Correio braziliense, n. 19977, 02/02/2018. Economia, p. 7
Folha de servidores é paga com reajuste
Vera Batista
02/02/2018
O governo não conseguiu derrubar a liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a Medida Provisória 805/2017, e a folha de janeiro foi depositada com o reajuste para os funcionários. A MP prevê o adiamento do reajuste salarial de algumas categorias do serviço público para 2019 e a elevação da contribuição previdenciária dos servidores do três poderes para 14%. O impacto aos cofres públicos, segundo técnicos, foi de R$ 338,4 milhões no mês. Durante a divulgação da MP, o Ministério do Planejamento calculava uma economia de R$ 5,1 bilhões com a postergação do aumento. A medida caduca no início de março caso não seja votada no Congresso Nacional.
Caso o governo consiga derrubar a decisão no STF neste início dos trabalhos da Corte, de acordo com especialistas, o salário volta ao valor pago em dezembro, sem que isso se caracterize como redução salarial. A expectativa de alguns analistas, no entanto, é de que o governo vai perder a economia prevista, quer por decisão do Judiciário, quer por não conseguir votar a MP no Congresso. Uma fonte ligada ao Planalto disse que o presidente Temer, mesmo que a equipe econômica não admita, “já desistiu da postergação de reajuste e da elevação da alíquota previdenciária”.
A frustração de receita vai ser enorme, de acordo com o especialista em contas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas. “O governo não vai conseguir aprovar nem as receitas de R$ 5,1 bilhões do adiamento, os R$ 1,9 bilhão da elevação da alíquota previdenciária, com a popularidade em 7%”, afirmou. Para Castello Branco, “é torcer por aumento de arrecadação”, já que também não devem passar pelo Congresso o fim das renúncias fiscais, de R$ 18,6 bilhões, o da desoneração da folha, de R$ 4 bilhões, ou a tributação dos fundos de investimento, de R$ 6 bilhões. Na opinião dele, neste ano, o governo vai, no máximo, aprovar uma desidratada reforma da Previdência. “O resto é apenas um esforço de satisfação ao mercado.”
Na opinião de especialistas na área legal, a liminar de Lewandowski caracteriza uma interferência do Judiciário nos outros poderes. “Suspender reajuste não ofende a Constituição, que define que, por falta de orçamento, pode ocorrer até exoneração de servidores estáveis. A questão do reajuste de servidores não está decidida totalmente. Pode ser que o Executivo ganhe a ação lá na frente”, destacou Max Kolbe, especialista em direito constitucional.
Ele alerta que os funcionários que receberam aumento devem estar preparados para um contracheque mais magro no mês que vem. “A Constituição não condena a retirada do valor e o Executivo tem o direito de dispor da melhor forma do Orçamento”, afirma.
Protesto da elite
Juízes e procuradores fizeram ontem um protesto contra a reforma da Previdência e pela valorização das carreiras. Em campanha salarial, cerca de 300 representantes da magistratura e do Ministério Público entregaram à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, uma carta aberta, com 18 mil assinaturas e várias reclamações.
O auxílio-moradia (R$ 4.377 mensais) não foi mencionado na carta. Questionados sobre o assunto, foram unânimes em dizer que o benefício está dentro da lei e só aceitam discutir a pauta se for para incluir todos os servidores que ganham a benesse. Na carta, juízes e promotores se dizem incomodados com distorções salariais. Antes, eram o topo do serviço público. Hoje, estão abaixo de defensores (salários de R$ 30,5 mil mensais), delegados da Polícia Federal (R$ 30,9 mil), auditores do TCU (R$ 31,4 mi) e consultores do Senado (R$ 35,1 mil). Todas as categorias citadas ficaram indignadas com a comparação e já se preparam para contestá-la.
Para José Robalinho Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), os servidores “estão sendo demonizados, como se fossem os responsáveis pelo deficit nas contas públicas”. Para Norma Cavalcanti, presidente da Associação dos Membros do Ministério Público (Conamp), juízes e procuradores não são “privilegiados”. “Somos os únicos servidores que não tiveram reajuste no ano passado”, reforçou.
A guerra do contracheque
Funcionalismo vence a primeira batalha
O que aconteceu
» A MP 805/2017, editada em em 30 de outubro, adiou para 2019 os reajustes salariais previstos para várias categorias do Poder Executivo neste ano e elevou a contribuição previdenciária dos servidores dos três poderes
Objetivo
» Economizar R$ 7 bilhões, em 2018 — R$ 5,1 bilhões com a suspensão dos aumentos e R$ 1,9 bilhão com a elevação da alíquota previdenciária
Judiciário
» Em 18 de dezembro, liminar do ministro Ricardo Lewandowksi, do STF, suspendeu os efeitos da MP
Pagamento
» O dinheiro já entrou nos contracheques dos servidores. O desembolso mensal é de R$ 339 milhões para 1,1 milhão de aposentados e pensionistas
Cobrança
» Não é possível pedir devolução do pagamento. Caso o plenário do STF derrube a liminar de Lewandowski, o Executivo poderá apenas suspender o reajuste até 2019
Gasto excedente
» Mantido o reajuste, o governo terá que incluir a despesa com pagamento de servidores no Orçamento de 2018. Gasto previsto no ano é de R$ 5,6 bilhões. Para cobrir o desembolso inesperado, terá de cortar outras despesas
Alerta
» A MP 805/17 caduca no início de março, a menos que seja aprovada até lá pelo Congresso. Pela Constituição, proposta com o mesmo conteúdo não pode ser reapresentada neste ano
Carreiras afetadas pela MP 805
» Polícia Federal
» Polícia Rodoviária Federal
» Policiais militares e civis dos ex-territórios
» Carreiras jurídicas do Executivo
» Ciclo de gestão (Banco Central, CVM, Susep, Ipea e IBGE)
» Auditores e analistas da Receita Federal
» Auditores-fiscais do Trabalho
» Médicos peritos do INSS
» Carreira de diplomacia
» Analistas e Especialistas em Infraestrutura
» Analistas Técnicos de Políticas Sociais
» Peritos Federais Agrários
» Dnit
» Carreira de Finanças e Controle
» Suframa