O Estado de São Paulo, n. 45326, 22/11/2017. Internacional, p. A10.

 

Após ditadura de 37 anos, Mugabe renuncia à presidência do Zimbábue

22/11/2017

 

 

O presidente do Zimbábue, Robert Mugabe, renunciou momentos antes de ter sua destituição votada no Parlamento. O vice, Emmerson Mnangagwa, cuja demissão foi o estopim da crise, deve assumir. O chefe do Exército pediu “calma” aos partidos. O governo de Mugabe ficou marcado pela crise econômica e por violações dos direitos humanos.

 

 

O presidente do Zimbábue, Robert Mugabe, renunciou ontem ao cargo após 37 anos no poder. O fim da ditadura veio em forma de uma carta entregue aos congressistas momentos antes de o ditador ter sua destituição votada no Parlamento. O vice-presidente, Emmerson Mnangagwa, deve assumir em dois dias. A renúncia põe fim a um governo autocrático marcado por uma crise econômica e violações dos direitos humanos.

“Eu, Robert Gabriel Mugabe, apresento formalmente minha renúncia à presidência da República do Zimbábue com efeito imediato”, disse o ditador na carta de renúncia lida no Congresso. “Escolhi me demitir voluntariamente. Esta decisão foi motivada por meu desejo de assegurar uma transferência de poder tranquila, pacífica e não violenta”, acrescentou.

O chefe do Exército, Constantino Chewenga, que articulou a prisão domiciliar de Mugabe, pediu a todos os partidos políticos que mantenham a calma durante a transição.

Em entrevista ao canal de TV ANN7, Kennedy Mandaza, o porta-voz do partido de Mugabe (Zanu-PF) disse que a tendência dentro da agremiação após a renúncia é “descentralizar o poder para que não se concentre em uma só pessoa”.

Segundo Mandaza, a descentralização foi discutida pelo Comitê Central do Zanu-PF. Um novo congresso extraordinário do partido foi convocado para dezembro, quando serão discutidas as novas diretrizes.

Imediatamente após a renúncia, as ruas de Harare, a capital do Zimbábue, foram tomadas por buzinas, danças e gritos de celebração. Mugabe, herói da guerra da independência, comandou o país por 37 anos com punho de ferro, amordaçando a oposição e arruinando a economia.

As ruas no entorno do Parlamento também foram tomadas pela multidão. “Estamos muito contentes, pois as coisas vão mudar”, disse Togo Ndhlalambi, um barbeiro de 32 anos que festejava a queda de Mugabe.

“Estou muito feliz. Foram 37 anos de ditadura. Não é brincadeira”, disse a estudante Tinashe Chakanetsa. “Espero um Zimbábue comandado pelo povo, não por uma pessoa.”

Desde a intervenção militar, há uma semana, provocada pela demissão de Mnangagwa, Mugabe perdeu o apoio de seus aliados mais próximos, especialmente dentro do Exército.

A Plataforma de Cidadãos Preocupados, um dos principais grupos que representam a sociedade civil no Zimbábue, pediu ontem um diálogo nacional amplo que envolva todos os partidos políticos do país. “Uma Autoridade Nacional de Transição deve ser produto desse diálogo”, disse a entidade. “Informamos ao governo e ao Exército a nossa intenção.”

A primeira-ministra britânica, Theresa May, disse ontem que a renúncia de Mugabe é uma oportunidade para o Zimbábue seguir um caminho “distinto da opressão que caracterizou seu governo de 37 anos”. “O povo do Zimbábue mostrou que quer eleições livres e justas e a oportunidade de reconstruir a economia sob um governo legítimo”, disse May. “O Reino Unido é o amigo mais antigo do Zimbábue e o ajudará a chegar a um futuro brilhante.”

Em Washington, um portavoz do Departamento de Estado disse que os EUA “apoiam a transição do país para a democracia”. A embaixada americana em Harare emitiu nota afirmando que a renúncia é um momento “histórico” para o país e pediu eleições livres, justas e amplas. /EFE, AP, REUTERS e AFP

 

Carta

“Escolhi me demitir voluntariamente. Esta decisão foi motivada por meu desejo de assegurar uma transferência de poder tranquila, pacífica e não violenta”

Robert Mugabe

EX-DITADOR DO ZIMBÁBUE