O Estado de São Paulo, n.45277 , 04/10/2017. Política, p.A4

 

 

 

 

Senado recua no caso Aécio e evita confronto com o STF

Poderes. Por 50 votos a 21, plenário adia votação que poderia barrar o afastamento e o recolhimento noturno tucano; Supremo vai analisar ação sobre esse tema no dia 11

Por: Thiago Faria / Felipe Frazão

 

Thiago Faria

Felipe Frazão / BRASÍLIA

 

O Senado recuou ontem e adiou a votação que poderia barrar o afastamento e o recolhimento domiciliar noturno do senador Aécio Neves (PSDB-MG) impostos pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. O adiamento foi aprovado por 50 votos a 21. A decisão de postergar a votação evitou o acirramento de uma crise institucional entre os Poderes Legislativo e Judiciário e ocorreu após o ministro Edson Fachin, do STF, negar pedido da defesa de Aécio para suspender as restrições ao tucano.

Na próxima semana, o plenário do Supremo julgará uma ação que discute se o Congresso pode ou não dar a palavra final em caso de medidas cautelares – entre elas afastamento e recolhimento noturno – contra parlamentares. A decisão se encaixa no caso de Aécio, que foi denunciado por suspeita de crimes de corrupção passiva e obstrução da Justiça. Ele é acusado de ter aceitado propina de R$ 2 milhões repassada pelo Grupo J&F – a defesa alega que o valor seria um empréstimo para pagar advogados.

O Senado manterá o Supremo sob pressão – se o julgamento não terminar até o dia 17, o que pode ocorrer caso algum ministro peça mais prazo para analisar o processo, os senadores vão colocar em votação o caso de Aécio.

“Construímos a oportunidade de a Suprema Corte, pelo seu pleno, rever a posição de divergência interna de uma de suas Turmas”, disse o presidente do Senado, Eunício Oliveira (CE), em entrevista após encerrar a sessão da Casa. Ele indicou que tratou da data com a ministra Cármen Lúcia: “Dialoguei bastante com a presidente (do STF)”, disse o peemedebista, ao ser questionado sobre o “prazo” do oferecido ao Legislativo.

O adiamento foi costurado por Eunício, que também recuou do tom beligerante do dia anterior, quando defendeu a votação em nome da prerrogativa do Legislativo. Após a negativa de Fachin sobre o recurso da defesa de Aécio , o presidente do Senado reuniu alguns senadores para informar que tentaria adiar a votação.

 

Entendimento. A maioria dos senadores entendeu que seria melhor aguardar a manifestação do STF. Também pesou para a decisão a incerteza sobre uma votação favorável a Aécio. Na avaliação de aliados do tucano, o clima ficou menos favorável em relação à semana passada.

Muitos senadores que antes defendiam o enfrentamento com o Supremo sob o argumento da independência entre Poderes viram que o discurso poderia ser interpretado como uma desculpa para salvar o colega, alvo de nove inquéritos.

O PT, por exemplo, que na semana passada divulgou nota na qual cobrava a derrubada da decisão contra o tucano, mudou o tom. “Não há posicionamento do partido em cima de quem está em julgamento, mas em cima de uma tese”, afirmou o senador Humberto Costa (PT-PE).

 

Embate. Houve senadores, porém, que cobraram o enfrentamento com o Supremo, entre eles, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR). “Espero que essa Casa se dê ao respeito”, disse ele, que deixou um hospital em Boa Vista após dois dias internado com quadro de diverticulite para ir ao Senado.

Em seu discurso no plenário, Jucá voltou a atacar o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que abriu as investigações contra Aécio e contra ele próprio. “O que se fez e o que está se fazendo, até pouco tempo, era um atentado a este país. Era um golpe, tentando acabar com a classe política, os partidos, o governo”, afirmou o peemedebista.

Outro investigado, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) também defendeu o enfrentamento. “Se o Senado se submeter a isso, eu acho que o mais recomendável para a Mesa Diretora era pegar a chave do Senado Federal e fazer como fizeram na ditadura militar e entregar ao Supremo Tribunal Federal”, disse o ex-presidente da Casa.

Por outro lado, mesmo entre partidos aliados do PSDB, como o DEM, o discurso foi pela “prudência”. “É o momento de entendermos que nós precisamos saber o que realmente pensa o pleno do Supremo Tribunal Federal, e não apenas a maioria de uma turma”, disse o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO).

 

Plenário. Senadores decidiram adiar para o dia 17 a votação sobre o afastamento de Aécio; houve discussão na Casa

 

REPERCUSSÃO

Romero Jucá Líder do governo (PMDB-RR)

“Espero que essa Casa se dê ao respeito.”

 

Renan Calheiros (PMDB-AL)

“Se o Senado se submeter a isso, o recomendável era pegar a chave e entregar ao Supremo.”

 

Cristovam Buarque (PPS-DF)

“Esta Casa não é menor do que o Supremo, mas o Supremo não é menor do que esta Casa.”

 

Jader Barbalho (PMDB-PA)

“Não admitimos que a Constituição seja reinterpretada para diminuir esta Casa.”

 

Randolfe Rodrigues (Rede-AP)

“Não cabe a esta Casa relaxar decisões judiciais cautelares, diversas da prisão.”

 

 

 

 

 

Afastamento acentua divisão interna do PSDB

Por: Felipe Frazão /Thiago Faria

 

BRASÍLIA

 

O afastamento do senador Aécio Neves (MG) determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) foi mais um capítulo na divisão interna do PSDB. O presidente interino do partido, senador Tasso Jereissati (CE), adotou discrição no caso, ao voltar ao Senado depois de viagem ao exterior: não discursou no plenário e pregou que a melhor solução era aguardar o pronunciamento da Corte.

“Há consenso entre juristas de que a decisão do STF foi um exagero. Então o ideal seria que o próprio Supremo resolvesse”, disse Tasso a jornalistas. Segundo auxiliares do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), o tucano tampouco se mobilizou em prol do colega Aécio.

A posição contraria Aécio e sua defesa jurídica, que nega agir de forma coordenada com o partido. Ontem, aliados de Aécio tentavam convencer seus colegas de bancada a enfrentar a decisão do STF e votar no plenário o caso.

 

Esvaziamento. Tasso levou a bancada para uma reunião no seu gabinete, deixando a liderança tucana esvaziada. Não houve consenso. Ao fim, coube ao líder Paulo Bauer (SC), um dos pilares da reação aecista, dizer que o partido era a favor de realizar a votação, embora a posição fosse por maioria e não unânime.

Tasso não faz nenhum movimento para enquadrar dissidentes do governismo, o que ecoa na Câmara. A insurgência dos “cabeças-pretas” levou a bancada a tentar destituir o relator da denúncia contra o presidente Michel Temer, deputado Bonifácio de Andrada, mineiro como Aécio, um dos principais defensores da manutenção do partido no governo.

Na votação à noite, o PSDB encaminhou pelo não adiamento, como queria a defesa. “Sinto que esse foi o último ato de solidariedade”, disse o senador Ricardo Ferraço (ES). Só ele e Eduardo Amorim (SE) votaram em desfavor de Aécio./F.F. e T.F