O Estado de São Paulo, n. 45364, 30/12/2017. Economia, p.B1

 

 

 

 

 

União, Estados e municípios perdem R$ 9 bi com benefício para empresas 

 

Contas públicas. Sem alarde, Congresso derrubou um veto presidencial e concedeu abatimento na cobrança de tributos federais que incidem sobre incentivos fiscais oferecidos por governadores a empresas; mudança não estava prevista no Orçamento de 2018

Por: Adriana Fernandes - Idiana Tomazelli


Adriana Fernandes 
Idiana Tomazelli/
 BRASÍLIA

Um erro estratégico de articulação política do governo federal fará União, Estados e municípios perderem R$ 9,3 bilhões em arrecadação de tributos em 2018. No mês passado, deputados e senadores derrubaram um veto presidencial na lei que validou incentivos fiscais estaduais concedidos por meio do ICMS às empresas. Sem alarde, o Congresso concedeu às empresas abatimento na cobrança de tributos federais sobre esses incentivos. Como consequência direta, haverá um impacto na arrecadação que não estava previsto no orçamento.

Apesar dos sucessivos alertas feitos por técnicos do Ministério da Fazenda, o Congresso derrubou – em meio a uma maratona de votações de vetos presidenciais, em novembro – a rejeição do presidente Michel Temer a um artigo da lei 160, sobre incentivos fiscais estaduais.

Justamente tentando impedir a perda de arrecadação, o presidente havia vetado o trecho da lei que equiparava o benefício fiscal dado pelos Estados a um incentivo para investimento. Com esse tratamento diferenciado, as empresas pagam menos tributos, inclusive o Imposto de Renda – que é compartilhado pela União com Estados e municípios. Historicamente, o governo arrecada impostos sobre esses benefícios fiscais.

Para a ex-secretária Fazenda do Estado de Goiás, Ana Carla Abrão, a derrubada do veto provocou uma “aberração” que vai contra a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) porque trata renúncia fiscal como investimento para fins tributários. Na sua avaliação, há dois riscos: os estados abrem mão de arrecadação do IR e há banalização dos incentivos sem que o seu real impacto tenha sido medido.

A perda de R$ 9,3 bilhões na arrecadação não está prevista no Orçamento de 2018 e agora terá de ser compensada com outras medidas, segundo informou uma fonte da área econômica. O problema, no entanto, não foi propalado pelo governo – que também não conseguiu aprovar nenhuma medida do pacote fiscal lançado em agosto para reforçar o Orçamento de 2018, inclusive o congelamento do aumento dos salários dos servidores.

O veto foi derrubado em novembro, decisão que foi apoiada por governos estaduais, atendendo a uma pressão das empresas beneficiadas pelos incentivos fiscais com o ICMS. Na contramão da pressão dos Estados para tentar arrancar do governo federal novos repasses para reforçar seus caixas, os governadores acabaram traçando uma estratégia que trouxe mais prejuízo do que ganhos para a sua arrecadação em 2018.

Articulação. Enquanto o maior esforço dos governadores foi garantir a transferência de R$ 1,9 bilhão referente à compensação pela desoneração do ICMS em exportações, outras medidas que dependiam do Congresso e cuja arrecadação seria dividida com os Estados e municípios acabaram não sendo votadas (leia mais ao lado).

A estratégia do governo federal agora, segundo uma fonte, é melhorar articulação com os governadores e prefeitos para ajudar na aprovação das medidas fiscais em 2018 e dar mais alívio para as finanças dos governos regionais.

 

 

 

 

 

 

Outras medidas têm impacto de R$ 7,6  bi nas contas estaduais

 

Medidas que poderiam melhorar as contas dos Estados no ano que vem acabaram não entrando em vigor, gerando um impacto negativo na conta dos governos estatuais de ao menos R$ 7,6 bilhões. Os governadores não se beneficiarão, por exemplo, do incremento na arrecadação esperada com a mudança na tributação de fundos exclusivos, voltados a investidores de alta renda. A medida precisava ser aprovada pelo Congresso ainda este ano para valer em 2018, e se esperava menor resistência à votação por se tratar de uma iniciativa que taxa os mais ricos. A estimativa era de que Estados e municípios ficassem em 2018 com cerca de R$ 5,8 bilhões (pouco menos da metade só para governos estaduais), enquanto a União, com aproximadamente R$ 6 bilhões. Na melhor das hipóteses, a medida só poderá valer em 2019 caso seja aprovada no ano que vem. A decisão do Supremo Tribunal Federal de suspender a elevação da contribuição previdenciária de servidores de 11% para 14% também afetou os Estados. Embora a medida atinja diretamente apenas o funcionalismo federal, há um efeito cascata. A Constituição determina que a alíquota previdenciária cobrada dos servidores da União seja o piso para Estados e municípios. Essa elevação incrementaria a arrecadação dos Estados em R$ 1,8 bilhão.

 

 

 

Temer libera R$ 2 bilhões para municípios

Dinheiro deve ser usado em áreas de saúde e educação; governo diz que terá de retirar recursos de outras áreas

 

 

BRASÍLIA

O presidente Michel Temer assinou ontem Medida Provisória liberando R$ 2 bilhões da União para municípios em dificuldades financeiras emergenciais, que recebem recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O dinheiro só será transferido no exercício de 2018 e deverá ser aplicado preferencialmente nas áreas de saúde e educação. Para repassar os recursos aos prefeitos, o governo terá de reduzir despesas em outras áreas, admitiu o Ministério do Planejamento em resposta ao Broadcast/Estadão. Segundo o Planejamento, haverá a redução correspondente de despesas, ou seja, um deslocamento de recursos de uma área para outra. A intenção do governo era repassar os recursos ainda em 2017, por meio de abertura de crédito extraordinário. Mas, com receio de incorrer em crime de responsabilidade fiscal caso todas as prefeituras fossem atendidas, o governo acabou determinando a liberação dos recursos em 2018.

Para arrefecer o desgaste com a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e tentar reforçar que o governo manteve seu compromisso com prefeituras, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, destacou, em entrevista coletiva, que com a edição da MP Temer cumpre a promessa que havia feito aos prefeitos. O ministro, no entanto, não soube informar de onde virão os recursos e disse que o orçamento do ano que vem será readequado para garantir o repasse. “Ainda não foi definido a forma de alocação desses recursos”, disse. Apesar de ressaltar que, com a MP, o governo demonstra seu apoio aos municípios, o ministro admitiu que a liberação dos R$ 2 bilhões só acontecerá “em fevereiro ou março” depois da aprovação do projeto de lei pelo Congresso. “Não estamos aqui para cometer qualquer ato que já levou a grandes problemas e questões no Brasil. Não podemos esquecer que existe uma Lei Orçamentária que precisa ser cumprida”, afirmou. A promessa do repasse dos R$ 2 bilhões às prefeituras foi feita por Temer em novembro, durante reunião no Planalto com prefeitos e ministros, em plena negociação pela retomada da votação da reforma da Previdência./ CARLA ARAÚJO, FELIPE FRAZÃO E ADRIANA FERNANDES

 

 

 

 

 

 

Marun chama de nazista quem o acusa de chantagem

Por: Fernando Nakagawa / Julia Lindner

 

Fernando Nakagawa 
Julia Lindner
/ BRASÍLIA

O ministro da secretaria de Governo, Carlos Marun, comparou a nazistas aqueles que estariam propagando “duas mentiras” sobre sua recente declaração que relacionou o apoio à reforma da Previdência à liberação de crédito dos bancos públicos. “É como o nazismo em que uma mentira que se repete à exaustão e se transforma em verdade”, disse Marun em evento ontem em Brasília. A polêmica envolvendo Marun virou o principal tema da cerimônia, programada para assinar contratos de financiamento com quatro empresas estaduais de saneamento básico. Segundo o ministro, a solenidade era a prova de que o governo não está chantageando governadores em troca de apoio à reforma da Previdência. Durante o evento, o ministro Alexandre Baldy (Cidades) e o governador Marconi Perillo (GO) saíram em defesa de Marun.

O ministro disse que há uma “trajetória de hipocrisia e mentira que tenta se estabelecer com muita força”. As mentiras estariam sendo determinadas pela propagação do discurso “politicamente correto”, disse. Para Marun, a primeira mentira é que “a Caixa é só um banco, como é o Bradesco”. “A Caixa existe para executar políticas públicas”, disse. “A outra mentira é que eu estaria chantageando, condicionando (a liberação de crédito dos bancos públicos)”, disse o ministro, que exortou quem o acusa a “mostrar, separar naquela entrevista” sua fala sobre a chantagem: “Não vão achar.”. Apesar de rechaçar a hipótese de condicionamento da votação da Previdência à liberação de crédito, o ministro disse que o governo não deixará de pedir apoio à reforma. “Eu não abrirei mão de pleitear a todos os agentes essa ação, que é a aprovação da reforma.”