Correio braziliense, n. 19981, 06/02/2018. Política, p. 3

 

Mudanças para tentar aprovar a PEC

Alessandra Azevedo

06/02/2018

 

 

Para não desistir da reforma da Previdência, o governo precisou escancarar as negociações nas últimas semanas. Os principais articuladores já deixaram claro que, não tocarão na idade mínima para aposentadoria — fixada em 65 anos para homens e 62 para mulheres na proposta atual — e na equiparação de regras entre iniciativa privada e serviço público, os deputados podem sugerir qualquer mudança no texto, desde que retribuam com votos. Mesmo assim, ainda não há sinal da “nova” proposta, que o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, afirmou que seria divulgada hoje. A duas semanas da possível votação pelo plenário da Câmara dos Deputados, o governo ainda não encontrou o equilíbrio entre uma reforma politicamente viável e, ao mesmo tempo, economicamente aceitável.

Mesmo com investimentos em comunicação e em conversas intensivas com líderes de bancadas e governadores, o único sinal recente foi de piora, visível na pesquisa do Ibope, encomendada pelo Planalto, que mostrou que a aceitação da reforma diminuiu de 18% para 14% entre novembro e janeiro. O reflexo disso é que o placar continua estagnado, com 270 votos favoráveis, nas contagens do governo, e menos de 250, segundo a oposição — “se forçar a votar, não chega a 230”, acredita o líder da Minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE). Até a data de votação segue indefinida, embora não deva passar de fevereiro. Se chegar a março, “não há mais o que ser feito”, disse ontem o relator da proposta, deputado Arthur Maia (PPS-BA).

Embora a matéria deva ser pautada logo após o carnaval, a votação deve ficar só para a semana seguinte. Ou seja, se a discussão começar em 19 de fevereiro — data definida pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), antes do recesso —, a votação ficará para a semana de 26 de fevereiro, acredita o relator. Como ainda falta definir as mudanças no texto que, de fato, trarão votos favoráveis, é “claro” que a tramitação pode atrasar, disse. “Não tem jeito. A gente tem que consultar as pessoas para saber o que traz voto”, explicou. Segundo uma fonte a par das negociações, a maior dificuldade é ter certeza que os votos prometidos serão, de fato, entregues. “Muitos pedem alterações, se comprometem, mas depois não ajudam”, disse, citando como exemplo a bancada da bala, que recentemente enviou uma pauta de sugestões de mudanças ao relator, mas, na hora de contabilizar os votos, não garantiu nenhum a mais. “Quem era contra continuou contra.”

Alterações

A nova emenda aglutinativa, que incluirá as mudanças em negociação, tem sido escrita “a 40 mãos”, pontuou Arthur Maia. Os envolvidos nas negociações — grupo que inclui integrantes do Palácio do Planalto, dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, o presidente da Câmara e lideranças partidárias — têm analisado a viabilidade de aceitar sugestões sem penalizar muito os ganhos econômicos previstos para os próximos anos com a reforma. Os únicos pontos que, “definitivamente, são intocáveis”, como reforçou o relator ontem, são a idade mínima e a equiparação de regras entre iniciativa privada e serviço público, que ele definiu como “as cláusulas pétreas” da reforma. “Outras eventuais mudanças poderão ser feitas.”

O limite de dois salários mínimos (o que equivale hoje a R$ 1,9 mil) para acúmulo de aposentadoria e pensão por morte é um dos itens mais contestados pelos grupos descontentes com a reforma. Uma possibilidade discutida atualmente, segundo o relator, é permitir que o aposentado possa receber os dois benefícios, a princípio, de forma integral, mas com um fator redutor. O valor iria diminuindo com o passar dos anos. Assim, o segurado começaria acumulando os benefícios sem limites, mas, no ano seguinte, passaria a receber apenas 90%; no outro, 80%; e assim sucessivamente, até zerar. “Para que haja acomodação financeira”, explicou Arthur Maia, que prefere ceder em regras transitórias do que nas permanentes.

308

Quantidade de votos necessários para aprovar a PEC da Previdência no plenário da Câmara dos Deputados

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Encontro com 10 governadores por apoio

06/02/2018

 

 

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), responsável por colocar a reforma da Previdência em votação no plenário da Casa, se encontrou ontem com governadores de nove estados e do Distrito Federal para avaliar o apoio à matéria. Na residência oficial da Câmara, eles discutiram também medidas para “unificar estados e o Congresso Nacional em relação às questões previdenciárias”, nas palavras do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), que participou da conversa.

Com os representantes dos estados Maia discutiu a criação de uma agenda mínima de projetos que inclui a criação de um fundo para sustentar a Previdência dos estados e a securitização das dívidas estaduais, que é uma espécie de venda dos débitos por meio de títulos. As medidas, segundo Perillo, farão parte de propostas separadas e dependem da aprovação da reforma da Previdência. “Não dá para aprovar aquilo que atenda só aos governadores se a gente não resolve o problema que atenda ao país”, disse o governador.

“A ideia é pensar em melhorar a situação fiscal dos estados e da União. Não adianta mais ficar organizando soluções apenas de curto prazo para os estados. As alternativas para se garantir o fechamento do caixa dos municípios e estados estão acabando”, disse Maia. Os governadores ficaram de voltar a Brasília em 19 de fevereiro, quando a reforma está prevista para ser pautada na Câmara, caso os 308 votos necessários estejam garantidos. Segundo o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), os secretários de Fazenda se reunirão para discutir o assunto na semana que vem. (AA)

Frase

“A ideia é pensar em melhorar a situação fiscal dos estados e da União. Não adianta mais ficar organizando soluções apenas de curto prazo para os estados. As alternativas para se garantir o fechamento do caixa dos municípios e estados estão acabando”

Rodrigo Maia, presidente da Câmara

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Começa a folia

Luiz Carlos Azedo

06/02/2018

 

 

O Congresso voltou a funcionar ontem com a agenda previsível: nada acontecerá antes do carnaval. O relator Arthur Maia (PPS-BA) advertiu que a reforma da Previdência precisa ser votada pela Câmara em fevereiro, ampliando o coro dos que querem ir para o tudo ou nada e decidir logo essa questão. O ministro da Casa Civil, Carlos Marun, reforça a pressão governista para que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), coloque a matéria em pauta mesmo sem garantia de maioria de votos para aprovação. A reforma precisa do apoio de pelo menos 308 deputados, em duas votações, mas, pelas contas do governo, ainda faltam 40 votos. A primeira votação estava prevista para 19 de fevereiro, mas não há garantia de que ocorra enquanto o governo estiver em minoria.

Ontem, o presidente Michel Temer enviou sua mensagem ao Congresso na qual reafirma a posição do governo: “Nossas atenções estão voltadas para a tarefa urgente de consertar a Previdência. O atual sistema é socialmente injusto e financeiramente insustentável. É socialmente injusto porque transfere recursos de quem menos tem para quem menos precisa, concentrando renda. É financeiramente insustentável porque as contas simplesmente não fecham, pondo em risco as aposentadorias de hoje e de amanhã”. A mensagem presidencial foi entregue pelo ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, e lida pelo primeiro-secretário da Câmara, deputado Giacobo (PR-PR).

Maia é a favor da reforma da Previdência, mas não quer ser derrotado. Enquanto o Palácio do Planalto avalia que a manutenção do calendário de votação ajuda a formar a maioria, obrigando todos os que desejam permanecer na base do governo a descer do muro. Maia pensa exatamente o contrário, tem medo de pôr a reforma em votação e o governo sofrer uma derrota acachapante, o que seria um fator de desagregação ainda maior da base. Os deputados estão voltando dos estados com foco na própria sobrevivência eleitoral.

A Previdência seria uma “agenda positiva” do governo, digamos assim, que empunhou a bandeira do fim dos privilégios dos servidores públicos para tentar melhorar a aceitação popular da reforma. Mas a “agenda negativa” do governo se impõe, com destaque para o caso da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), cuja posse está suspensa por medida liminar da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia. Nomeada em 4 de janeiro, uma ação trabalhista de um ex-funcionário colocou em xeque seus atributos para o cargo. Ela mesma tem se encarregado de aumentar o fogo da frigideira com vídeos e declarações que somente servem para queimar ainda mais o seu filme com a opinião pública.

Em outras circunstâncias, um outro nome já teria sido indicado, mas o governo Temer precisa dramaticamente do apoio do PTB, presidido por Roberto Jefferson. O PTB não indica outro nome em seu lugar, nem o governo desiste de nomeá-la antes de uma decisão final do Supremo. Cristiane divulgou uma nota na qual pede à presidente do Supremo Tribunal Federal que tome uma decisão sobre o assunto “o mais rápido possível”. “Venho sofrendo uma campanha difamatória que busca impedir minha posse no Ministério do Trabalho. Peço, respeitosamente, à ministra Cármen Lúcia que julgue o mais rápido possível essa questão”, argumenta Cristiane Brasil.

Caixa dois

Fora do Congresso, segue seu curso inexorável mais um processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na 13ª Vara Federal de Curitiba, desta vez relativo ao sítio de Atibaia (SP). A publicitária Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana, afirmou, em depoimento ao juiz Sérgio Moro, que mais de a metade do valor cobrado pelo casal para a campanha de reeleição de Lula, em 2006, foi pago por meio de caixa dois. Segundo ela, a campanha custou cerca de R$ 18 milhões, e apenas R$ 8 milhões foram pagos pelo caixa oficial. Mônica Moura disse ainda que a decisão de como fazer os pagamentos foi do PT e que João Santana chegou a conversar com o ex-ministro Antônio Palocci sobre os riscos, já que a imagem do ex-presidente estava abalada pelo mensalão.

“A decisão era absolutamente deles, de receber por caixa dois. Para mim, (pagamento oficial) era menos risco, mais tranquilo, não tinha que carregar mala de dinheiro para lugar nenhum “, disse Mônica, que depôs na ação em que o ex-presidente Lula é acusado por ter recebido vantagens indevidas da Odebrecht com reformas no sítio de Atibaia (SP).