Correio braziliense, n. 20009, 03/03/2018. Política, p. 4
Temer incluído em investigação
Renato Souza
03/03/2018
Relator da Lava-Jato no Supremo acata pedido do MPF e coloca o presidente da República no inquérito que apura propina da Odebrecht
O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), incluiu, na tarde de ontem, o presidente Michel Temer no inquérito da Lava-Jato que investiga os ministros Eliseu Padilha, da Casa Civil, e Moreira Franco, da Secretaria-Geral. A investigação ocorre no âmbito da Operação Lava-Jato e apura o suposto repasse de propina por parte da Odebrecht para a Secretaria Nacional de Aviação Civil, que foi comandada entre 2013 e 2015 por Padilha e Moreira Franco.
A inclusão de Temer na ação ocorre após um pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. A manifestação de Dodge se baseia em informações do delator Cláudio Melo Filho, ex-diretor da Odebrecht. Na mesma decisão que incluiu o presidente na ação, Fachin autorizou a prorrogação das investigações por mais 60 dias. É possível que um novo prazo seja concedido, caso deseje a Polícia Federal.
Em depoimento, válido no acordo de delação premiada, Cláudio contou que o presidente Temer participou de um jantar, em maio de 2014, onde teria sido negociada propina para integrantes do MDB. À época, Temer era vice-presidente da República e o encontro, de acordo com o Ministério Público, teria ocorrido no Palácio do Jaburu, em Brasília. As informações foram obtidas pelo Ministério Público no ano passado. O então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entendeu que o chefe do Executivo não pode ser investigado por fatos anteriores ao mandato.
Raquel Dodge tem um entendimento diferente do antecessor. Ela destaca que “todos são iguais perante a lei” e não existe imunidade penal para o presidente que tenha capacidade de paralisar as investigações. “Os referidos colaboradores apontaram, em declarações e provas documentais, que integrantes do grupo político liderado pelo presidente da República Michel Temer e pelos ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco teriam, em 2014, recebido recursos ilícitos da Odebrecht em contrapartida ao atendimento de interesse desse grupo pela Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, órgão titularizado pelos dois últimos investigados sucessivamente entre os anos de 2013 e 2015”, escreveu Dodge, ao pedir a inclusão de Temer na ação.
Provas
Fachin acolheu o pedido, alegando que a Constituição Federal impede a denúncia contra o presidente, mas não determina que a investigação seja paralisada. “A imunidade temporária vertida no texto constitucional se alça a obstar a responsabilização do Presidente da República por atos estranhos ao exercício das funções; mesmo nessa hipótese (a de atos estranhos ao exercício das funções), caberia proceder a investigação a fim de, por exemplo, evitar dissipação de provas, valendo aquela proteção constitucional apenas contra a responsabilização, e não em face da investigação criminal em si”, escreveu Fachin.
O advogado Rafael Faria, especialista em processo penal, discorda tanto do Ministério Público quanto do ministro. “Não se pode investigar um presidente da República por fatos anteriores ao mandato. É uma verdadeira afronta à prerrogativa do cargo e à função que exerce. A Raquel Dodge tem autonomia funcional para discordar dos demais procuradores, mas é importante preservar a autonomia institucional. Com base nesse inquérito, Michel Temer pode ser intimado para prestar depoimento. Ele passa a ser investigado. Cabe agora à defesa apresentar recurso na própria corte”, afirma. O Planalto informou que não vai comentar o assunto.
Cabral passa de 100 anos de pena
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral sofreu mais uma condenação na Lava-Jato. O juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, o condenou a 13 anos e quatro meses de prisão por lavagem de dinheiro. É a 5ª vez que ele é sentenciado na Justiça Federal. Nas quatro ações anteriores, Cabral recebeu penas que somaram 87 anos de cadeia. Com o novo revés na Justiça, ele atinge a marca de 100 anos de reclusão. A nova condenação se refere às investigações da Operação Calicute, deflagrada em 2016.