Correio braziliense, n. 19982, 07/02/2018. Política, p. 4

 

Agora, só resta a Lula recorrer

Bernardo Bittar e Renato Souza 

07/02/2018

 

 

JUSTIÇA » TRF da 4ª Região publica o acórdão com o resultado do julgamento que condenou o petista a 12 anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ministro Alexandre de Moraes, do STF, defende cadeia após decisão de segunda instância

A decisão dos desembargadores que condenaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e um mês de prisão no caso do tríplex do Guarujá (SP) foi publicada ontem pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Após intimada, a defesa do petista terá dois dias para se manifestar sobre o caso. A discussão sobre execução de pena após condenação em segunda instância permanece parada no Supremo Tribunal Federal (STF), mas ontem, durante julgamento, o ministro Alexandre de Morais sinalizou ser a favor do atual entendimento.

Lula foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, como mostra detalhadamente o documento de sete páginas divulgado pelo TRF-4. O acórdão fala sobre a denúncia, os argumentos da defesa e o entendimento dos desembargadores que julgaram o caso. Depois, vem a sentença. Como o processo é eletrônico, os advogados de Lula são considerados citados logo após a abertura dele — requisito necessário, inclusive, para elaborar um eventual recurso.

A defesa tem dois dias para recorrer. Caso a abertura do acórdão não seja efetivada pelos advogados no site da Justiça Federal em 10 dias, o prazo passa a valer automaticamente. O único recurso disponível é o embargo de declaração, em que os defensores podem tentar esclarecer alguma dúvida ou pedir explicações aos desembargadores sobre a decisão. Mas esse mecanismo, entretanto, não permite que a sentença seja revogada. Esgotadas as possibilidades, Lula pode ser preso.

Segundo o professor Antônio Pedro Belchior, que dá aulas de direito processual na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), outros recursos podem ser apresentados nos tribunais superiores. “Com a publicação e notificação dos advogados de defesa, corre o prazo para apresentar o recurso. Um habeas corpus foi negado liminarmente no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e o pedido apresentado no Supremo está sendo analisado”, recorda.

“Em regra, quando existem excepcionalidades, como no processo do Lula, é possível que o STF analise o pedido de fato. No mais, cabem recursos que pedem a mudança ou a extinção da pena nos dois tribunais (STF e STJ)”, complementa Belchior. Para tentar fortalecer a defesa de Lula, o ex-presidente do STF Sepúlveda Pertence, considerado um dos maiores especialistas em processo penal do Brasil, foi contratado para trabalhar no caso.

Em nota, o PT afirmou que o julgamento de Lula foi confirmado em tempo recorde e que teve pena bem acima das que costumam aplicar os desembargadores. O partido informou ainda que se trata de “um caso raro de decisão unânime”. O advogado Cristiano Zanin, que defende o petista, afirmou que “nenhum dos votos dos três magistrados indicou o recebimento de vantagem indevida por parte de Lula, muito menos qualquer relação com benefícios oferecidos à OAS”. Segundo Zanin, “mais uma vez, o ex-presidente foi condenado sem que tivesse cometido crime algum”.

Entendimento

A condenação de Lula, aliás, reabriu discussões no Judiciário sobre a possibilidade de execução da pena de condenados em segunda instância. Mesmo sem o assunto estar pautado no plenário do Supremo, o ministro Alexandre de Moraes declarou-se favorável ao mecanismo durante um julgamento que envolvia o tema ontem. “As convenções exigem que, para se afastar o princípio da presunção de inocência e permitir a prisão, é preciso que haja pelo menos dois julgamentos de mérito, na primeira e na segunda instância”, afirmou Moraes.

Para o líder do PSol na Câmara, deputado Ivan Valente (SP), “a decisão era esperada, o que não pode acontecer é o STF mudar seu entendimento”. “O assunto oscila muito, em 2016, a Corte passou a entender que a prisão após condenação em segunda instância era válida. Antes, não valia. Quando o juiz manda prender, você precisa obedecer. Temos deputados com mandato que foram presos. O ex-presidente, se for o caso, deve ir também. É natural, mas muito difícil prever”, analisa.

Moraes demonstrou o entendimento ao analisar o caso do deputado federal João Rodrigues (PSD-SC), condenado a 5 anos e 3 meses de prisão por dispensa e fraude de licitação. A sentença acabou confirmada pela segunda instância. O parlamentar estava solto e o processo corria o risco de caducar. Ontem, a Primeira Turma do STF mandou prendê-lo. Desde que chegou ao Supremo, em 2017, após a morte de Teori Zavascki, Alexandre de Moraes acompanhava o entendimento da Corte.

O ministro é um dos que se mostrou favoráveis à rediscussão do tema no STF após a sinalização de que ministros como Gilmar Mendes e Rosa Weber possam rever posições. O entendimento do Supremo foi fixado em outubro de 2016, ano em que o tema foi debatido três vezes. A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, no entanto, afirmou que não pretende colocar o assunto em pauta.