Valor econômico, v. 18, n. 4425, 19/01/2018. Política, p. A8.
Em respostas à PF, Temer nega ter beneficiado Rodrimar em decreto
Luísa Martins
19/01/2018
O presidente Michel Temer negou ter recebido doações do grupo Rodrimar em troca de favorecimento à empresa na edição do chamado Decreto dos Portos - ele ainda negou que seus aliados tenham atuado como arrecadadores de recursos para suas campanhas eleitorais.
As negativas fazem parte das respostas a 50 questionamentos formulados no início de janeiro pela Polícia Federal (PF) no âmbito de um inquérito que investiga se Temer teria beneficiado a empresa na edição do decreto.
O documento com as respostas foi juntado ontem aos autos da investigação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e também atinge o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) e os empresários Ricardo Mesquita e Antonio Grecco, ligados à Rodrimar. O relator do caso na Corte é o, ministro Luís Roberto Barroso.
Os esclarecimentos de Temer serão, agora, analisados pela PF, que deve concluir, em um relatório, se há ou não indícios de envolvimento do presidente em atos irregulares. Esse relatório será enviado à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que então decidirá se oferece denúncia ou se arquiva o processo.
No documento entregue ao STF, Temer afirma que todos os doadores de suas campanhas estão registrados na Justiça Eleitoral, mas que, especificamente da Rodrimar, nunca recebeu verba alguma. Negou, inclusive, ter tido qualquer contato com Ricardo Mesquita, diretor do grupo.
Quanto a Grecco, presidente da empresa, afirmou: "Estive com ele em duas ou três oportunidades, sendo que jamais tratei de concessões para o setor portuário. Nenhum pedido me foi formulado por ele".
Temer declarou, ainda, que nunca teve com o setor portuário relação diversa da que - na condição de parlamentar, vice-presidente e presidente - mantinha com outras áreas empresariais. Também negou ter determinado a Rocha Loures que acompanhasse a questão da concessão das empresas do setor. "Não lhe dei nenhuma orientação a respeito", disse. "Jamais soube que Loures estava sendo pressionado por empresários do setor portuário. Nunca autorizei que ele fizesse tratativas em meu nome com esses empresários", completou.
Ele também negou ter recebido pedidos do grupo JBS - o inquérito foi aberto a partir das delações de executivos do frigorífico - para resolver pendências de empresas concessionárias no Porto de Santos. Afirmou que não conhece o empresário Edgar Safdié, apontado pela PF como principal suspeito de operar propina da J&F a Temer, por intermédio de Rocha Loures.
Disse, ainda, que não solicitou ao presidente da Caixa Econômica Federal, Gilberto Occhi, que tratasse de assunto de interesse da Rodrimar. Ele reiterou que a empresa não foi beneficiada com a edição do decreto e que sequer foi procurado pelos executivos.
Reconheceu, no entanto, que os ministros Eliseu Padilha (Casa-Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) podem ter acompanhado a tramitação do decreto. "Não é improvável", afirmou à PF. Porém, disse que "não passou nenhuma orientação" a eles sobre "matérias que deveriam ser abrangidas" pela medida.
O presidente afirmou que não recebeu nenhuma oferta de valores para inserir dispositivos "mais benéficos" no decreto, ainda que em forma de doações eleitorais. "Em tal hipótese, minha reação seria de enérgica repulsa, seguida da adoção de medidas cabíveis", destacou.
Em pelo menos dois pontos de seu rol de respostas, Temer demonstra insatisfação com as perguntas elaboradas pela polícia. Ao responder sobre uma eventual solicitação, a aliados, para que recebessem propina em seu nome - em retribuição às novas normas incluídas no novo decreto -, o presidente classificou a questão como "agressiva, desrespeitosa, impertinente e ofensiva".
Em outro momento, criticou a PF por questionar se ele já havia feito transferências de recursos financeiros a seu ex-assessor José Yunes, de quem reconheceu ser amigo. "Como ele, durante algum tempo, dedicou-se aos ramos imobiliário e de construções, realizei alguns poucos negócios nesta área por seu intermédio. Embora responda à pergunta, peço vênia para realçar sua absoluta impertinência em face do objeto do inquérito."
Temer negou que Yunes tenha atuado como "arrecadador de recursos" para suas campanhas - disse o mesmo sobre Rocha Loures e sobre o coronel João Batista Lima Filho, também seu amigo de décadas e suspeito de envolvimento no esquema.
O inquérito contra Temer foi instaurado em setembro pelo STF, atendendo a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). Se confirmadas, as fraudes no decreto podem imputar aos envolvidos os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.