Valor econômico, v. 17, n. 4378, 09/11/2017. Política, p. A10.

 

 

Temer troca Daiello por Segóvia na PF

André Guilhemer Vieira e Murillo Camarotto

09/11/2017

 

 

Exatamente duas semanas após a Câmara dos Deputados rejeitar a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, o governo oficializou ontem a troca no comando da Polícia Federal (PF). No cargo desde 2011, o diretor-geral, Leandro Daiello, será substituído pelo delegado Fernando Segóvia. Daiello foi o mais longevo de todos os delegados que ocuparam o cobiçado cargo de diretor-geral da PF, permanecendo no posto por 6 anos e 10 meses. O anúncio vinha sendo articulado nos últimos dias entre Temer e o ministro da Justiça, Torquato Jardim, a quem a PF é subordinada. As articulações foram retomadas justamente após a votação da segunda denúncia contra o presidente pela Câmara, em 25 de outubro. Temer foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por crime de obstrução de Justiça. Mas o prosseguimento da acusação foi rejeitado pela maioria dos deputados e não houve abertura de ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF). A acusação deverá ser reapresentada ao fim do mandato presidencial. Pouco tempo após a notícia da troca chegar à a imprensa, Segóvia foi ao gabinete de Temer, mas saiu sem dar declarações. Em nota, Torquato expressou "agradecimento pessoal e institucional" a Leandro Daiello pela "competente e admirável administração" da Polícia Federal. Segóvia recebeu o apoio da maioria das entidades de classe de delegados e policiais federais, como a Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (Fenadepol), a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) e organizações que representam agentes, papiloscopistas e peritos criminais. Entretanto, a Associação Nacional dos Delegados não reconheceu a legitimidade da lista tríplice da qual saiu o nome do escolhido.

Os rumores sobre a alteração no comando da PF ganharam força quando Torquato assumiu a pasta, em agosto deste ano. Na época, o pano de fundo era uma suposta intenção do governo Temer de interferir na Operação Lava-Jato, estratégia veementemente rechaçada pelo ministro. Após negativas iniciais, no entanto, Torquato passou a reconhecer a possibilidade de troca, que,segundo ele, aconteceria em comum acordo com Daiello. O atual chefe da PF, de fato, já vinha manifestando a intenção de se afastar do comando e voltar à sua terra natal, o Rio Grande do Sul. A possibilidade de encerrar a carreira como adido policial em Roma sempre foi mencionada por Daiello como sua "opção dos sonhos". A Operação Lava-Jato começou em 2014, no meio da gestão de Daiello. O diretor-geral deu total autonomia para os superintendentes regionais e blindou a instituição de indicações de cunho político. Recebeu pressões para interferir na investigação em Curitiba em diversos momentos, mas não o fez. Em 2015, a Lava-Jato se desdobrou em outros Estados, como Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo. Temer ouviu aliados políticos antes de anunciar sua escolha, principalmente o ministro da Casa Civil Eliseu Padilha - alvo da Operação Lava-Jato no STF. Em setembro, o então procurador-geral, Rodrigo Janot, denunciou Padilha e o ministro da Secretaria-Geral, Moreira Franco, sob acusação de desviarem dinheiro de órgãos públicos e negociarem propina em troca da aprovação ou reprovação de medidas legislativas. Ambos negam veementemente as acusações. Com a mudança na PF, o governo Temer completa um ciclo de "reformas" que também inclui a nomeação do ex-ministro da Justiça Alexandre de Moraes para o STF e de Raquel Dodge para a Procuradoria-Geral da República (PGR). Dodge não foi uma indicação inteiramente política, porque ela foi o segundo nome mais votado na lista tríplice encaminhada a Temer pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). A posse de Segóvia foi confirmada pela PF para o próximo dia 20 de novembro. O local ainda não foi definido, mas poderá ocorrer no Palácio do Planalto ou na sede nacional da PF.