O globo, n.30740 , 05/10/2017. PAÍS, p.8

BATTISTI É PRESO AO TENTAR CRUZAR, DE TÁXI, FRONTEIRA COM A BOLÍVIA

RENATA MARIZ

FRANCISCO LEALI

 

 

Italiano foi detido sob suspeita de evasão de divisas; Temer pode decidir extraditá-lo de volta à Itália

O italiano Cesare Battisti foi preso ontem em Corumbá (MS), na fronteira do Brasil com a Bolívia, sob suspeita de evasão de divisas ao tentar deixar o país. Segundo a Polícia Federal (PF), ele portava uma “quantia significativa em moeda estrangeira”, o que levou os agentes a detê-lo no momento em que saía do Brasil a bordo de um táxi boliviano.

Ameaçado por um novo pedido de extradição feito pela Itália, Battisti havia sido parado por uma blitz da Polícia Rodoviária Federal (PRF) pouco antes. Os policiais identificaram o italiano, que estava acompanhado por duas pessoas, e acionaram integrantes da PF. Eles, então, seguiram o veículo até a fronteira com a Bolívia, quando Battisti teria cometido o crime de evasão de divisas, caracterizado pela remessa de valores ao exterior sem declarar às autoridades.

A PRF e a PF não informaram oficialmente o valor que Battisti detinha no momento da detenção e nem se o italiano era monitorado. Fontes com acesso à investigação sustentam que o ex-ativista estava com 5 mil dólares e 2 mil euros — cerca de R$ 23 mil. As informações sobre o caso foram centralizadas na PF em Brasília, no momento em que há um pedido do governo da Itália ao presidente Michel Temer no sentido de rever a permanência concedida a Battisti pelo ex-presidente Lula.

Até a noite de ontem, a informação da PF era que Battisti ainda prestava esclarecimentos em uma delegacia de Corumbá. Segundo autoridades envolvidas no caso, o italiano ficaria preso ao menos até a manhã de hoje e poderia ser submetido a uma audiência de custódia para verificar a necessidade de permanecer detido. A tomada de depoimentos se alongou até a noite porque agentes da PRF e da Receita Federal também foram ouvidas pelo delegado.

A suspeita é que Battisti, condenado à prisão perpétua em seu país e que vive refugiado no Brasil, tentaria permanecer na Bolívia, uma vez que o governo italiano pediu formalmente ao Planalto que anule o benefício e o devolva para cumprir a pena em seu país de origem.

Assim que soube da detenção, a defesa do italiano ajuizou um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar liberar Battisti. No pedido, os advogados citam notícia divulgada ontem pelo site do GLOBO. Eles requereram liminar para que o cliente seja libertado, impedindo qualquer ação do governo brasileiro para devolvê-lo à Itália.

A última notícia sobre Battisti era que ele estaria morando na cidade de Rio Preto, no interior de São Paulo, onde fez tratamento pelo SUS contra hepatite C. No último recurso que enviou ao STF, o italiano informou ter se casado com a brasileira Joice Passos dos Santos, em 2015. A Justiça de São Paulo reconheceu que ele é pai de um menino, nascido em novembro de 2015, fruto de relacionamento com outra brasileira.

Na última quinta-feira, a defesa de Battisti entrou com um pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir uma possível extradição. Ele recebeu asilo no Brasil após decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010. Foi o último ato do petista na Presidência da República.

 

GOVERNO PODE APOIAR EXTRADIÇÃO

O pedido sigiloso feito pelo governo da Itália para que o presidente Michel Temer reveja a decisão de Lula, revelado pelo GLOBO, teria recebido sinal verde de dois ministros brasileiros, segundo integrantes do governo: Torquato Jardim (Justiça), primeiro a analisar o pedido do governo estrangeiro; e Aloysio Nunes Ferreira (Relações Exteriores), por considerar o ato como um gesto diplomático importante.

A defesa do italiano, que soube do pedido por meio da reportagem do GLOBO, chegou a afirmar que o prazo para rever a decisão já está esgotado.

— Certamente está prescrito. Não faz sentido falar em extradição de novo, a não ser que queira deturpar o ordenamento jurídico brasileiro. E isso parece que atualmente é o esporte predileto lá em Brasília — afirmou Igor Tamasauskas, um dos advogados de Battisti, na semana passada.

No ano passado, diante de notícias de que o governo italiano poderia pedir novamente a extradição, a defesa apresentou no STF um habeas corpus preventivo, negado em setembro. O relator, ministro Luiz Fux, disse que não havia motivo concreto que justificasse o pedido, mas destacou que o presidente tem poder para tomar decisões relacionadas à presença de estrangeiros no país.

A imprensa internacional deu destaque à prisão de Cesare Battisti ontem, com reportagens sobre o caso em jornais da Itália, dos Estados Unidos e da Inglaterra.

O jornal “La Stampa”, um dos principais veículos italianos, lembrou que o presidente Temer manifestou apoio à extradição de Battisti para a Itália e citou o pedido de habeas corpus feito pela defesa do italiano ao STF, na quarta-feira.

A “Rai News”, da Itália, também citou o posicionamento de Temer e disse que Battisti terá que comparecer diante de um juiz após a prisão. A reportagem detalha ainda como foi a prisão de Battisti, conforme informações publicadas no GLOBO. O veículo mencionou o histórico da vinda do italiano para o Brasil, em 2007. O “Huffington Post” também publicou reportagem sobre a prisão de Battisti.

O jornal “The New York Times” mencionou que a Itália havia pedido a extradição de Battisti ao ex-presidente Lula em 2010, que negou o pedido, provocando atritos na relação entre os dois países. O britânico “Daily Mail” citou uma fonte policial que afirmou ser uma detenção provisória, não prisão definitiva.

“A informação que temos até agora é que Battisti foi detido em Corumbá. Não é uma prisão”, disse um porta-voz da polícia à agência de notícias Reuters.