O Estado de São Paulo, n. 45362, 28/12/2017. Economia, p.B3
Por: Igor Gadelha Daiene Cardoso
Igor Gadelha
Daiene Cardoso / BRASÍLIA
Sete dos nove governadores do Nordeste enviaram ontem carta aberta ao presidente Michel Temer protestando contra a declaração do ministrochefe da Secretaria de Governo, Carlos Marun, que admitiu que o governo pressiona gestores estaduais e municipais a trabalharem a favor da aprovação da reforma da Previdência em troca da liberação de recursos em financiamentos de bancos públicos, como a Caixa. No documento, os governadores prometem acionar política e judicialmente os agentes públicos envolvidos, caso a “ameaça” de Marun se confirme.
“Os governadores do Nordeste vêm manifestar profunda estranheza com declarações atribuídas ao sr. Carlos Marun, ministro de articulação política. Segundo ele, a prática de atos jurídicos por parte da União seria condicionada a posições políticas dos governadores. Protestamos publicamente contra essa declaração e contra essa possibilidade e não hesitaremos em promover a responsabilidade política e jurídica dos agentes públicos envolvidos, caso a ameaça se confirme”, diz versão da carta, antecipada pelo Estadão/Broadcast.
Um dos idealizadores da carta, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), disse que somente os colegas do Rio Grande do Norte e Sergipe não assinaram o documento. Os outros signatários – incluindo o governador de Alagoas, Renan Filho (PMDB), do mesmo partido do presidente – fazem oposição ao governo de Michel Temer.
Conteúdo. No documento, os gestores pedem que Temer “reoriente” seus ministros para evitarem práticas classificadas pelos signatários como “criminosas”. “Vivemos em uma federação, cláusula pétrea da Constituição, não se admitindo atos arbitrários para extrair alinhamentos políticos, algo possível somente na vigência de ditaduras cruéis. Esperamos que o presidente Michel Temer reoriente os seus auxiliares, a fim de coibir práticas inconstitucionais e criminosas”, diz a carta.
Em entrevista na terça-feira, Marun admitiu que o Palácio do Planalto pressiona os governadores a trabalharem a favor da aprovação da reforma da Previdência em troca da liberação de recursos em financiamentos de bancos públicos. “Realmente, o governo espera daqueles governadores que têm recursos a serem liberados, financiamentos a serem liberados, como de resto de todos os agentes públicos, reciprocidade no que tange à questão da (reforma da) Previdência”, disse o ministro.
‘Chantagem’. Marun negou, contudo, que a negociação se configura como “chantagem”. “Financiamentos da Caixa são ações de governo. Senão, o governador poderia tomar esse financiamento no Bradesco, não sei onde. Obviamente, se são na Caixa, no Banco do Brasil, no BNDES, são ações de governo, e nesse sentido entendemos que deve, sim, ser discutida com esses governantes alguma reciprocidade no sentido de que seja aprovada a reforma da Previdência, que é uma questão que entendemos hoje ser de vida ou morte para o Brasil”, justificou.
Como revelou a Coluna do Estadão na semana passada, Marun levantou todos os pedidos de empréstimos na Caixa por Estados, capitais e outras grandes cidades e condicionou a assinatura dos contratos à entrega de votos pelos governadores e prefeitos que exercem influência sobre os deputados.
Procurada, a Caixa não se manifestou sobre o assunto O Planalto informou que ainda não recebeu a carta dos governadores. Marun, por sua vez, disse que só se manifestará após ser “cientificado” do conteúdo do documento.
Daniela Amorim
ENVIADA ESPECIAL
SÃO JOÃO DA BARRA (RJ)
O presidente Michel Temer aproveitou ontem mais uma agenda pública para fazer a defesa da necessidade de aprovação da reforma da Previdência pelo Congresso. Segundo o presidente, o governo espera aprovar a reforma em fevereiro de 2018, “se Deus quiser”. Temer insistiu que, se a reforma não for aprovada agora, não haverá um candidato nas próximas eleições que não terá de tocar no assunto. Ele argumentou que a intenção do governo é evitar medidas mais radicais no futuro e que, em tese, ninguém terá prejuízo com as mudanças. “(O novo presidente) terá de fazer uma reforma muito mais radical”, sentenciou. Temer enumerou mais uma vez os feitos de seu mandato, como a reforma do ensino médio e a aprovação do teto dos gastos públicos. Segundo ele, logo depois da Previdência, o governo fará a simplificação tributária no País, fechando o “ciclo reformista”. “Se não tivéssemos autoridade, não tínhamos feito o que fizemos em dezoito meses”, disse.
Exportações. O presidente participou da cerimônia de assinatura do decreto que cria a Zona de Processamento de Exportação (ZPE) do Açu, localizada no Distrito Industrial de São João da Barra, litoral norte do Rio de Janeiro. Participaram da comitiva do presidente o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Moreira Franco, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Marcos Pereira, e o governador do Estado do Rio Janeiro, Luiz Fernando Pezão. Tanto Pezão quanto Moreira Franco também defenderam a necessidade de aprovação da reforma da Previdência. Como argumento, apresentaram a necessidade de equilibrar as contas de governos estadual. “É impossível atravessar essa crise sem discutir a reforma da Previdência. Nenhum candidato vai passar próximas eleições sem discutir esse tema”, declarou Pezão. “Esse é o grande problema do País.” A Zona de Processamento de Exportação (ZPE) do Açu já tem um investimento previsto de R$ 42 milhões de uma empresa de laminação de rochas, que deve ser a primeira a se instalar no local. “A ZPE é um processo de lento investimento”, disse José Magela Bernardes, presidente da Prumo Logística, empresa que desenvolve e opera o Porto do Açu. / COLABOROU I.G.