O globo, n. 30698, 24/08/2017. Economia, p. 24.

 

STF deve manter liberação para uso do amianto no Brasil

Renata Mariz/ Carolina Brígido

24/08/2017 

 

 

Votação termina hoje, mas, com dois ministros impedidos, não será possível derrubar lei federal

 

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve manter a validade da lei federal que permite o uso do amianto em todo o país, desde que sejam observadas regras de segurança. O tribunal retomou o julgamento da causa ontem, mas ainda não concluiu as discussões. Até agora, o placar está em quatro votos a três pela manutenção da norma. Há ainda mais dois ministros para votar. No entanto, o placar já é irreversível. Isso porque, pela regra do STF, só é possível derrubar uma norma federal se ao menos seis ministros votarem dessa forma. Dos onze ministros do tribunal, dois não participarão da votação porque estão impedidos: Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli. Eles atuaram em outros julgamentos, antes de pertencerem ao Supremo.

Depois que o STF terminar o julgamento da lei federal, na sessão de hoje, o plenário deverá continuar o julgamento da validade de leis estaduais que proibiram o uso do amianto crisotila. Há ações contra normas de São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Pernambuco. A tendência é que o tribunal libere os estados para proibir, em seu território, o uso da substância. O resultado deve ser diferente, porque todos os ministros estarão aptos a participar da votação.

Começou, na semana passada, o julgamento da ação que questiona a lei federal 9.055, de 1995, que proibiu a extração do amianto do tipo anfibólio, mas admitiu a extração, comercialização e uso do amianto crisotila, desde que tudo seja feito de forma segura. O caso deverá ser encerrado hoje, com os votos de Celso de Mello e da presidente do tribunal, Cármen Lúcia. Na semana passada, apenas a relatora, ministra Rosa Weber, votou. Ela defendeu a proibição de qualquer tipo de amianto, com base em estudos que comprovam ser este nocivo à saúde humana.

Ontem, seis ministros votaram, sendo que dois concordaram com a relatora e quatro discordaram. Alexandre de Moraes foi o primeiro a discordar de Rosa, com o argumento de que o Judiciário não pode substituir o Legislativo na elaboração de normas. Gilmar Mendes e Luiz Fux votaram no mesmo sentido.

O voto mais contundente foi o de Marco Aurélio Mello. Segundo ele, não há estudos definitivos sobre o nível de perigo à saúde, além de que o uso inadequado traz risco cancerígeno.

— Se o amianto deve ser proibido em virtude dos riscos que gera à coletividade ante o uso indevido, talvez tenhamos de vedar com maior razão as facas afiadas, as armas de fogo, os veículos automotores, enfim, tudo que, fora do uso normal, traz dano às pessoas — afirmou Marco Aurélio.

Ele argumentou que cabe apenas ao Congresso, por meio de lei, decidir algum tipo de banimento. Marco Aurélio também elencou questões econômicas, como o aumento de até 35% no custo de telhas e a falta de materiais substitutos, para defender sua posição:

— Nada impede que o Estado brasileiro adote padrões ainda mais elevados de proteção ao trabalhador, ao meio ambiente e à saúde da população. Nessa situação, será dada às indústrias e à economia do amianto a possibilidade de se adequar aos novos padrões. O simples banimento retirará, em caráter sumário, agentes econômicos relevantes do mercado.

Os processos questionando a produção da substância, usada principalmente na fabricação de caixas d’água e telhas, começaram a chegar ao tribunal em 2004. Ao todo, há oito processos tramitando no Supremo.

Algumas ações sobre as leis estaduais já começaram a ser julgadas. O ministro Edson Fachin votou pela constitucionalidade das normas locais. Segundo ele, os estados podem ampliar as restrições ao uso do amianto. Dias Toffoli concordou. Os dois ministros consideraram os estudos que comprovam males causados pelo amianto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 50% dos cânceres relacionados ao trabalho têm relação com a exposição ao amianto. Os representantes de empresas afirmam ser capazes de produzir o material de forma segura.

As ações que tramitam no STF foram apresentadas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra). Em 2012, antes de começar o julgamento, o STF realizou audiência pública para discutir o assunto. Foram ouvidos mais de 30 especialistas, entre cientistas, representantes da indústria, do governo e de entidades de apoio aos trabalhadores expostos ao amianto.