Valor econômico, v. 18, n. 4384, 21/11/2017. Política, p. A11.

 

 

Judiciário reage à soltura de líderes do PMDB do Rio

Cristian Klein

21/11/2017

 

 

O desdobramento da operação "Cadeia Velha", que resultou na prisão e na soltura, em menos de 24 horas, do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Jorge Picciani, do deputado e ex-presidente da Casa, Paulo Melo, e do líder do governo de Luiz Fernando Pezão no Parlamento fluminense, Edson Albertassi, todos do PMDB, está prestes a gerar uma crise entre os Poderes Legislativo e Judiciário do Estado. Depois que a Assembleia se reuniu, às pressas, em tumultuada sessão extraordinária, na sexta-feira, e aprovou a libertação dos parlamentares presos na véspera, os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) reúnem-se hoje para apreciar "questão de ordem" a respeito do caso. É esperado que os cinco magistrados do colegiado reajam à decisão do Legislativo e acolham o pedido da Procuradoria Regional da República para afastar os três deputados de suas funções parlamentares. Picciani e Albertassi anunciaram, no domingo, que vão tirar espontaneamente licença não remunerada dos mandatos, para cuidar de suas defesas, até fevereiro. Mas os procuradores querem o afastamento do cargo, por tempo indefinido, enquanto as investigações sobre corrupção prosseguem. O Ministério Público sustenta que Picciani e Melo receberam mais de R$ 112 milhões em troca de favores a empresários de ônibus, representados pela Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor).

Na sessão de sexta-feira, pelo placar de 39 votos a 19, com uma abstenção, a Assembleia revogou as prisões dos três parlamentares, determinadas pelos desembargadores, e incluiu, ainda, o "retorno ao pleno exercício" dos mandatos. Procuradores entendem que o Legislativo fluminense extrapolou suas prerrogativas. A votação que libertou os pemedebistas foi tão tumultuada que, desde então, vem dando margem a vários questionamentos, vindos do Ministério Público, da magistratura e de partidos políticos. Além do afastamento dos parlamentares, pedido pelo MP Federal, o Ministério Público estadual quer a anulação da sessão plenária, sob a alegação de que não houve respeito ao princípio da transparência e da publicidade à votação. O acesso da população à Assembleia, o que poderia pressionar os deputados a mudar de voto, foi dificultado. Não estava permitido até que decisão liminar da 6ª Vara de Fazenda Pública da Capital incumbiu uma oficial de Justiça a intimar a Mesa Diretora a abrir as galerias da Casa. A oficial, contudo, foi barrada por homens da Força Nacional e por funcionários da segurança postados na porta da Assembleia. A servidora precisou da ajuda do deputado Flavio Serafini (Psol), que furou o bloqueio, aos gritos e empurrões, e chegou ao plenário, interrompendo a sessão. Denunciada a obstrução que se fazia à oficial de Justiça, o presidente em exercício, Wagner Montes (PRB), autorizou a entrada dela e, depois, de populares nas galerias, "no limite" da lotação.

Nesse momento, porém, os assentos, que já estavam parcialmente preenchidos, terminaram de ser ocupados por servidores ligados aos gabinetes de deputados, o que impediu o acesso dos manifestantes que, do lado de fora, exigiam a permanência de Picciani, Melo e Albertassi na cadeia. Outro ponto de controvérsia é a forma que os deputados foram libertados, sem que um alvará de soltura fosse expedido por um juiz. A decisão da Assembleia foi enviada diretamente ao sistema penitenciário. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) comunicou que acionará o Supremo Tribunal Federal (STF). À Corte também recorrerá o pequeno PSL/Livres, para derrubar a revogação das prisões. A legenda argumenta que a decisão do STF que beneficiou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) - o tucano livrou-se do recolhimento noturno e retomou o mandato - não se aplicaria às Assembleias Legislativas. A crise no PMDB do Rio se aprofunda e envolve cada vez mais o governador Pezão. Reportagem da TV Globo no domingo mostrou que o delator Edmar Moreira Dantas entregou planilha ao Ministério Público Federal em que aponta cinco pagamentos de propina que totalizam R$ 4,85 milhões. Pezão disse que não conhece e nunca esteve com Dantas.