Correio braziliense, n. 19980, 05/02/2018. Política, p. 3
Ano curto e sem polêmicas
Deborah Fortuna
05/02/2018
LEGISLATIVO » Apesar da mesma composição do Congresso, deputados e senadores devem evitar temas espinhosos na reta final. A obrigação de encarar os eleitores diminui a disposição para debater aborto, casamento homoafetivo, maioridade penal e foro privilegiado
Com o retorno das atividades legislativas, previsto para esta semana, o Congresso Nacional deve esquecer temas polêmicos que começaram a ganhar forma no ano passado. Muito além da reforma da previdência, outros assuntos, como aborto, foro privilegiado e maioridade penal, chegaram a entrar em pauta em 2017, aqueceram os interesses políticos, mas devem perder força este ano. Para especialistas, o ano atípico pressiona deputados a abandonarem projetos conflituosos para apostarem em uma zona de conforto e garantirem a reeleição. E, para sobreviver, é necessário, antes de tudo, agradar o eleitor.
“A prioridade número um é a sobrevivência política”, comentou o professor de ciência política da PUC, no Rio de Janeiro, Ricardo Esmael. Para o especialista, os temas considerados impopulares, ou seja, aqueles que dividem os eleitores, são comuns no primeiro ano de governo depois da reeleição, e não no ano em que o mandato pode estar por um fio. “Os deputados têm um raciocínio muito questionável. Aquilo que é votado no primeiro ano, quando chegar ao fim do mandato, as pessoas não vão lembrar. Então, acho que, se tiverem que votar algo, vão votar em 2019, e não em 2018”, afirmou.
Entre os assuntos que chegaram a entrar em pauta no Congresso e que deveriam voltar à tona este ano, estão o casamento homoafetivo, que define como família ‘a união estável entre duas pessoas’, a nova questão do aborto, que proíbe o ato até em casos já permitidos por lei — como estupro, anencefalia, ou risco de vida para a mãe — , e o foro privilegiado, que aguarda a indicação de partidos para criar a comissão especial. Nenhuma dessas têm previsão para voltarem à pauta nem na Câmara, tampouco no Senado Federal. “Você tem uma dificuldade concreta. É claro que isso vai aumentar a partir de agosto, quando você vai ter o calendário da campanha eleitoral, mas a verdade é que a campanha já começou”, avaliou Esmael.
Reeleição
O cenário fica ainda mais complicado após o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) decidir se candidatar ao Palácio do Planalto. Isso porque, segundo o especialista, os deputados que quiserem a reeleição ou apostar em outros cargos, devem ficar menos em Brasília, e mais no estado de origem. “Se eles retornam às bases todo fim de semana, isso vai acontecer muito mais agora. Porque há a necessidade de estar no corpo a corpo com o eleitor. Isso é imprescindível. Não há como convencer os deputados a ficarem muito tempo em Brasília com discussões polêmicas, que ainda vão se arrastar por muito tempo”, explicou. “O brasileiro está com a sensação de renovação muito grande, então é preciso estar atento às bases para garantir a reeleição”, disse.
Mas ainda há a possibilidade de as pautas polêmicas servirem como moeda de troca. Ou seja, como o governo federal aposta em votar a reforma da previdência ainda este mês, é possível que alguns temas sejam colocados em pauta para agradar parlamentares. É isso que explica o cientista político David Fleisher. “Tem muitas dessas articulações de troca. Já teve com a bancada ruralista, depois em uma negociação com a Infraero. Há muito toma-lá-dá-cá”, afirmou. Assim, se uma bancada quiser, ela pode pressionar o assunto a voltar à pauta em troca de um voto favorável à reforma.
Fleisher lembra que a sessão legislativa em comparação a outros anos. “Vai ter muito pouco tempo para deliberar e votar em matérias”, explicou.
Pautas que podem ser votadas em 2018
Com o retorno das atividades legislativas, veja alguns exemplos do que pode estar em pauta este ano na Câmara dos Deputados
1.Reforma da Previdência (PEC 287/16)
O que diz: Todos os esforços do legislativo estão concentrados em aprovar a reforma da previdência.
A proposta traz mudanças para as regras da previdência e aposentadoria no Brasil.
Tramitação: No ano passado, o texto foi aprovado pela Comissão Especial na Câmara dos Deputados, e agora, segue para o plenário da Casa. É necessária a aprovação de 308 deputados, em dois turnos de votação.
Previsão: 19 de fevereiro
2. Foro privilegiado (PEC 333/17)
O que diz: O texto restringe, em casos de crimes comuns, o foro apenas aos presidentes dos Três Poderes. Outras autoridades seriam julgados em primeira instância. O mesmo assunto também está sendo votado no Supremo Tribunal Federal (STF), mas o ministro Dias Toffoli pediu vista para analisar o texto.
Tramitação: Em dezembro do ano passado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, criou uma comissão especial para analisar a proposta. Agora, os líderes devem indicar membros para a instalação da comissão.
Previsão: Ainda não há previsão
3. Revogação do Estatuto do Desarmamento (PDL 175/2017)
O que diz: A proposta é revogar o Estatuto do Desarmamento, em vigor desde 2003, e assegurar o porte de armas de fogo a qualquer cidadão.
Tramitação: Em novembro do ano passado, o relatório do senador Sérgio Petecão (PSD-AC), que pede um plebiscito sobre o Estatuto do Desarmamento, foi lido na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Após a leitura, foi dada vista coletiva para avaliação. Segue em análise.
Previsão: Ainda não há previsão
4. Aborto (PEC 181/2015)
O que diz: O texto pede a proibição do aborto em todos os casos, inclusive os já previstos por lei, como é o caso de estupro, anencefalia do feto, ou em que a mãe corre risco de vida.
Tramitação: A proposta foi aprovada em uma comissão especial na Câmara dos Deputados, em novembro do ano passado, por 18 votos a 1. Ainda é necessário ser aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado. Falta ainda analisar os destaques.
Previsão: Não há previsão
5. Jogos de Azar
O que diz: Propõe a legalização dos jogos de azar no Brasil. Há dois projetos, um na Câmara dos Deputados (PL 442/91), e outro no Senado (PLS 186/14).
Tramitação: Ainda está em análise na CCJ
Previsão: Não há previsão