O Estado de São Paulo, n. 45315, 11/11/2017. Economia, p.B1

 

 

 

 

 

Reforma Trabalhista entra em vigor sem definição sobre pontos polêmicos

Regras começam a valer sem que o governo tenha cumprido promessas feitas a senadores de mudar pontos da reforma; embora esteja pronto, texto com ajustes ainda precisa ser assinado por Temer; centrais sindicais negociam substituto para o imposto sindical

Por: Fernando Nakagawa Carla Araújo

 

 

 

Governo prepara mudanças na lei

 

 

 

 

Legislação que entra em vigor hoje ainda deve sofrer alterações, porque, para aprová-la, Michel Temer prometeu ajustes aos senadores

 

 

 

Fernando Nakagawa

Carla Araújo/ BRASÍLIA

Aos 74 anos, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) ganha uma nova roupagem a partir de hoje. Com a entrada em vigor da reforma trabalhista, a relação entre patrões e empregados mudará profundamente em meio às promessas de criação de vagas e o temor de piora das condições de trabalho. As regras começam a valer sem que o governo tenha decidido como será o processo de ajuste de alguns temas prometidos ao Congresso: se por Medida Provisória ou projeto de lei. A minuta do texto, que está na Casa Civil, não prevê, como foi cogitado, um novo instrumento para financiamento dos sindicatos.

O projeto que entra em vigor hoje foi amplamente apoiado pelas entidades empresariais. O texto prevê, por exemplo, que os acordos coletivos tenham força de lei. Também acaba com a obrigatoriedade da contribuição sindical e permite a flexibilização de contratos de trabalho. Direitos constitucionais, como o 13º salário, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e salário mínimo, estão preservados.

Diante de alguns pontos sem acordo entre governo e Congresso e com uma relação cada vez mais complicada com os parlamentares, o Palácio do Planalto não conseguiu entregar a proposta de ajuste da reforma trabalhista antes da estreia das novas regras hoje. O texto que vai alterar pontos, como o trabalho insalubre de gestantes e contratos intermitentes está praticamente pronto, mas ainda há itens importantes em aberto e precisam ser decididos pelo Palácio do Planalto.

Martelo. O governo ainda não bateu o martelo sobre como será a tramitação do ajuste. Inicialmente, a ideia era editar uma MP previamente acertada com os parlamentares. Costurada pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), a solução esbarrou na crescente insatisfação de parte da bancada governista e na resistência de parlamentares ligados aos movimentos sindicais. Por isso, o governo passou a cogitar apresentar um Projeto de Lei, cuja tramitação poderia ser mais bem administrada pelo governo, mas não haveria o efeito imediato da MP.

Outro ponto ainda polêmico é o financiamento sindical. A minuta que está na Casa Civil não prevê qualquer tipo de novo instrumento para substituir o imposto sindical – que deixa de existir a partir deste sábado.

O governo, porém, tem sido duramente pressionado pelos sindicatos que exigem a regulamentação de um instrumento alternativo, como a contribuição a ser paga na negociação coletiva. No governo, não é descartada inclusive eventual decisão futura sobre o tema (Leia texto na pág. B5).

Trabalho insalubre. Apesar dessas dúvidas, o ajuste das normas trabalhistas está praticamente fechado. Como prometido aos senadores, a minuta que está na Casa Civil prevê, por exemplo, alteração das regras para o trabalho insalubre de grávidas e lactantes. O texto sancionado em julho previa que gestantes deveriam apresentar atestado de saúde para serem afastadas, durante a gestação, de atividades consideradas insalubres.

Agora, a proposta prevê vedação do trabalho nessa situação, mas haverá possibilidade de continuar nos casos em que a trabalhadora apresentar atestado que permita o trabalho.

Outro ponto é o que impõe quarentena de 18 meses para uma empresa recontratar através de contrato intermitente um empregado previamente demitido. O texto também proíbe qualquer cláusula de exclusividade para o contrato autônomo e estabelece regras para que a jornada de 12 horas de trabalho com 36 horas de descanso tenha de passar por acordo coletivo.

 

 

 

 

Ministro exalta aprovação da lei do trabalho

O trabalhador é o “maior vencedor da reforma trabalhista”. Dessa forma, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, apresentou ontem à noite, em rede nacional de rádio e televisão, a mudança na legislação. Em tom de comemoração, o ex-deputado gaúcho exaltou a reforma que “parecia impossível” e elogiou o esforço do presidente Michel Temer em avançar com a pauta.

“Os maiores vencedores são os trabalhadores e todos aqueles que contribuem, com seu esforço e dedicação, para um Brasil melhor, mais próspero e mais justo”, disse Nogueira.

No pronunciamento, o ministro dá boas vindas “ao futuro” e lembra que reformar a legislação da década de 1940 “era desafio que a todos parecia impossível de vencer”, mas o projeto avançou com “ousadia, diálogo e trabalho”.

O ministro repetiu o discurso de que a reforma consolida direitos, promove a segurança jurídica e gera empregos. Além disso, declara que “foram mantidos todos os direitos trabalhistas”, como Fundo de Garantia, seguro-desemprego, saláriomínimo, férias de 30 dias, 13º salário, aviso prévio e licença maternidade.

Nogueira terminou o pronunciamento com a lembrança de que foram criados mais de 208 mil postos de trabalho com carteira assinada durante 2017. “Vencemos a recessão e o emprego voltou. Com a modernização trabalhista iniciamos um novo tempo com mais empregos, mais esperança e otimismo”.

 

 

 

 

 

 

Centrais pressionam por nova contribuição

Projeto apresentado às lideranças do Congresso cria limite de 1% da folha de pagamento e aprovação por 10% da categoria em assembleia
Por: Marcelo Godoy

Marcelo Godoy

 

    As principais centrais sindicais do País decidiram apoiar um projeto de lei que regulariza a contribuição negocial em substituição ao antigo imposto sindical. As negociações levaram à adoção da proposta do deputado federal Bebeto Galvão (PSB-BA), que prevê que a adoção da contribuição deve passar por assembleia com a presença de 10% da base do sindicato. Ela teria o valor máximo de 1% da folha de pagamento e, se aprovada, só não seria descontada apenas de quem comparecesse à assembleia e votasse não.

     

     

    Com o fim do imposto sindical, determinado pela reforma trabalhista, muitos dos sindicatos perderão em média 30% de suas receitas. Como o governo Michel Temer não editou nenhuma Medida Provisória para resolver o problema do financiamento das entidades, as centrais decidiram ir ao Congresso para negociar com os deputados e senadores. “Conversamos com o presidente (da Câmara, Rodrigo) Maia (DEM-RJ), com o senador Romero Jucá (PMDBRR) e outros. Há disposição para um acordo”, disse Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT).

    De acordo com o deputado Bebeto, as empresas que não recolherem a contribuição estarão sujeitas a multa de R$ 200 mil por funcionário. Ao mesmo tempo, o projeto obrigará os sindicatos a fazer negociação coletiva a cada dois anos, caso contrário, a entidade terá seu registro suspenso. O objetivo seria reduzir a proliferação de sindicatos sem representatividade.

    “O imposto sindical está morto. Essa nova contribuição será decidida em assembleia, com quórum representativo da categoria. O projeto é o resultado de debates com as lideranças partidárias, entidades patronais e as centrais dos trabalhadores”, disse o deputado. Ele espera votar o projeto ainda neste ano.

    Pela proposta, 5% da contribuição serão repassados ao Ministério do Trabalho. A arrecadação será feita por meio de conta corrente na Caixa Econômica Federal e fiscalizada pelo ministério. O uso do dinheiro será auditado pelo Tribunal de Contas da União. O total máximo de contribuição, fixado em 1% da folha de pagamento, equivale a 3,5 dias de trabalho – o antigo imposto sindical obrigatório equivalia a 1 dia trabalhado.

    Reunião. Nesta semana, um representante da Força Sindical levou cópia do projeto ao expresidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para obter o apoio do PT para a proposta. “Lula é do tempo em que prevalecia o negociado. O problema não é o negociado prevalecer sobre o legislado, mas que os sindicatos se enfraqueceram sem o financiamento”, afirmou João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical.

    A CTB, central ligada ao PCdoB, também apoia o projeto. “Coloco dez mil trabalhadores diante da Ford, na Bahia, e aprovo a contribuição. Não sei se os sindicatos patronais vão conseguir”, afirmou Adílson Araújo, presidente da CTB.

    A maior central do Brasil – a CUT – informou que está acompanhando as negociações no Congresso, mas afirma que sua prioridade é lutar contra aspectos da reforma trabalhista que precarizam o trabalho. Patah concorda com a CUT. “A reforma foi 100% do lado do empregador. Do jeito que está, sufoca a estrutura sindical, não só dos trabalhadores, mas também dos sindicatos patronais”, disse Patah.

    Luiz Gonçalves, da Nova Central, e Antonio Neto, presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), também disseram que suas centrais participam das negociações. Gonçalves cita ainda o projeto do senador Paulo Paim (PT-RS) sobre o tema, que não fixa um número quórum mínimo para as assembleias. “Apoiamos qualquer um dos dois projetos”, disse.

    Para o procurador do trabalho Henrique Correia, uma lei faria com que a contribuição se tornasse legal, mesmo de quem não é filiado a sindicatos. Hoje, contribuições aprovadas em assembleias têm, segundo ele, alcance apenas para os sindicalizados – o que os sindicatos discordam. “Havendo lei, não há problema. Pode cobrar de todo mundo.”

     

     

     

    - Moralizar

     

     

    “Não é por ter meia dúzia de maus sindicalistas, que se vai condenar todo o movimento sindical. Sindicatos fortes são importantes para o País.”

    Adílson Araújo

    PRESIDENTE DA CTB

     

    “O projeto disciplina, dá transparência e moraliza o financiamento sindical.”

    Bebeto Galvão

    DEPUTADO PSB-BA