresas após acordo de leniência

Congresso. Parlamentares defendem que se a companhia chegou ao ponto de fazer uma colaboração premiada seus dirigentes não têm condições de continuar no comando; advogados que atuam em grandes casos no País consideram a medida polêmica

Por: Igor Gadelha

 

Igor Gadelha / BRASÍLIA

 

Lideranças partidárias na Câmara dos Deputados articulam alterações nas regras para a celebração de acordos de leniência, espécie de colaboração premiada para empresas. Uma das propostas é exigir que executivos sejam obrigados a deixar a gestão das companhias após a leniência.

Líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) é um dos principais defensores da medida. Para ele, não basta a empresa ser punida com multa. “Todo pecado tem de ter consequência para quem pratica.”

Um dos caminhos para aprovar a proposta é incluí-la na medida provisória (MP) 784/2017, que autoriza o Banco Central a fechar acordos de leniência com instituições financeiras. A matéria foi aprovada por uma comissão mista do Congresso e deve ser votada na próxima semana na Câmara. O prazo para apresentação de emendas já se encerrou, mas é possível fazer o que chamam de “emenda aglutinativa”: dar nova redação a emendas já apresentadas desde que o assunto seja semelhante. A MP tem de ser votada no Senado e enviada para sanção presidencial até dia 19, quando perde validade.

Outra possibilidade é incluir a mudança no projeto de lei que altera regras de acordos de leniência na Lei de Improbidade Administrativa. A proposta já foi aprovada em comissão especial. Mas, por ser projeto de lei, é possível apresentar novas emendas direto no plenário. No Senado, a ideia tem apoiadores como o presidente da CPI Mista da JBS, Ataídes Oliveira (PSDB-TO). “Se a empresa chegou ao ponto de fazer leniência, os dirigentes não têm condição moral para seguir. Veja o caso do grupo JBS”, disse.

Hoje o Ministério Público Federal tem liberdade para negociar a permanência ou o afastamento dos delatores do comando das empresas. O grupo J&F, que controla a JBS, fechou acordo no qual se comprometeu a pagar R$ 10,3 bilhões. A leniência prevê o afastamento de Joesley Batista dos conselhos das empresas abertas por cinco anos. A exigência não foi feita a Wesley.

Já o acordo da Odebrecht prevê multa de R$ 3,28 bilhões, mas não versa sobre a situação dos controladores na gestão. O acordo de delação de Emílio Odebrecht permite sua permanência por dois anos no comando. O de Marcelo Odebrecht exige seu afastamento por dez anos.

A proposta deve gerar polêmica no meio jurídico. Para Walfrido Warde, sócio do escritório Warde Advogados, é preciso analisar caso a caso. “O afastamento pode determinar a aceleração de dívidas ou afetar a credibilidade da empresa.”

Outros dois advogados ouvidos pelo Estado, ambos com atuação em leniências de grande porte, divergiram sobre as consequências da medida. Um deles acredita que, se aprovada, ela desestimulará empresários a confessar crimes. Outro advogado diz concordar com o dispositivo que, em sua visão, aproximaria a legislação do País ao modelo americano, onde empresários pegos usando informação privilegiada são proibidos de operar no mercado. / COLABOROU RENATA AGOSTINI