Correio braziliense, n. 19985, 10/02/2018. Política, p. 3

 

PF denuncia policiais do Senado

Bernardo Bittar

10/02/2018

 

 

JUSTIÇA » Polícia Federal acusa agentes da casa legislativa de agir para prejudicar investigações da Operação Lava-Jato. Processo está no STF

A direção da Polícia Federal pediu à Justiça o afastamento dos quatro integrantes da Polícia Legislativa do Senado Federal que fizeram varreduras nas casas de senadores para tentar encontrar possíveis grampos. A PF acusa os agentes de obstrução da Justiça e intimidação de testemunhas no âmbito da Lava-Jato. O processo foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), distribuído ao ministro Edson Fachin, e, agora, está com a Procuradoria-Geral da República (PGR), que pediu vista. A ação envolve suposto desvio de conduta da equipe de segurança do Senado, enquadrada na Operação Métis, que investiga ações com o intuito de atrapalhar apurações da Lava-Jato.

Segundo o STF, a denúncia da Polícia Federal foi feita em agosto do ano passado, transformou-se em processo e só chegou às mãos de Fachin na última quarta-feira, distribuído por prevenção. Entre os agentes que seriam afastados está o chefe da segurança do Senado, Pedro Ricardo de Araújo, e três de seus subordinados. Eles foram acusados de “atuação ilícita” por terem ido às casas dos senadores Fernando Collor (PTC-AL), Edison Lobão (PMDB-MA) e Gleisi Hoffmann (PT-PR), além do ex-senador José Sarney (PMDB-AP), em busca de escutas — o que, segundo a PF, pode ter atrapalhado a Lava-Jato. A corporação diz que o ato “consistia em medida de contrainteligência, ou seja, vasculhar gabinetes e residências ligadas aos parlamentares e identificar possíveis grampos” e pediu que os policiais legislativos sejam impedidos de entrar no Senado Federal.

Desfaçatez

“Como já manifestado nos autos, a desfaçatez e a desinibição dos investigados como se fossem inatingíveis reclama decisão proporcional do Supremo, cabendo ao Judiciário assegurar a ordem pública, paralisando a atuação ilícita deste grupo criminoso, e promover a conveniência da instrução criminal ao blindar as testemunhas dos mais diversos atos intimidatórios”, escreveu o representante da PF no documento enviado ao STF. “A deflagração da Operação Métis não provocou receio quanto à persecução criminal, muito menos inibiu a Direção da Polícia do Sendo de manter sua estrutura e de realizar atividades de intimidação de testemunhas da PF”, completou.

Policiais do Senado que trabalham diretamente com os acusados se revoltaram com a atitude da PF, alegando que o caso é descabido. “Soubemos dessa história com surpresa. Pensamos que a suspensão que eles levaram na época em que isso foi revelado na imprensa tinha sido suficiente. Tem até uns PADs (Processos Administrativos) ainda em fase de apuração. A diretoria do Senado falou alguma coisa sobre um processo no Supremo, mas os policiais só souberam quando foram atrás. Não vejo sentido nisso. A Polícia Legislativa atua de maneira condizente com o treinamento dado pelo Senado”, disse um deles.

O mal-estar ocorreu, entre outras coisas, porque a Polícia Legislativa precisa cumprir as ordens dos parlamentares. “Não é como se os caras tivessem sido contratados como seguranças particulares, sabendo que a retirada de escutas teria envolvimento com uma investigação federal. É uma outra história. Estamos em uma casa legislativa, você precisa acreditar que o sistema vai funcionar corretamente. Um senador da República com medo de estar sendo vigiado pedir uma varredura em casa não é incomum. A má coincidência foi esse entrelaço com a Lava-Jato.”

Em 2016, os policiais legislativos denunciados pela PF foram presos por causa das varreduras, que tinham como objetivo retirar escutas telefônicas de imóveis particulares e funcionais ligados a três senadores e um ex-congressista — todos investigados na Operação Lava-Jato. A informação, que deu origem à Operação Métis, partiu de um policial que fez acordo de delação premiada com o Ministério Público.

O agente afirmou a investigadores que, em quatro ocasiões, equipamentos do Senado foram usados para rastrear escutas em imóveis particulares e funcionais ligados a parlamentares investigados na Lava-Jato. O objetivo, segundo o colaborador, era fazer a chamada contrainteligência: localizar e destruir eventuais sistemas de escuta telefônica e ambiental. Em pelo menos duas ocasiões, as ações foram em São Luís (MA), terra de Lobão Filho, e Curitiba (PR), local de origem de Gleisi.

A diretora-geral do Senado, Ilana Trombka, afirmou ao Correio que consultou a departamento jurídico da Casa e que não encontrou nenhuma notificação aos servidores. A assessoria de imprensa do STF informou que, a princípio, o Senado só deverá ser formalmente notificado caso o ministro Fachin determine o afastamento dos policiais legislativos. A Polícia Federal não deu detalhes do processo. O delegado responsável pela queixa está fazendo uma especialização fora do Brasil e não foi encontrado.

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Cármen Lúcia critica Judiciário 

Renato Souza

10/02/2018

 

 

 

A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), afirmou que o “Judiciário tem um débito enorme com a sociedade”. As declarações foram realizadas em visita a Goiás ontem. Além de Goiânia, ela foi a Formosa, no entorno de Brasília.

Cármen Lúcia volta a Goiás um mês após a primeira visita, que ocorreu em seguida a uma série de rebeliões que deixaram mortos e feridos nas prisões do estado. Na mais grave delas, nove detentos foram mortos no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. “O cidadão brasileiro está cansado da ineficiência de nós todos, inclusive nós do Poder Judiciário, que, por mais que tentemos, e tenho certeza estamos tentando, temos sempre um débito enorme com a sociedade. Esperamos que a gente dê uma resposta a isso. Acho que neste momento é o que estamos tentando demonstrar”, destacou a ministra.

Instituições

Durante discurso em Formosa, ela disse que os brasileiros não confiam nas instituições e lembrou que os servidores públicos são mantidos com recursos pagos pela sociedade. “O cidadão brasileiro espera poder voltar a confiar nas instituições, nós somos pagos pelo cidadão para fazer e temos de fazer”, disse a ministra. O governador de Goiás, Marconi Perillo, negou que o governo estadual tenha perdido o controle das prisões. A rebelião em Aparecida de Goiânia ocorreu no primeiro dia do ano. Mais de 200 presos fugiram, sendo que alguns ainda estão foragidos.

A Cadeia Estadual de Formosa tem capacidade para 300 detentos e custou R$ 19 milhões aos cofres públicos. Com 6 mil m², a unidade prisional é composta por dois pavilhões. Cada cela tem espaço para oito presos, sendo que quatro cubículos são destinados aos internos em situação de isolamento. Além de salas de aula, foram construídos espaços para atendimento psicológico e espiritual.

Ao falar sobre os presídios, Cármen Lúcia disse que as condições das prisões agravam a violência. “É lamentável que se tenha, no Brasil, um sistema penitenciário em condições precaríssimas, mas o empenho em conjunto do Poder Judiciário e do Poder Executivo, como ocorreu em Goiás, dá a certeza de que é possível fazer muito mais. “Qualquer um pode errar, e o dever de quem erra é pagar, mas deve-se cumprir pena em condições de dignidade para que volte à sociedade, o que não tem acontecido no sistema penitenciário. Isso tem gerado cada vez mais problemas de segurança ou de insegurança”, disse.

No local, ela assistiu à destruição de 3 mil armas pelo Comando de Operações Especiais do Exército. A destruição de revólveres, pistolas e fuzis ocorre para evitar que sejam utilizadas pelo crime organizado. O CNJ firmou uma parceria com o Exército para a destruição de milhares de armas que estão em fóruns de todo o país. O material fica retido durante o andamento dos processos, para serem usados como provas dos crimes que estão sendo investigados. Após a conclusão do caso, o temor das autoridades é de que grupos criminosos realizem ataques contra os tribunais para tentar obter maior poder de fogo.

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Pedido de sete anos de prisão a Geddel

10/02/2018

 

 

A Procuradoria da República no Distrito Federal pediu, em alegações finais, a pena de sete anos de prisão para o ex-ministro Geddel Vieira Lima por crime de embaraço à investigação. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o emedebista tentou evitar que o doleiro Lúcio Funaro firmasse acordo de delação premiada. O caso, investigado na Operação Cui Bono?, levou Geddel pela primeira vez à prisão, em julho de 2017, antes da descoberta do bunker dos R$ 51 milhões em um apartamento de Salvador.

“Aqui está, portanto, o dolo de Geddel em atrapalhar as investigações, pois as sondagens e pressões exercidas veladamente por Geddel Quadros Vieira Lima fizeram Lúcio Funaro recuar (temporariamente) no propósito de colaborar informalmente com as investigações, em razão do ambiente hostil no qual estava inserido, em todo o contexto de organização criminosa”, afirmam os procuradores.

Na avaliação do MPF, Geddel atuou para constranger Funaro, telefonando várias vezes para a esposa dele, Raquel Pitta, quando o operador já estava preso. Nessas conversas, pediu a ela que convencesse o operador a não se tornar um delator.

“Dessa forma, era incutida em Lúcio Funaro a apreensão e o temor por represálias, para que não colaborasse espontaneamente com as investigações, causando, portanto, embaraço à investigação de crimes praticados por organização criminosa no âmbito da CEF”, argumentam os procuradores.

Negativa

Ao prestar depoimento nesta semana ao juiz Vallisney de Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, Geddel voltou a negar que tenha tentado intimidar Funaro. Segundo ele, seus telefonemas eram para manifestar solidariedade à família do operador financeiro detido, para que não se sentissem isolados.

“Falei algumas vezes com a senhora [Raquel]. Posso dizer que esses telefonemas amigáveis devem ter-lhe feito bem”, comentou o ex-ministro, comparando a situação de Raquel Pitta à de sua própria família após ele próprio ter sido preso. “Amigos de longa data me lançaram ao degredo, ao Vale dos Leprosos”, queixou-se Geddel, que não respondeu às perguntas feitas pelos procuradores, por orientação da defesa.

O ex-ministro está preso desde 8 de setembro por conta da investigação que trata da origem dos R$ 51 milhões apreendidos em Salvador.