Correio braziliense, n. 19980, 05/02/2018. Política, p. 2

 

Vai renovar menos do que o povo espera

Paulo de Tarso Lyra

05/02/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Levantamento feito pelo Diap mostra que regras eleitorais aprovadas por deputados e senadores, no ano passado, aliadas à necessidade dos políticos de manter o foro privilegiado, diminuem as chances das eleições de novos nomes para a Câmara

A renovação de rostos e nomes na Câmara, nas eleições de outubro, será menor do que a média histórica, para decepção dos brasileiros. O desgosto com os atuais políticos e o provável aumento nos votos nulos, brancos e abstenções seguem altos, como herança da crise política. Mas as regras criadas pelos próprios parlamentares na reforma política, incluindo a nova janela de transferências partidárias em março, e a necessidade de muitos de manterem o foro privilegiado pela multiplicação das investigações de corrupção, diminui as expectativas de mudança.

E mesmo que ocorram, poderão ser apenas simbólicas. Muitos políticos, desgastados, abrirão espaço para filhos e parentes com o objetivo de manter o clã no poder. Existe ainda o caso dos parlamentares que perderam o fôlego eleitoral e que, sem condições de disputar eleições majoritárias para senador, buscarão manter-se em Brasília graças às eleições proporcionais para deputados.

Levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) mostra que, nas últimas cinco eleições para a Câmara, a média de renovação tem se mantido estável, na casa dos 45%. Nas últimas sete disputas, a maior renovação aconteceu em 1989, quando 61,82% dos deputados que assumiram em 1990 não estavam lá um ano antes. Aquela eleição tinha características peculiares. Foi a primeira após a permissão para que eleitores acima de 16 anos votassem. Além disso, foi casada com o primeiro pleito presidencial após a redemocratização, o que aumentou a atenção dos brasileiros para a política.

Para o diretor de documentação do Diap, Antonio Augusto de Queiroz, o índice de renovação das cadeiras da Câmara sempre está ligado ao cenário político. “Quando o ambiente é de crise, com escândalos, a renovação tende a aumentar. Quando é de relativa estabilidade, o desejo de mudança diminui. O índice de renovação também está associado ao número de candidatos à reeleição. Quanto mais parlamentares disputam a reeleição, menor o índice de renovação, pelas notórias vantagens que têm aqueles que concorrem à reeleição”, disse.

Na visão do especialista, a crise deste ano não conseguirá mudar os rostos conhecidos. As alterações nas regras para o troca-troca partidário também impactam nesse cenário. A legislação anterior afirmava que, para se candidatar, o interessado precisava filiar-se um ano antes à legenda pela qual disputaria o pleito. Deputados e senadores criaram uma janela, seis meses antes das eleições, entre março e abril. “Essa nova janela dá ao detentor de mandato e candidato à reeleição enorme vantagem para negociar tratamento privilegiado em seu partido, exigindo a garantia de espaço diferenciado no horário de rádio e TV, além de mais recursos do fundo eleitoral, sob pena de mudar para outro partido que lhe ofereça tais vantagens”, reforçou Queiroz.

Para o deputado Danilo Forte (DEM-CE), que já trocou de legenda duas vezes nos anos recentes, a política brasileira ainda manterá o seu perfil oligárquico. “Minha grande preocupação é que tudo isso aumente ainda mais o desencanto das pessoas com a política”, disse ele. “Muitas dessas famílias se perpetuam no poder desde o Império”, completou, citando o caso do relator da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer na Câmara, Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), parente direto do patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada e Silva.

O líder do governo na Câmara, Agnaldo Ribeiro (PP-PB), acha que o ímpeto de renovação não significa um futuro melhor do que o presente. “O novo nem sempre será melhor do que aquele parlamentar que o eleitor já conhece. É fundamental que as pessoas votem com uma visão analítica e não apenas pela emoção”, afirmou ele.

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Movimentação paralela

05/02/2018

 

 

Uma série de movimentos paralelos ao universo político tem atraído pessoas dispostas a imprimir um novo ritmo ao cenário brasileiro. Renova BR, Agora, Raps e Livres mantêm o diálogo com as legendas tradicionais, mas tentam implementar uma visão diferenciada na forma de lidar com a coisa pública. “Nossa esperança é que pesquisas recentes, realizadas por empresas sérias, como a Ideia Big Data, mostram que quase 70% dos brasileiros querem algo diferente do que aí está”, disse ao Correio um dos fundadores do Agora, Leandro Machado.

Ele reconhece as dificuldades e admite que a simples renovação não significa uma melhoria no cenário atual. “Qual é a qualidade da renovação que teremos? As ideias de quem virá serão melhores do que as propostas de quem já tem mandato?”, indagou. Machado acrescenta que a falta de uma definição clara sobre os limites da pré-campanha também ajuda nesse debate contra o novo. “Como não há regras, muitos dos interessados nas eleições e que já ocupam cargos públicos estão mostrando o que fazem, o que desequilibra as coisas”, completou.

Redes sociais

Sem o aparato da visibilidade pública, os debates do Agora são feitos em reuniões periódicas e nas redes sociais. O Renova BR já formou a primeira turma de interessados em obter uma bolsa para financiar as candidaturas. Políticos tradicionais e alguns militantes criticam grupos como esses, dizendo que são compostos por defensores do golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff. “Esse é um debate bobo”, resumiu Machado, acrescentando que, além do Agora e do Renova, outros grupos, como a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), Brasil 21, Movimento Acredito e Bancada Ativista, reúnem simpatizantes de todas as correntes ideológicas.

Os partidos que mais se aproximam desses grupos são o PPS e a Rede. O PPS, inclusive, tem conversado com o apresentador Luciano Huck, que virou símbolo do desejo de renovação. Para a economista Elena Landau, do Livres, não há como dizer se o grupo apoiará Huck ou o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). “Eu pessoalmente o vejo como candidato. Se ele vier, viria pelo PPS, partido do qual o Livres está muito próximo. Mas ele corre na mesma raia do Alckmin”, frisou Elena. (PTL).