Correio braziliense, n. 20019, 13/03/2018. Cidades, p. 17

 

Um aeroporto que não decolou

Flávia Maia 

13/03/2018

 

 

INFRAESTRUTURA » Três anos depois, projetos ousados para o terminal aeroviário de Brasília não saíram do papel. Além da modernização do espaço para cargas, estava prevista a construção de shopping, hotéis, parque aquático, escritórios e edifício-garagem

O ano de 2018 ficaria marcado pelo início da megaoperação no Aeroporto Internacional de Brasília Juscelino Kubitschek, transformando o terminal no mais completo empreendimento do país. Os planos previam investimentos de R$ 3,5 bilhões para criar uma cidade aeroportuária, com shopping center, espaço para armazenamento de cargas, hotéis e até um parque aquático. Contudo, os projetos não foram adiante. Se, em 2015, a Inframerica, consórcio responsável pela administração do aeroporto, se mostrava otimista, três anos depois, o discurso sobre projetos tomou o tom cauteloso, com adiamentos e readequações. Nem as licenças necessárias para o complexo foram pedidas. Com a possibilidade de venda da parte da Infraero, os planos podem ser atrasados por mais tempo.

O primeiro a declinar do projeto de expansão foi o Hard Rock Café. No fim do ano passado, a rede internacional anunciou a construção de três unidades no Brasil, mas deixou de fora a de Brasília. Em fevereiro de 2016, a empresa tinha manifestado, em nota, o interesse pela capital federal. Porém, a praia de Lagoinhas, a 80km de Fortaleza; a Ilha do Sol, no Paraná; e Caldas Novas (GO) receberão os investimentos da rede no Brasil.

A Inframerica justificou o pé no freio com a crise econômica, que atrapalhou o interesse de investidores e a oferta de crédito. “A grave recessão econômica no fim de 2015 afastou investimentos no país. Essa recessão perdurou por 2016 e 2017”, informou. De acordo com a empresa, as incertezas da crise e o rebaixamento do rating (nota atribuída pelo mercado internacional) também levaram à redução de dinheiro disponível no mercado para aplicações.

O consórcio não desistiu dos planos de expansão, mas alegou que fará readequações na proposta. Porém, não especificou quais serão as alterações nem se haverá enxugamento da ideia divulgada em 2015. Limitou-se a dizer que “tem uma equipe nova estudando adequações no projeto e contextualizando-o à realidade de mercado”. A Inframerica acrescentou que conta com a retomada no fluxo de passageiros para retornar à ideia de expansão. A queda na quantidade de viajantes foi de 11,2%, entre março de 2016 e agosto de 2017. Entretanto, segundo a empresa, os índices voltaram a crescer desde setembro. Para incrementar a circulação de pessoas, o consórcio aposta em captar novos voos internacionais. Por isso, há um projeto de uma nova ala para esse público em andamento.

Outra questão que pode retardar os planos de expansão do aeroporto é o interesse do governo federal em vender a participação da Infraero, atualmente em 49%. A Inframerica seria uma das interessadas, embora, oficialmente, explique que só se pronunciará após a confirmação do processo de venda. O Ministério dos Transportes informou que a expectativa é realizar a comercialização dos ativos até o fim deste ano, após a conclusão de estudos. A negociação das participações acionárias da estatal foi aprovada em agosto de 2017. Os recursos obtidos com a venda serão injetados na própria Infraero.

 

Dez Maracanãs

Em dezembro de 2015, o então presidente da Inframerica, José Luis Menghini, convocou a imprensa para fazer um balanço dos três anos da concessão privada. Aproveitou a presença dos jornalistas e fez o anúncio da megaestrutura a ser construída. Com as obras finalizadas, o JK passaria a ter capacidade para receber até 1,5 milhão de passageiros internacionais por ano, 130% a mais do que o comportado à época. A intervenção acrescentaria 1.323.808 metros quadrados de área construída, quase 10 vezes a área do complexo do Estádio Maracanã, no Rio de Janeiro.

O plano de expansão da concessionária incluía a construção de cinco hotéis no entorno do terminal, além de parque aquático, aquário, cinema, outlet, centro de convenções, hospital e universidade. O projeto previa, ainda, prédios de escritórios com capacidade para 30 mil funcionários. Também haveria um shopping com 280 lojas, 30 opções de fast food e oito restaurantes de alto padrão, além de edifício-garagem com 4 mil vagas (leia quadro).

 

Empréstimo

É importante ressaltar que o plano de expansão do sítio aeroportuário é diferente das obras de ampliação feitas pela administração do aeroporto. Assim que a concessionária Inframerica assumiu a gestão do terminal de Brasília, em dezembro de 2012, ela iniciou as obras de modernização para se adequar aos termos do contrato de concessão firmado com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Em maio de 2014, foi entregue a estrutura prevista. As salas de embarque passaram de 60 mil m² para 120 mil m², houve aumento de 11 para 34 portões de embarque e a demanda cresceu 10%.

Os R$ 488 milhões usados para a reforma vieram por meio do chamado empréstimo-ponte com o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), obtido em janeiro de 2013. Trata-se de um contrato no primeiro momento da concessão até que o empréstimo de longo prazo, cuja análise é mais demorada, seja aprovado. O valor foi integralmente pago pelo BNDES e quitado pelo empréstimo de longo prazo assinado com a Inframerica em fevereiro de 2014.

 

Em atraso

Confira o que era previsto na expansão e o que ainda não foi feito:

 

Terminal JK

O empreendimento comercial de 303 mil metros quadrados comportaria um shopping com 280 lojas, 30 opções de fast food e oito restaurantes de alto padrão, além de um edifício-garagem para 4 mil vagas, dois hotéis, dois prédios de escritórios, cinema, academia e áreas de descanso. O acesso dos passageiros ao Terminal 1, saguão de embarque, se daria por meio do Terminal JK. As obras começariam em 2016 e deveriam ser concluídas até 2018.

 

Novos hotéis

À época do anúncio, a concessionária divulgou que tinha firmado um contrato para abertura de cinco hotéis, nos padrões 3, 4 e 5 estrelas, em obras também previstas para 2016, incluindo um Hard Rock Hotel, que seria o primeiro a ser construído no Brasil. A expectativa era a de que, neste ano, 1,6 mil novos quartos estivessem à disposição dos turistas.

 

Centro de comércio

O Sun Park City Center seria um centro de comércio, serviços e lazer inspirados em grandes empreendimentos, como Downtown Disney e Puerto Venecia, na Espanha. O projeto previa 418 mil m² de área construída próxima ao aeroporto. O complexo teria parque aquático, aquário, kids place, cinema, área verde, lago, outlet, arena multiuso, centro de convenções, hospital e universidade.

 

Escritórios

Seriam construídos prédios de escritórios com estacionamentos privativos e rotativos, em uma área de 487 mil m². O espaço deveria comportar mais de 30 mil funcionários de empresas privadas ou públicas. De acordo com a Inframerica à época, a construção seguiria o padrão Built to Suit (BTS), sob medida para atender aos interessados. Dessa forma, os imóveis retornariam para a União ao fim do contrato de concessão.

 

Armazenamento de cargas

Para complementar os serviços de cargas disponíveis no aeroporto de Brasília, a Inframerica construiria o Storage, ou Self-Storage. O espaço de 85 mil m² seria destinado ao armazenamento de cargas com tecnologia para comportar diferentes tipos de mercadorias.