O Estado de São Paulo, n. 45310, 06/11/2017. Política, p.A6

 

 

 

 

 

 

Indecisão sobre Lula faz PCdoB ter candidata

Aliado do PT desde 1989, partido anuncia Manuela D’Ávila; decisão divide petistas

Por: Pedro Venceslau / Paula Reverbel

 

Pedro Venceslau

Paula Reverbel

 

O PCdoB lançou ontem a précandidatura da deputada estadual gaúcha Manuela D’Ávila à Presidência da República. É a primeira vez desde a redemocratização do País, em 1985, que o partido lança um nome na disputa pelo Palácio do Planalto.

Apesar do anúncio, a presidente do partido, Luciana Santos, disse ao Estado que a précandidatura não afasta o PCdoB do PT, seu aliado histórico. Segundo ela, a decisão de lançar Manuela D’Ávila foi tomada diante da instabilidade política do País, “sem comprometer a aliança política que possa haver com o PT lá na frente”.

“Não há um partido mais defensor do PT do que o PCdoB”, disse Luciana. “Nós queremos nos apresentar com mais força para ajudar o conjunto do nosso campo político a retomar a Presidência da República no ano que vem”, explicou. Segundo ela, a candidatura vai se consolidar no processo de convenções.

Entre os petistas, as reações ao anúncio do PCdoB foram díspares. A senadora Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do PT, comemorou a candidatura de Manuela em seu perfil nas redes sociais. “Grande quadro político, grande mulher! Ali na frente nos encontraremos, Manu!”, escreveu no Twitter.

Já o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) lamentou o anúncio. “Respeito o PCdoB, respeito a Manuela, acho que ela é um dos melhores quadros da nova geração. Mas considero a decisão um erro histórico.” Ele comparou a decisão à posição dos comunistas em 1954, na crise que levou ao suicídio de Getúlio Vargas. Na época, o partido pressionou pela renúncia.

Para Lindbergh, os comunistas deveriam estar com o PT desde já. “Acho um equívoco em um momento como este, em que querem impedir a candidatura de Lula.”

 

Sete. Desde 1989, os comunistas apoiaram todas as sete candidaturas presidenciais petistas. Com 12 deputados federais em exercício, o partido pode ampliar o tempo de propaganda na TV do candidato que apoiar. Em nota, a sigla disse que o objetivo da candidatura é a “retomada do crescimento, defesa e ampliação dos direitos do povo e reforma do Estado”.

Perguntada sobre as declarações recentes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do presidente estadual do PT em São Paulo, Luiz Marinho, Luciana Santos afirmou que as falas de ambos – que pavimentam o caminho para alianças do PT com o PMDB e com outros partidos que apoiaram o impeachment da petista Dilma Rousseff – não estremecem as relações entre petistas e comunistas. “O que deve nos mover é barrar a agenda do governo Temer. E, para barrar a agenda, a gente tem que juntar forças”, afirmou.

Ela disse também que o PCdoB ainda defende o direito de Lula sair candidato em 2018. O petista é réu na Justiça em sete processos e já foi condenado em um deles a 9 anos e 6 meses de prisão pelo juiz federal Sérgio Moro, sob as acusações de corrupção e lavagem de dinheiro. Por isso, ele corre o risco de ficar inelegível até a próxima corrida presidencial, caso a decisão seja confirmada em segunda instância. “Consideramos que esse processo que Lula está vivendo é político”, disse.

Luciana afirmou ainda que existe a possibilidade de uma aliança entre PT e PCdoB em 2018. Segundo ela, “a instabilidade política é a marca do momento”. “Achamos que a nossa pré-candidatura precisa estar posta para o debate nacional, para ver os desdobramentos. Neste momento há necessidade de apresentar essa alternativa.”

Manuela D’Ávila, de 36 anos, já cumpriu dois mandatos de deputada federal pelo Rio Grande do Sul, tendo sido a candidata mais bem votada do Estado nas duas eleições. Ela foi também dirigente da União Nacional dos Estudantes (UNE).

 

Pré-candidata. Manuela D’Ávila foi lançada à Presidência pelo PCdoB, antigo aliado do PT

 

Defesas

“Não há um partido mais defensor do PT do que o PCdoB.”

Luciana Santos

PRESIDENTE DO PCDOB

 

“Um equívoco, no momento em que querem impedir a candidatura de Lula.”

Lindbergh Farias

SENADOR PETISTA

 

 

 

 

Para Temer, FHC age por razões eleitorais

 

Vera Rosa / BRASÍLIA

 

Irritado com o artigo em que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pede ao PSDB que desembarque do governo, o presidente Michel Temer atribuiu ontem as ações do tucano apenas a interesses eleitorais, com o objetivo de derrotar o PMDB na disputa de 2018. Em conversas reservadas, o presidente não escondeu a mágoa com Fernando Henrique e avaliou que ele está pressionando correligionários para que o PSDB deixe o primeiro escalão em dezembro, quando o partido renovará a direção.

Temer se reuniu ontem, no Palácio do Jaburu, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e com os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil), Moreira Franco (Secretaria-Geral) e Antonio Imbassahy (Governo), além dos deputados Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Baleia Rossi (PMDB-SP). A discussão girou em torno da “agenda positiva” que o governo quer aprovar na Câmara, nos próximos dias, como o pacote na segurança pública. Para tanto, porém, precisa do apoio dos tucanos.

Na avaliação do deputado Beto Mansur (PRB-SP), vice-líder do governo na Câmara, o discurso do desembarque é “vazio” e não faz sentido. “É preciso lembrar Fernando Henrique que, como ex-presidente, ele não tem de pensar na próxima eleição, mas, sim, na próxima geração”, provocou Mansur. “Se querem largar os ministérios, que larguem. Mas têm de ajudar o governo a fazer as reformas.”

No artigo intitulado Hora de decidir, publicado no Estado, Fernando Henrique disse que o PSDB pode apresentar “algum nome competitivo” em 2018, “mas precisa passar a limpo o passado recente”. Para ele, “ou o PSDB desembarca do governo na convenção de dezembro e reafirma que continuará votando pelas reformas ou sua confusão com o peemedebismo dominante o tornará coadjuvante na briga sucessória”.

 

 

 

 

 

 

Entidades reagem a ação federal no combate a ‘fake news’

 

 

Força-tarefa do TSE inclui Exército, Polícia Federal e Abin, o que, para especialistas, ameaça liberdade de expressão
Por: Rafael Moraes Moura / Breno Pires

 

Rafael Moraes Moura

Breno Pires / BRASÍLIA

 

Em meio à ofensiva do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para barrar o avanço de “fake news” na campanha de 2018, entidades da sociedade civil reagiram à inclusão do Exército, da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e da Polícia Federal (PF) nas discussões, temendo que haja margem para excessos e ameaça à liberdade de expressão.

Conforme revelou o Estado, o TSE prepara uma forçatarefa para combater a disseminação de “fake news” (notícias falsas) nas disputas do próximo ano. Integrantes do tribunal já se reuniram com representantes do Google e do Facebook para tratar do tema.

Para Marco Konopacki, coordenador da área de Democracia e Tecnologia do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS-Rio), a intenção do TSE é legítima, mas ele alerta sobre a participação de órgãos de segurança nacional no debate. “Isso pode descambar para um vigilantismo exacerbado, num processo de autoritarismo”, avaliou Konopacki. O professor Sérgio Amadeu, um dos representantes da comunidade científica no Comitê Gestor da Internet no Brasil, concorda. Para Amadeu, o TSE deveria reunir especialistas, juristas, técnicos e acadêmicos para organizar um “guia de boas práticas” na internet.

“Não cabe ao Exército, que deve cuidar da estratégia de defesa do Brasil, participar de um debate que tem a ver com opiniões políticas de disputas partidárias. Isso é um absurdo. Acho estranho que a Polícia Federal e a Abin trabalhem essa

questão, porque isso foge da competência delas”, criticou Amadeu.

Segundo o advogado Bruno Bioni, do Núcleo de Informação e coordenação do Ponto BR (NIC.br), entidade ligada ao Comitê Gestor da Internet no Brasil, o TSE deveria promover uma discussão “mais democrática”. “O primeiro passo seria pensar

num arranjo que tivesse acadêmicos, setor privado, ONGs, que não ficasse só numa discussão com atores governamentais”, comentou Bioni.

 

Governança. Na avaliação da presidente do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco, a discussão pode gerar controvérsias em relação à liberdade de expressão. “A minha preocupação é anterior à definição de quem deve participar desse grupo. É qual será a governança desse grupo. A gente precisa dar um passo atrás – existe uma intenção, ela pode ser interessante, desde que tenha governança muito clara, mas sem entrar na questão da liberdade de expressão”, frisou Patrícia.

Já o professor Anderson Nascimento, especialista em segurança da informação e privacidade da Universidade de Washington, defende a inclusão de Exército, Abin e Polícia Federal no debate. Segundo Anderson, boatos podem gerar distúrbios sociais, sendo, portanto, problema de política, de órgãos de polícia e de inteligência.

“É questão nacional. Tem de ter órgãos de inteligência participando porque é algo que pode afetar a segurança nacional. O caso dos Estados Unidos (com as evidências de que houve interferência da Rússia contra a campanha de Hillary Clinton) mostra que é possível haver uma potência estrangeira influenciando em campanha eleitoral”, opinou Nascimento.