O Estado de São Paulo, n. 45354, 20/12/2017. Política, p. A5.

 

STF separa 'quadrilhão', mas tira ação de Moro

 Amanda Pupo / Rafael Moraes Moura

20/12/2017

 

 

Supremo manda para 1ª instância investigação sobre deputados federais e decide que processo seja conduzido pela Justiça Federal em Brasília

 

 

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem por 10 votos a 0 pelo desmembramento das investigações do “quadrilhão” do PMDB da Câmara. De acordo com os ministros, a imunidade presidencial de Michel Temer não é estendida aos demais investigados. Eles, contudo, tiraram das mãos do juiz Sérgio Moro a ação por entender que o caso não tem relação com a Petrobrás. Com a decisão, em 2019, quando a ação de Temer poderá ser retomada, as apurações não serão conduzidas pela Lava Jato em Curitiba. Apesar do consenso em torno da imunidade, o STF se dividiu sobre o encaminhamento dos processos para a Justiça de Brasília. O decano Celso de Mello não estava presente.

O relator dos casos, ministro Edson Fachin, havia decidido encaminhar a Moro as investigações por organização criminosa contra o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o ex-assessor especial da Presidência Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), depois de a Câmara barrar o prosseguimento da denúncia em relação a Temer e aos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência).

No entanto, a posição que prevaleceu é a de que as investigações devem ser remetidas à 10.ª Vara de Brasília, por não estarem associadas aos crimes apurados na Lava Jato.

Durante o julgamento, Barroso ironizou a tentativa de investigados de terem suas investigações retiradas de Moro. “É o que se tem denominado ‘periculum in Moro’”, afirmou o ministro, em referência à expressão “periculum in mora”, que significa “perigo na demora” de uma decisão tardia da Justiça.

Em linhas gerais, cinco ministros – Fachin, Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luiz Fux – votaram pelo envio de investigações a Moro, enquanto outros cinco – Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski – se posicionaram a favor do encaminhamento para a Justiça Federal do Distrito Federal. Fux, porém, se declarou posteriormente suspeito para julgar o inquérito de organização criminosa, o que abriu maioria para retirar de Moro os casos.

Ao definir o rumo das investigações, os ministros também abriram caminho para que a apuração contra Temer e seus ministros seja encaminhada a Brasília depois que o presidente concluir o mandato.

 

Inquérito. Já nos recursos apresentados por Geddel, Cunha, Loures e os executivos Joesley Batista e Ricardo Saud, no inquérito que investiga obstrução da Justiça, os ministros acompanharam Fachin em colocar as investigações na Justiça de Brasília. A exceção foi o caso do deputado federal André Moura (PSC-SE), cuja relatoria do processo espera manifestação da Procuradoria-Geral da República.

 

Joesley e Saud

O ministro Edson Fachin, do STF, manteve ontem a prisão preventiva do empresário Joesley Batista e do executivo Ricardo Saud. Fachin negou pedido de reconsideração feito pela defesa dos dois.

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Gilmar fala em erro em delação e Barroso debate

Rafael Moraes Moura / Amanda Pupo

20/12/2017

 

 

O ministro Gilmar Mendes classificou ontem de “grave erro” a homologação da delação de executivos do Grupo J&F durante o julgamento que discutiu a extensão da imunidade presidencial e o desmembramento das investigações do “quadrilhão” do PMDB da Câmara. Coube ao ministro Luís Roberto Barroso rebater e dizer que vivemos uma “tragédia da corrupção”.

Enquanto o ministro Dias Toffoli fazia a leitura do voto, Gilmar o interrompeu para criticar a homologação da delação do empresário Joesley Batista. “Populismo judicial é responsável por esse tipo de assanhamento. A história não vai nos poupar. Se continuarmos com a covardia com que tratamos os temas, o Tribunal vai ser cobrado. Isso é vexaminoso, é ruim”, disse.

Sem se dirigir diretamente a Gilmar, Barroso aproveitou e rebateu as afirmações do colega. “Eu ouvi o áudio, ‘Tem que manter isso aí, viu’. Eu vi a mala de dinheiro, eu vi a corridinha na televisão. Tudo documentado”, afirmou Barroso, em referência às filmagens que mostram o ex-deputado federal e ex-assessor especial da Presidência da República Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) carregando uma mala de dinheiro e à gravação de conversa entre o presidente Michel Temer e Joesley Batista.

“Nós vivemos uma tragédia brasileira, uma tragédia da corrupção, que se espalhou de alto a baixo. É a cultura de desonestidade em que todo mundo quer levar vantagem”, criticou Barroso. Para o ministro, há “diferentes visões da vida e do País”, mas não há “uma investigação irresponsável”.

Ao final das ponderações de Barroso, a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, tentou adotar um tom conciliador. “Toda corrupção tem de ser punida porque é crime. O Supremo tem compromisso com a Constituição e a ética constitucional. Ninguém quer um Brasil e uma política corruptos e, se quiser, não será de forma alguma aceito”, disse a presidente.

Em outubro, Barroso e Gilmar já haviam trocado acusações. Barroso afirmara que Gilmar “vai mudando a jurisprudência de acordo com o réu” e que promove não o estado de Direito, mas um “estado de compadrio”. Também afirmou que o colega tem “leniência em relação à criminalidade de colarinho branco”. Gilmar, por sua vez, atribuiu ao colega a pecha de fazer “populismo com prisões”.

 

Tragédia

“Nós vivemos uma tragédia brasileira, uma tragédia da corrupção, que se espalhou de alto a baixo. É a cultura de desonestidade em que todo mundo quer levar vantagem.”

Luís Roberto Barroso

MINISTRO DO STF