O Estado de São Paulo, n. 45313, 09/11/2017. Economia, p.B4

 

 

 

 

Alta da Previdência terá 'efeito cascata'

Contribuição previdenciária do funcionalismo federal deve subir de 11% para 14%, obrigando Estados e municípios a aumentarem suas taxas

Por: Adriana Fernandes / Idiana Tomazelli

 

Adriana Fernandes

Idiana Tomazelli / BRASÍLIA

 

Se aprovada pelo Congresso Nacional, a Medida Provisória (MP) 805, que eleva a contribuição previdenciária do funcionalismo federal de 11% para 14%, puxará em efeito cascata o aumento do tributo no mesmo patamar para todos os servidores de Estados e municípios.

Isso ocorrerá porque o artigo 149 da Constituição Federal prevê que a alíquota previdenciária cobrada dos servidores da União é piso para o funcionalismo estadual e municipal – ou seja, funcionários públicos de Estados e municípios não podem ter contribuição menor que a dos funcionários federais. Cálculos do Ministério do Planejamento obtidos pelo Estadão/Broadcast indicam que os Estados e o Distrito Federal poderão ter arrecadação adicional de R$ 1,8 bilhão anual caso a MP seja aprovada.

Atualmente, sete Estados têm alíquota de 14% ou mais, segundo dados coletados pelo Tesouro Nacional no fim do primeiro semestre deste ano. São eles: Acre, Ceará, Goiás, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Ao anunciar a medida, em agosto, o governo não explicitou que haveria essa obrigatoriedade para Estados e municípios. A maioria dos Estados ainda desconta 11% de seus servidores, incluindo São Paulo.

Há alguns que estão acima disso, como Bahia (12%), Sergipe (13%) e Pernambuco (13,5%), mas ainda estariam desenquadrados em caso de aprovação da MP federal. O município de São Paulo também cobra alíquota de 11% e já estava avaliando mudanças.

 

Rombo. O desequilíbrio nas contas da Previdência do funcionalismo público é um dos problemas mais graves nas finanças dos Estados e vai se agravar nos próximos anos com o envelhecimento dos servidores.

No ano passado, o rombo nos regimes estaduais foi de R$ 89,6 bilhões. Os municípios tiveram superávit de R$ 11,1 bilhões, mas começarão a enfrentar dificuldades com o aumento das aposentadorias. Para o assessor especial do Ministério do Planejamento, Arnaldo Lima, a MP ajudará Estados e municípios a recompor suas receitas.

“A repactuação do pacto federativo começa pela agenda fiscal. O desafio de reequilibrar as despesas de pessoal e com Previdência é nacional, não só da União.” Para isso, avalia Lima, é preciso consolidar uma agenda nacional de desenvolvimento e avançar na coordenação das atribuições constitucionais concorrentes, como saúde, educação e segurança pública, áreas intensivas em pessoal.

Os governos regionais não têm prazo para fazer a adaptação da alíquota. Mas, se eles não aprovarem a alteração na legislação local, não conseguirão obter os certificados de regularidade na área previdenciária. Com isso, ficariam impedidos de receber transferências voluntárias da União, celebrar acordos, contratos, convênios, além de financiamentos de instituições financeiras federais ou garantias da União para obtenção de empréstimos.

 

Controle. Secretária de Fazenda de Goiás quando o Estado elevou a alíquota para 14,25% (a mais alta do País), a economista Ana Carla Abrão avalia que o aumento da contribuição para 14% é o mínimo necessário para começar a corrigir o problema. Segundo ela, o déficit da Previdência dos servidores é um problema gravíssimo e uma alíquota nesse patamar para alguns Estados não faz nem “cócegas”.

Ana Carla lembra que a elevação da alíquota pelo governo federal era um pleito antigo de alguns governadores, que enfrentam dificuldades financeiras, mas não queriam o ônus de impor uma tributação mais alta enquanto a da União permanecia em 11%.

O impacto só não é maior porque a elevação da alíquota, a exemplo como ocorrerá na União, só valerá para a parcela do salário acima do teto do INSS (hoje em R$ 5.531,31), destaca o consultor do Senado Pedro Nery. Segundo levantamento feito por ele, em muitos Estados a média de salários fica abaixo disso, à exceção de Distrito Federal, Santa Catarina e São Paulo.

O presidente da Confederação Nacional dos Servidores Público, Antonio Tuccilio, disse que a entidade vai entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a medida nos próximos dias. “Essa medida é absurda.”

 

Compromisso

“O desafio de reequilibrar as despesas de pessoal e com Previdência é nacional, não só da União.”

Arnaldo Lima

ASSESSOR ESPECIAL DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO

 

 

 

 

 

Governadores temem sofrer desgaste político

Medida impopular já enfrenta resistência do funcionalismo, que tem forte poder de pressão no Congresso
Por: Adriana Fernandes / Idiana Tomazelli

 

BRASÍLIA

 

A medida provisória (MP) que eleva para 14% a alíquota previdenciária de servidores federais enfrenta forte resistência do funcionalismo, que já iniciou campanha pela derrota da medida. No Congresso, a categoria tem hoje forte poder de pressão.

Esse grupo pode crescer com o reforço de alguns governadores que também devem se opor à elevação, avalia o presidente do Comitê de Secretários de Fazenda dos Estados, André Horta, que atua pelo Rio Grande do Norte.

Está em jogo o desgaste político de uma medida impopular. “Tem Estado que quer, porque melhora o caixa. E tem Estado que não quer aplicar (o aumento da alíquota). Vai dar um bocado de trabalho e de discussão”, diz Horta.

Minas Gerais é um dos que devem resistir à mudança, embora esteja em grave dificuldade financeira e seja considerado um dos candidatos ao regime recuperação fiscal. “Só aumentar por aumentar, não vamos fazer isso, não. É como se fosse reduzir salário de servidores. Temos que discutir a criação de um fundo (para financiar as aposentadorias), um plano global da Previdência, mas não sabemos quando isso vai ser discutido”, disse o secretário estadual de Fazenda de Minas Gerais, José Afonso Bicalho.

No Estado de São Paulo, tampouco há planos para aumentar a cobrança, hoje de 11%. “A princípio, a lei federal ainda não foi aprovada e o Estado não estuda elevar a alíquota”, disse em nota a Secretaria de Fazenda.

O Distrito Federal informou que, se a lei for aprovada, precisará adequar sua alíquota, mas fez questão de destacar que “não se trata de uma opção política”, para evitar bater de frente com o funcionalismo. O Instituto de Previdência do DF (Iprev/DF) disse ainda que, se for o caso, também será elevada a alíquota patronal, para 28%.

“Ainda não foi possível estimar o impacto da medida, nem há definição sobre a forma de operacionalização do aumento, isto é, se as alíquotas aumentarão de forma progressiva ou não”, informou o Iprev/DF.

O presidente da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), Jonas Donizette, explicou que a maioria dos municípios recolhe 11% de seus servidores para a Previdência, mas já há casos em que os prefeitos discutem a elevação para 14%.

“Em Campinas (onde ele é prefeito), acho que é necessário para poder ter uma composição de caixa”, diz Donizette. Ele acredita que a proposta da União de elevação da alíquota deve encontrar apoio entre os municípios, mas reconhece que não será consenso. / A.F. e I.T

 

 

 

 

 

 

Emendas ao projeto de reoneração preocupam governo

Foram 85 emendas apresentadas pelos parlamentares e maioria mantém benefício a mais setores da economia
Por: Eduardo Rodrigues

 

Eduardo Rodrigues / BRASÍLIA

 

O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, admitiu ontem que a grande quantidade de modificações propostas ao projeto de lei da reoneração da folha de pagamento preocupa o governo. Os parlamentares apresentaram até agora 85 emendas e a maioria estipula a manutenção do benefício tributário a mais setores da economia, o que levaria a um grande impacto nas contas públicas do próximo ano.

“Estamos buscando a reversão do modelo de desoneração criado em 2011 que concede benefícios para poucos contribuintes e reduz a arrecadação previdenciária”, disse Rachid após audiência pública na comissão especial do projeto na Câmara dos Deputados.

A nova tentativa do governo de acabar com a desoneração da folha de pagamentos já conta com as mesmas emendas que levaram o governo a desistir da MP 774, em agosto, pouco antes de ela caducar.

Das 85 propostas de alteração apresentadas ao projeto, a maioria está diretamente relacionada ao lobby de setores da indústria e de serviços que desejam manter a desoneração. E o relator do PL, deputado Orlando Silva (PcdoB-SP), adiantou ontem que seu parecer ficará bastante diferente do texto original, enviado pelo governo no começo de setembro.

 

Texto original. Questionado se a Receita recomendará que o presidente Michel Temer vete a manutenção da desoneração para setores que forem incluídos no projeto pelo Congresso, Rachid disse que o Fisco ainda tentará convencer os parlamentares a aprovarem o texto original. “Temos todos os argumentos necessários para isso”, afirmou.

Rachid também criticou o relatório da Medida Provisória (MP) 793, que cria o parcelamento do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). O parecer da deputada Tereza Cristina (PSB-MS) elevou os descontos concedidos aos devedores e reduziu de 4% para 2,5% o total do débito que precisa ser pago ainda em 2017, como entrada.

“Do jeito que ficou, o relatório do Funrural concede um perdão quase integral. Lá na frente, os trabalhadores rurais irão precisar receber o benefício. A conta não fecha.”

 

MP 793. Rachid critica também parcelamento do Funrural