Correio braziliense, n. 19974, 30/01/2018. Economia, p. 7
Deficit fiscal de 2017 fica abaixo da meta
Rosana Hessel e Hamilton Ferrari
30/01/2018
As contas da União ficaram no vermelho pelo quarto ano consecutivo. Em 2017, o governo central — Tesouro, Banco Central e Previdência — teve deficit primário de R$ 124,4 bilhões, o segundo pior resultado da história, equivalente a 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB). O montante, no entanto, ficou R$ 34,6 bilhões abaixo da meta fiscal fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de deficit de R$ 159 bilhões, estabelecido em setembro do ano passado.
A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, no entanto, afirmou que não há motivo para comemoração, nem mesmo pelo fato de o saldo negativo ter ficado 24,8% abaixo do deficit de R$ 161,3 bilhões registrado em 2016, o maior da série histórica iniciada em 1997. “Estamos falando de um deficit muito acentuado e não há o que comemorar. Deveríamos estar falando de algum superavit para estabilizar a relação dívida/PIB para termos um cenário mais sustentável das contas públicas”, afirmou a secretária, durante a apresentação do balanço fiscal de 2017. Apenas o rombo da Previdência foi de R$ 182 bilhões, enquanto o Tesouro registrou superavit de R$ 58,8 bilhões.
De acordo com Ana Paula, o resultado de 2017 ficou melhor do que o esperado graças ao aumento das receitas extraordinárias em R$ 4,6 bilhões e à redução de R$ 30 bilhões nas despesas totais. Entre os cortes de gastos estão R$ 14,2 bilhões apenas de despesas discricionárias (não obrigatórias). Os benefícios previdenciários, tiveram redução de R$ 4,2 bilhões, em grande parte, devido à programação do pagamento para o fim do mês, que deixa a despesa para ser contabilizada no início do mês seguinte.
As contas da União estão no vermelho desde 2014 e, pelas projeções do governo, o superavit primário voltará apenas em 2020. O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves, também não vê motivos para festejar. “O resultado pode ter ficado abaixo da meta, mas o aumento da arrecadação ocorreu, basicamente, devido ao corte de investimentos e ao aumento das receitas extraordinárias, que não se repetirão neste ano. E ainda precisaremos ver o impacto da recuperação econômica, que ainda não veio”, afirmou.
Enquanto a receita líquida total cresceu 2,5% na comparação com o ano anterior, chegando a R$ 1,154 trilhão, as despesas encolheram 1% na mesma base de comparação, para R$ 1,279 trilhão. Apenas os gastos com investimentos despencaram 31,9%, para R$ 46,2 bilhões, ou 0,69% do PIB, patamar inferior a 2006.
Margem para gastar
De acordo com a secretária do Tesouro, o governo conseguiu cumprir emenda do teto dos gastos em 2017, “com folga de R$ 50 bilhões”, criando uma margem para o governo gastar mais em 2018, “dentro da regra do teto”. O valor autorizado pelo Orçamento deste ano para despesas limitadas pelo teto é de R$ 1,348 trilhão. Em 2017, o limite foi de R$ 1,309 trilhão, mas o governo gastou R$ 1,259 trilhão.
A economista Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), afirmou que, apesar da melhora do resultado primário, é preciso olhar com cautela os números, porque a qualidade do resultado “não é tão boa”. Ela ainda alertou que a tendência para este ano é de que o resultado primário seja pior que o de 2017. “Pelas nossas projeções, o deficit ficará mais próximo da meta, ou seja, deve aumentar”, disse.
Ana Paula ainda destacou que, pela primeira vez desde 1988, as despesas registraram queda em proporção ao PIB, passando de 20%, em 2016, para 19,5%, no ano passado. “Teremos dois anos de queda na despesa, o que será algo inédito desde a aprovação da Constituição Federal. A série histórica mostra um crescimento persistente nas despesas obrigatórias ao longo dos anos e essa queda é resultado do teto dos gastos”, afirmou. Ela prevê melhora de 0,6 ponto percentual neste ano em relação ao anterior, para 18,9% do PIB.
Regra de ouro preocupa
A necessidade de cumprir a regra de ouro — que proíbe o governo de se endividar para cobrir gastos de custeio, como salários — foi ampliada de R$ 184 bilhões, no ano passado, para R$ 208 bilhões, neste ano. Para cobrir o rombo e evitar crime de responsabilidade fiscal, a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, informou que, além da devolução dos R$ 130 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o governo estuda medidas adicionais, como a extinção do Fundo Soberano, que reforçaria o caixa em R$ 26,6 bilhões.