Correio braziliense, n. 20006, 28/02/2018. Política, p. 2

 

O primeiro ato: troca no comando da PF

Paulo de Tarso Lyra, Rodolfo Costa, Natália Lambert e Bernardo Bittar

28/02/2018

 

 

GUERRA URBANA » Logo após tomar posse no Ministério da Segurança Pública, Jungmann decide substituir o desgastado Fernando Segóvia por Rogério Galloro na direção-geral da Polícia Federal

No primeiro dia como homem forte da segurança pública federal, o ministro Raul Jungmann chegou com a caneta afiada e, em seu primeiro ato, colocou Rogério Galloro no lugar de Fernando Segóvia no comando da Polícia Federal. Além de deixar claro quem manda na hierarquia da pasta, Jungmann ainda fez um favor ao presidente Michel Temer. Ao substituir Segóvia, que havia falado demais sobre as investigações do inquérito dos portos, Jungmann livrou Temer do desgaste de exonerar o diretor-geral da PF por inconfidências em um assunto diretamente ligado ao chefe do poder Executivo.

A substituição do comando-geral da PF foi sacramentada em uma reunião realizada na noite de domingo, no Palácio do Jaburu. Naquele encontro, ficou acertado que a pasta seria criada por medida provisória, que Jungmann seria o ministro e que Segóvia estava fora. A troca acabou atribuída por interlocutores do governo às polêmicas nas quais o agora ex-diretor-geral da PF se envolveu. “Não dá para ter um diretor que a Justiça manda calar a boca toda hora. Ele se dedicou mais aos holofotes do que ao trabalho discreto que se espera de um diretor-geral”, declarou uma fonte palaciana.

O agora ex-diretor da Polícia Federal acumulou crises e confrontos. Tanto que a saída dele foi comemorada, ainda que discretamente, no Ministério Público Federal. Procuradores deram o crédito da mudança à chefe do MPF, Raquel Dodge, que pediu a não interferência dele no processo envolvendo o presidente Temer. Para não arrumar mais confusão, contudo, Dodge fez questão de se blindar das acusações de ter comemorado a mudança. “Essa mudança foi instituída pelo ministro da Segurança Pública e ponto. Acreditava-se, inclusive, na permanência do Segóvia. Essas mudanças são naturais quando se cria um ministério”, contou ao Correio um integrante do MPF.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, foi bem mais explícito. Para ele, as declarações dadas por Segóvia tornaram insustentável a situação dele. “O trabalho foi contestado internamente, externamente, e ele se colocou em uma situação delicada. Um diretor-geral não pode se manifestar sobre um inquérito, independentemente do mérito dele”, comentou. “Aquele episódio deu uma concepção profundamente equivocada do trabalho policial, que é técnico e isento”, acrescentou Robalinho.

A queda de Segóvia repercutiu como um rastilho de pólvora. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse ter sido pego de surpresa com a substituição. “Não sabia, foi uma surpresa mesmo. Essa decisão é papel do ministro, mas acho o Segóvia um ótimo nome. Assim como tenho certeza de que seu sucessor também será.” Para o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), o melhor é que o novo ministério comece com nomes diferentes em todas as instâncias. “O novo diretor Rogério Galloro e Segóvia são do mesmo grupo, e um deverá dar continuidade ao trabalho que o outro vinha fazendo, sem falar além do necessário”, provocou.

Na opinião do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a queda de Segóvia era esperada. “Se ele não caísse pelo ato em relação ao presidente da República, ele, fatalmente, cairia nos próximos dias por ato da procuradora-geral da República ou por meio de uma ação popular”, acredita. O presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, afirmou que, apesar da naturalidade quanto às mudanças no âmbito da administração pública, é imprescindível que “qualquer ação nesse sentido ocorra de forma a garantir que a instituição continue funcionando de acordo com o interesse público, livre de pautas corporativas e de pressões políticas, que não devem, sob nenhuma hipótese, influenciar o trabalho investigativo e a produção isenta da prova material”, declarou, com a devida autonomia técnica, científica e funcional à perícia criminal federal.

Já o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luis Boudens, foi cauteloso ao opinar sobre se a troca no comando da PF estaria diretamente relacionada ao desgaste do ex-diretor-geral, embora reconheça que exista esta possibilidade. “Não acredito que ele (o ministro Jungmann) faria mudança por esse motivo. Mas é óbvio que o Segóvia, apesar de ser um policial com bom trâmite, acumulou muitas situações constrangedoras com as entrevistas (que deu).”

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Discreto, operacional e delegado desde 1995

28/02/2018

 

 

Operacional e discreto. Assim, o novo diretor-geral da Polícia Federal, Rogério Galloro, é definido por companheiros da instituição. Após as polêmicas em torno de Fernando Segóvia, a opção do ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, era por um perfil mais reservado. E por alguém com vasta experiência e apreço na corporação.

Desde 22 de novembro, Galloro ocupava o cargo de secretário nacional de Justiça, do Ministério da Justiça. Ele era responsável por assuntos estratégicos como migração, refugiados, estrangeiros, cooperação jurídica internacional, recuperação de ativos, combate à corrupção e ao tráfico de seres humanos. Em tempos de intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro e de crise humanitária que tem provocado uma grande migração de refugiados venezuelanos, a opção recaiu por um nome extremamente técnico e apolítico.

O nome de Galloro chegou a ser cogitado antes de o governo bater o martelo na escolha por Segóvia. O ex-diretor-geral Leandro Daiello queria como sucessor o gerente de projetos do órgão, delegado Luiz Pontel. Sem apoio, tentou emplacar Galloro. A classe política, entretanto, queria um nome supostamente mais influenciável. Então, Segóvia acabou escolhido.

Não é à toa que Galloro seja tão prestigiado dentro da PF. Ex-aluno da Universidade de Harvard no Programa Segurança Nacional e Internacional, ele começou a carreira na instituição como delegado, em 1995. Atuou em unidades de repressão a drogas, a crimes fazendários e de inteligência policial. Por cinco anos, foi professor da Academia Nacional de Polícia na cadeira migração. Representante da Polícia Federal junto à Organização de Aviação Civil Internacional (Icao), em Montreal, Galloro coordenou o projeto do Novo Passaporte Brasileiro, em 2006. O novo diretor-geral também esteve à frente das forças da PF na segurança da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016. Ele é bacharel em direito e tem MBA pela FGV em gestão de políticas de segurança pública. (RC e PTL)