O Estado de São Paulo, n. 45309, 05/11/2017. Política, p.A8

 

 

 

 

Até PMDB pressiona por saída de Tucano

Com racha no PSDB, aliados cobram Padilha na articulação política no lugar de Imbassahy; partido de Temer se junta ao Centrão por reforma

Por: Vera Rosa

 

Vera Rosa / BRASÍLIA

 

O presidente Michel Temer está sendo cada vez mais pressionado a mudar a articulação política do Palácio do Planalto. Agora, a cúpula do PMDB engrossou o coro dos descontentes e quer que o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, acumule a função, a exemplo do que fez às vésperas da votação da segunda denúncia contra Temer, por obstrução da Justiça e organização criminosa, barrada pelo plenário da Câmara.

Até hoje, era apenas o Centrão – grupo formado por partidos médios, como PP, PR e PSD – que insistia em pedir a cabeça do ministro da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy, filiado ao PSDB. Mas, após o aumento do racha entre os tucanos – revelado pelo número maior de deputados contrários a Temer –, o PMDB passou a cobrar a antecipação da reforma ministerial.

Temer gosta de Imbassahy e resiste a atender ao pedido dos correligionários. A ideia do presidente é fazer trocas na equipe somente em 2018, até abril, quando quem for disputar as eleições tiver de deixar o cargo. Dos 28 ministros, ao menos 12 serão candidatos e deverão abandonar o posto para concorrer.

Prestes a ser rebatizado com o nome de MDB e a adotar um perfil de centro direita na campanha, o dividido PMDB vai reembalar sua imagem, na tentativa de amenizar o desgaste sofrido com a Lava Jato. Com esse plano, a cúpula do partido quer voltar a ter um peemedebista na coordenação política do governo, para fazer a ponte entre Planalto e Congresso. Antes de Imbassahy, quem ocupava essa cadeira era Geddel Vieira Lima, hoje preso.

A avaliação é de que Padilha será fundamental para ajudar a recompor a base e articular alianças para 2018. Denunciado pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, o chefe da Casa Civil escapou da acusação de organização criminosa junto com Temer e com Moreira Franco (Secretaria-Geral).

Em conversas reservadas, porém, o presidente tem dito que mexer na Esplanada, neste momento, mais atrapalha do que ajuda. Temer convidou líderes de partidos aliados para uma reunião, amanhã à noite, com o objetivo de tratar da chamada “agenda positiva”. Na terça-feira, ele vai se encontrar com ministros da área social. Sob o mote “Agora é Avançar”, o governo procura medidas de impacto para mostrar resultados.

Em mais um gesto para se reaproximar do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o Executivo dá sinais de apoio a projetos com apelo popular, como os dos planos de saúde e da segurança pública.

 

Boca fechada. Temer depende de Maia para aprovar propostas de ajuste fiscal na Câmara. Foi por isso que ficou irritado com declarações do ministro da Justiça, Torquato Jardim. Em café com jornalistas, Torquato acusou políticos e comandantes da Polícia Militar do Rio de se associarem ao crime organizado.

Na avaliação do Planalto, o ministro “vazou” informações estratégicas e criou um problema com Maia e com o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão. O presidente pediu a Torquato que, de agora em diante, se mantenha em silêncio sobre o assunto.

Outro foco de crise foi deflagrado pela ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois (PSDB), que solicitou ao governo para acumular o salário de ministra com o de desembargadora aposentada, a fim de garantir vencimento mensal de R$ 61,4 mil brutos, como revelou a Coluna do Estadão. Para “furar” o teto constitucional – hoje em R$ 33,7 mil –, Luislinda disse que sua situação, “sem sombra de dúvida”, se assemelhava ao “trabalho escravo”. Após repercussão negativa, ela recuou.

Na quinta-feira, a ministra tentou justificar o pedido a Temer. A portas fechadas, o presidente disse ter ficado “perplexo”. Ele também recebe aposentadoria como procurador do Estado de São Paulo e tem desconto no salário.

 

‘Chacoalhada’. Nos bastidores, aliados argumentam que Temer deve aproveitar a turbulência para dar uma “chacoalhada” no primeiro escalão. Ameaçam, ainda, não votar as medidas de ajuste se o presidente não fizer uma reforma ministerial, desalojando principalmente o PSDB. O objeto da cobiça do Centrão, além da Secretaria de Governo, é o Ministério das Cidades, que possui orçamento mais vistoso e está sob comando do tucano Bruno Araújo.

“O governo não tem apoio para aprovar a reforma da Previdência”, afirmou o deputado Arthur Lira (AL), líder do PP na Câmara, referindo-se aos 308 votos necessários para avalizar a proposta de emenda à Constituição. “Se o presidente não tirar os tucanos nem fizer uma rearrumação no time, terá problemas.”

Para o líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), a base precisa se unir em torno de uma agenda de estabilidade e desenvolvimento. “Mas não dá para estar no governo criticando o governo. Ninguém é meio governo, meio oposição.”

 

 

Pressão

“O governo não tem apoio para aprovar a reforma da Previdência (...) Se o presidente não tirar os tucanos nem fizer uma rearrumação no time, terá problemas.”

Arthur Lira (AL)

LÍDER DO PP NA CÂMARA

 

“Não dá para estar no governo criticando o governo.”

Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)

LÍDER DO GOVERNO NA CÂMARA

 

 

 

 

Valdemar e sua rede de influência em corredores e palácios de Brasília

PERFIL - Valdemar Costa Neto, ex-deputado federal, condenado no mensalão e articulador do PR / Ex-deputado circula por principais eixos de poder e mantém ascendência sobre políticos como Temer e Rodrigo Maia
Por: Isadora Peron / Ricardo Galhardo

 

Isadora Peron / BRASÍLIA

Ricardo Galhardo

 

Cinco anos depois de ter sido condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no mensalão, o ex-deputado Valdemar Costa Neto (PR) continua dando as cartas em Brasília e circula pelos principais eixos de poder da capital. Nos últimos meses, esteve pelo menos três vezes com o presidente Michel Temer e é um interlocutor frequente de nomes como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Discreto, Valdemar não voltou à vida pública nem planeja ser candidato em 2018, mas isso não diminui a influência que tem em seu partido, o PR, e no mundo político. Segundo assessores, ele não tem mais cargo de comando na sigla. É um funcionário da legenda, com salário pago por meio da conta da contribuições pessoais – portanto sem dinheiro público do Fundo Partidário – e responsável por cuidar da administração financeira do PR.

Na última semana, o Estado ouviu mais de uma dezena de nomes da política nacional, e todos foram unânimes em afirmar que Valdemar se mantém como uma figura influente. “Tenho uma relação muito boa com o PR e com Valdemar. Ele foi muito importante nas minhas duas eleições à presidência da Câmara”, disse Maia.

Recentemente, foi atribuída ao ex-deputado federal a decisão do governo de retirar o Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, da lista de privatizações e de reabrir o Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, para voos de longa distância. Em troca, 26 dos 39 deputados do PR votaram a favor do arquivamento da segunda denúncia apresentada contra Temer pela Procuradoria-Geral da República (PGR), por obstrução da Justiça e organização criminosa.

Assessores do PR negam que o presidente da Infraero, Antônio Claret, seja afilhado político de Valdemar e que ele tenha algo a ver com os aeroportos. Esses mesmos assessores, no entanto, confirmam que, em pelo menos um dos encontros de Valdemar com Temer, o tema da conversa foi a orientação dos deputados do PR na votação das denúncias. Procurado pela reportagem, o ex-deputado não respondeu.

 

Desde o PT. A influência do partido de Valdemar no Ministério dos Transportes não é de hoje. Vem desde 2002, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito pela primeira vez. O controle da pasta e, consequentemente do seu orçamento bilionário e de seus braços, como a Infraero, foi uma espécie de prêmio ao partido e a Valdemar, responsável por emplacar José Alencar como vice-presidente de Lula, justamente no momento em que o ex-líder sindical buscava se aproximar do empresariado.

Figura central em escândalos de outras temporadas, Valdemar também é personagem de destaque em investigações recentes. Ele é citado na gravação de mais de quatro horas de uma conversa entre Joesley Batista, dono da JBS, e o executivo Ricardo Saud. “A Odebrecht estava pagando por fora. O Antônio Carlos veio aqui e me contou que estão pagando no exterior e o Valdemar Costa Neto está recebendo no exterior. Não faça isso”, diz Saud.

No rastro da Operação Lava Jato, o ex-deputado está sendo novamente investigado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, desta vez por suposto recebimento de propina da Odebrecht, durante a execução das obras da Ferrovia Norte-Sul, em 2008 e 2009.

 

Cadeia. Do período da cadeia, seus aliados afirmam que ele apenas se ressente de ter sido condenado pelos “crimes errados”. Argumentam que praticou somente delitos eleitorais, o famoso caixa 2.

O ano que passou preso, no entanto, não o tirou da cena política. Foi do Complexo Penitenciário da Papuda que coordenou a eleição do PR em 2014, quando o partido fez a sua maior bancada na Câmara dos Deputados.

Políticos que conhecem Valdemar há muitos anos apontam sua capacidade de adaptação ao ambiente como o segredo para a manutenção da influência em Brasília. No ano passado, por exemplo, o ex-deputado defendia o posicionamento do PR contra o impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff (PT).

A desenvoltura com que Valdemar hoje se relaciona com o governo Temer mostra que se manter próximo de quem está no poder continua sendo uma das principais características do ex-deputado.