O globo, n. 30749, 14/10/2017. PAÍS, p.6

MORO DÁ 48H PARA LULA ENTREGAR RECIBOS ORIGINAIS DE ALUGUEL

 THIAGO HERDY

 

 

 

Para MPF, documentos teriam sido produzidos para enganar Justiça

 

O juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal, em Curitiba, deu um prazo de 48 horas para que a defesa do ex-presidente Lula entregue na Justiça Federal em Curitiba os recibos originais de aluguel do apartamento vizinho àquele onde mora atualmente o político petista. De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o apartamento 121 do edifício Green Hill, em São Bernardo do Campo (SP), teria sido adquirido com recursos da empreiteira Odebrecht.

A defesa de Lula havia solicitado que a entrega dos recibos ocorresse em audiência formal e com a presença de peritos, com o intuito de constatar o estado dos recibos e a “ausência de rasuras”. Ontem, Moro determinou a entrega do material na secretaria, mas entendeu ser desnecessárias audiência formal e a presença de peritos. O MPF suspeita que os documentos tenham sido produzidos apenas para dar aparente legalidade à operação imobiliária.

 

DEFESA QUERIA AUDIÊNCIA

“A defesa tem a posse dos recibos e pode extrair cópias antes de entregá-los, o que já é medida suficiente para prevenir qualquer chance de adulteração superveniente, ainda que seja surpreendente que isso seja aventado pela defesa”, escreveu o juiz em despacho.

Os advogados de Lula informaram que a entrega dos documentos será feita tão logo sejam notificados, o que, na prática, amplia o prazo para entrega. Os defensores criticaram a opção por entrega direta à secretaria, sem audiência formal.

“Surpreende a defesa o fato de o juiz não aceitar a realização de uma audiência para a entrega das vias originais dos recibos, atestando o estado em que os documentos serão apresentados, para dar total transparência ao ato”, escreveram os advogados do ex-presidente, em nota.

Os defensores disseram, ainda, ter “interesse no reconhecimento de que os documentos são autênticos”.

Lula comprou o apartamento 122 do Edifício Green Hill, em São Bernardo do Campo, em 2000. Durante seus dois mandatos, o governo federal alugou o imóvel vizinho, de número 121, para servir de suporte e apoio aos seguranças do então presidente.

No fim de 2010, último ano de Lula no governo, o apartamento foi colocado à venda e o comprador foi Glaucos Costamarques, primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. O MPF sustenta que a compra do apartamento teria ocorrido com recursos da Odebrecht. A empreiteira realizou pagamentos a uma empresa parceira — a DAG Construtora —, que, por sua vez, é acusada de realizar repasses suspeitos a Costamarques.

Em depoimento ao juiz Sergio Moro, o empresário negou ter recebido valores de aluguel de fevereiro de 2011 até novembro de 2015, quando seu primo José Carlos Bumlai foi preso. O ex-presidente Lula contesta a versão e apresentou cópias de parte dos recibos que teriam sido assinados por Costamarques. O petista disse em depoimento que sua mulher, Marisa Letícia, já falecida, era responsável pelo pagamento dos aluguéis.

Em petição levada à Justiça, o dono do apartamento afirmou ter assinado de uma vez só todos os recibos de aluguel referentes a 2015, a pedido de Roberto Teixeira, advogado de Lula. Segundo seu relato, um dia depois da prisão de Bumlai, Costamarques teria recebido no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, a visita de Teixeira, ocasião em que teria lhe informado que os aluguéis passariam a ser pagos. O empresário diz ter sido procurado em seguida pelo contador João Leite Muniz. A pedido de Teixeira, ele teria levado a remessa de recibos para serem assinados.

Ontem, Moro oficiou novamente o hospital, solicitando que informe se Teixeira esteve no local no segundo semestre de 2015, período em que Costamarques diz ter recebido sua visita.

O pedido foi alvo de crítica da defesa de Lula, que chamou o juiz de “investigador e acusador”, agindo “fora de suas funções e sem imparcialidade”. Moro foi acusado de perseguir Teixeira, “um advogado septuagenário, cardiopata e de saúde frágil”, segundo a defesa do ex-presidente da República.