Título: Porta aberta para todas as chantagens
Autor: Lyra, Paulo De Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 15/03/2012, Política, p. 2/3

Com a troca de líderes no Congresso, base aliada aproveita para apresentar a fatura ao Planalto. Os sete senadores do PR anunciam que vão para a oposição, e o PMDB ameaça jogar duro em votações importantes » PAULO DE TARSO LYRA » DENISE ROTHENBURG » JÚNIA GAMA

A base aliada resolveu comprar a briga com o Palácio do Planalto e está disposta a infernizar a vida do governo. O grupo que comanda o PMDB no Senado lembrou que o novo líder do governo na Casa, Eduardo Braga (PMDB-AM), terá que negociar para conseguir os votos favoráveis à tramitação de propostas em plenário. Na Câmara, o partido avisou que o Código Florestal vai paralisar tudo. "Já aconteceria isso antes. Agora, sim, tudo vai travar", disse o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Os senadores do PR não gostaram da notícia de que Paulo Sérgio Passos seria mantido no Ministério dos Transportes e anunciaram que vão para a oposição.

O Planalto sentiu o golpe do PR e, no início da noite, Eduardo Braga e o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), foram acionados para tentar uma recomposição com os republicanos. Eles chamaram o líder do partido no Senado, Blairo Maggi (MT), e o presidente nacional do partido, Alfredo Nascimento (PR-AM), para uma conversa reservada, na qual tentaram convencer Blairo a ir para o Ministério dos Transportes, já que ele seria um nome aceito pela presidente. "Só vou se tiver carta branca para nomear e demitir quem eu quiser, inclusive o Paulo Sérgio", disse Blairo.

Os dois senadores retornaram ao Planalto para levar à presidente os termos colocados por Blairo. "Vamos conversar mais sobre o PR amanhã (hoje). Dialogar é o melhor caminho, mas não depende de nós. Nomear ministro é atribuição da presidente", disse Walter Pinheiro ao Correio.

A crise com o PR começou a ser desenhada à tarde, quando Blairo foi chamado para discutir a situação do partido com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti. Blairo sentou-se à mesa com a ministra com uma lista de nomes sugeridos para o cargo. No rol, três deputados, Luciano Castro (RR), Milton Monti (SP) e Wellington Fagundes (MT), o vereador de São Paulo Antônio Carlos e o ex-senador César Borges (BA).

Ideli, com a caneta em punho, fez o que os americanos chamam de check-list. "Deputado não pode", disse, ao riscar os nomes de Luciano, Monti e Fagundes. "Esse aqui pode ser diretor", disse fazendo um V ao lado do nome de Borges. Blairo fez cara de quem estava no lugar errado. "Como? Não estou entendendo." Ideli explicou: "Deputado não pode, porque só pode ser ministro". Foi aí que Blairo, sempre rosado, ficou vermelho: "Como é?" Ideli, então, abriu o jogo: "Olha, vamos manter o Paulo Sérgio (Passos) e dar a vocês dois diretores".

O senador, que estava ali para tentar indicar um nome da sua bancada, encerrou a conversa: "Então, não temos mais nada a conversar". A senha estava dada: o PR no Senado sairia dali para a oposição. "Estamos há nove meses conversando. Vocês resolvem a vida de todo mundo, menos a nossa. Agora, o pessoal da Câmara vai conversar com o governo, da nossa parte não tem mais negociação", pontuou Blairo, por telefone, à ministra Ideli.

Deboche No PMDB, como bem avaliou uma liderança partidária, o dia era de "ressaca". Eduardo Braga é visto como alguém "que não conhece os escaninhos do Congresso". Em tom de deboche, interlocutores do partido disseram que, na primeira votação em Comissão ou plenário baseada no regimento interno, Braga entrará em parafuso. "O Jucá (Romero, ex-líder do governo) sabia de cabeça onde estava cada projeto de interesse do Planalto. Braga vai sofrer até aprender isso", resumiu uma fonte do partido.

Raposas velhas do parlamento, os peemedebistas trabalham com uma aritmética simples para qualquer leigo: o grupo comandado por Renan, Jucá e o presidente do Senado, José Sarney (AP), conta com 12 votos. Os dissidentes, de onde veio Braga, somam oito, se tanto. "Você acha que Requião (Roberto Requião), Simon (Pedro Simon) e Jarbas (Jarbas Vasconcelos) votarão com o governo? Claro que não. O nosso grupo é unido, o deles não", resumiu o senador Lobão Filho (MA). Esse número ainda vai aumentar, já que o senador Clésio Andrade (ex-PR) filia-se ao PMDB neste final de semana, abençoados por Renan e Sarney.

O alerta e Collor No início da noite de ontem, o senador Fernando Collor (PTB-AL) fez um alerta à presidente Dilma Rousseff sobre o relacionamento com o Congresso. "A base do governo está sentindo um gosto de um certo azedume. O diálogo precisa ser reaberto", disse. Eleito presidente da República em 1989, Collor afirmou ter experiência no tema. "É fundamental que o Planalto ouça essa Casa e ouça a Casa ao lado. Digo com experiência de quem, exercendo a presidência da República, desconheceu a importância da Câmara e do Senado. O resultado desse afastamento do Legislativo brasileiro resultou no meu impeachment", disse O recado de Collor ocorreu em meio ao discurso de despedida do senador Romero Jucá (PMDB-RR) da liderança do governo no Senado, após perder as rédeas da base na votação que culminou na rejeição da indicação de Dilma para a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).