Valor econômico, v. 18, n. 4398, 11/12/2017. Política, p. A9.

 

 

ENTREVISTA - Jorge Mariscal

Catherine Vieira

11/12/2017

 

 

O risco de fracasso da reforma da Previdência e o cenário eleitoral de 2018 são pontos que têm afastado os estrangeiros dos mercados brasileiros. Mas, para o diretor de investimentos de mercados emergentes do UBS, Jorge Mariscal, esse movimento abre uma oportunidade para se investir em Brasil.

Mariscal diz acreditar que se a reforma da Previdência não for aprovada agora, isso ocorrerá depois das eleições sob a tutela de um presidente pró-mercado. "Estamos falando isso para os investidores: comprem agora, não deem tanta importância para a política", diz. Mas ele destaca que, se não houver reforma nenhuma em 2019, "o ímpeto para o Brasil pode desaparecer".

Com projeções mais positivas que as de boa parte do mercado, o UBS trabalha com cenário de crescimento do PIB de 3,1% em 2018 e 2,7% em 2019, depois de uma alta de 0,5% em 2017. Para o câmbio, a expectativa é de queda do dólar para R$ 3,00 em seis meses e para R$ 2,90 daqui a um ano. Leia os principais trechos da entrevista.

 

Valor: O UBS tem uma perspectiva positiva para o crescimento do Brasil, mas temos visto uma resistência dos estrangeiros em relação aos mercados locais. Olhando apenas os fatores domésticos, qual o motivo dessa desconfiança?

Jorge Mariscal: Há aqueles que não acreditam numa perspectiva positiva para a política local. Eles olham os resultados das pesquisas eleitorais, veem os índices de candidatos de esquerda e acreditam que eles podem vencer. Ficam com medo de que o país vai voltar para os antigos padrões. O mercado não está convencido. E esta é a oportunidade. Se já tivessem comprado o cenário, os preços estariam mais altos. Os investidores estão cada vez mais construtivos sobre o Brasil, mas ainda céticos. Existe, eu acho, um otimismo cauteloso sobre o Brasil, olhando do lado de fora. O caso brasileiro é visto do exterior como uma reviravolta na economia, na política. Está sendo visto de maneira favorável. A aprovação da reforma da Previdência neste ano ou em 2019 é muito mais uma questão de quando do que de "se" vai acontecer.

 

Valor: Os investidores estão esperando um cenário mais claro para entrar no mercado brasileiro?

Mariscal: Alguns deles, que não investiram antes, estão "lambendo as feridas" por não terem entrado anteriormente e aproveitado o bom desempenhos dos mercados. Eles estão prestando mais atenção agora, há intenção de voltar. Um fator chave que estão observando é a aprovação da reforma da Previdência. Há a chance de que pode acontecer neste ano, embora não seja o cenário mais provável. Os estrangeiros sabem que, sem a reforma, a dinâmica de dívida é insustentável no Brasil. Por isso, precisa ser abordada. O outro ponto é a eleição. O cenário mais provável é a vitória de um candidato favorável às reformas, mas há sempre o risco de não seguir este caminho. É necessária mais clareza em ambas as questões antes de entrar muito dinheiro nos mercados brasileiros. Nossa visão é positiva: acreditamos que se a reforma da Previdência não for aprovada agora ocorrerá depois das eleições e um candidato pró-mercado sairá vitorioso. Do nosso ponto de vista, e estamos falando isso para os investidores: comprem agora, não deem tanta importância para a política. A economia está melhorando, os lucros corporativos também. Poucos países emergentes estão fazendo algo contra corrupção, como no Brasil.

 

Valor: Uma tentativa fracassada da reforma da Previdência neste ano pode enterrar a confiança para os investimentos no Brasil?

Mariscal: A aprovação não é algo que a maioria das pessoas espera para este ano. Não acho que enterraria a perspectiva para o Brasil. Mas se não acontecer de forma nenhuma em 2019, se não houver um governo que apoie a reforma, é um grande problema. A dinâmica de dívida no Brasil vai piorar, os juros não vão poder cair, o crescimento será afetado etc. O ímpeto para o Brasil pode desaparecer.

 

Valor: Mas os investidores serão pacientes o suficiente para esperar até 2019?

Mariscal: Eu acho que sim, caso as pesquisas eleitorais apontem na direção da reforma. Se apontarem para a direção contrária, a paciência termina.

 

Valor: A despeito do ano eleitoral e da possível volatilidade, o UBS tem uma perspectiva bastante positiva para o real. Quais fatores favorecem essa leitura?

Mariscal: Crescimento da economia, que deve subir para 3,1% em 2018. A perspectiva eleitoral também beneficia o real. E o ambiente global, ainda favorável. Nosso cenário básico não inclui a reforma da Previdência agora. Mesmo se for aprovada, não devemos mudar nossas expectativas. Estamos relacionando a trajetória esperada do câmbio à dinâmica de crescimento da economia, os fundamentos das contas externas.

 

Valor: Os preços atuais dos ativos (câmbio, ações, juros) estão sub ou sobrevalorizados?

Mariscal: O Ibovespa está subvalorizado. Parte do motivo é que os lucros estão se recuperando, mas a perspectiva mais positiva, incluindo a economia, ainda não foi incorporada aos preços. No caso do câmbio, o real estaria mais perto do valor justo em R$ 3,00 por dólar do que em R$ 3,50. A maioria dos ativos está subvalorizada. E a ponta longa da curva de juros depende mais do avanço da reforma da Previdência por causa do risco fiscal. É preciso ter um pouco mais de tolerância ao risco e paciência. Para alguns deles, como a ponta longa da curva de juros, é preciso ter um pouco mais paciência.

 

Valor: Quais os principais riscos para o cenário? São externos ou domésticos?

Mariscal: O principal risco para os mercados brasileiros vem de políticas tanto externas quanto internas. Uma das lições dos últimos dez anos é que, se os fundamentos econômicos estão fortes, o crescimento está se recuperando, os lucros corporativos estão reagindo e BC e Fazenda estão fazendo seu trabalho, a política não importa tanto. Vimos o Brexit, eleição de Trump, eleição na Alemanha, na Itália, e a melhor atitude teria sido fechar os olhos e continuar investindo porque o mercado só tem subido. E é isso que esperamos para o Brasil. Acompanhe a política, leia os jornais, mas não tenha uma reação exagerada. Mesmo se um candidato da esquerda vencer a eleição - e isso pode assustar -, ele pode ver que a única maneira de enfrentar os problemas é com reformas. Alguém terá de fazer a reforma da Previdência, porque o país não é sustentável sem enfrentar a questão fiscal. É preciso ter foco nos fundamentos porque é isso que direciona os negócios.