Correio braziliense, n. 20015, 09/03/2018. Política, p. 2

 

Ciro busca aliados e promete fechar a boca

Leonardo Cavalcanti e Paulo de Tarso Lyra 

09/03/2018

 

 

ELEIÇÕES » Depois da desastrada declaração machista na campanha de 2002, o ex-governador do Ceará se lança na disputa pelo Palácio do Planalto e diz que vai se conter. Até julho, quando será confirmada a candidatura, meta é atrair o PSB e até mesmo o PCdoB

A versão Ciro Gomes 2018, apresentada ontem no lançamento da pré-candidatura do pedetista ao Palácio do Planalto, vem no modelo paz, amor e promessa de fechar a boca para evitar novos problemas verbais. Com um discurso afinado para atrair o eleitorado de esquerda, sobretudo petistas que temem o risco da orfandade de Luiz Inácio Lula da Silva, Ciro pregou a união do campo progressista, um debate mais qualificado sobre o país e desfilou estatísticas para “tocar o coração dos pobres e daqueles que se preocupam com os mais carentes”.

A promessa de autocontrole veio quando indagado sobre uma das maiores pedras de sua trajetória política: a frase, dita durante a corrida eleitoral de 2002, de que o papel da sua então mulher na campanha presidencial, a atriz Patrícia Pillar, seria “dormir com ele”. “Eu não sou machista, mas admito que reproduzi uma cultura machista.” Segundo ele, esta foi a maneira de os críticos o atacarem. “Não podem, depois de mais de 30 anos de vida pública, me acusar de ladrão. Também não podem me chamar de incompetente, diante da obra deixada no Ceará”, completou.

O pré-candidato do PDT — a homologação será em 20 de julho, primeiro dia das convenções partidárias — espera contar com o auxílio dos progressistas, embora reconheça que dificilmente terá o apoio do PT em primeiro turno. Ciro repetiu que tem profunda admiração e amizade por Lula. “Nos últimos 16 anos, todas as vezes em que ele precisou de apoio, eu jamais faltei.” O ex-governador cearense enxerga cinco candidaturas mais competitivas: ele, Lula, Geraldo Alckmin, Jair Bolsonaro e Marina Silva. E acha que, no fim, disputará o segundo turno contra o tucano.

Sem o apoio do PT, pelo menos no primeiro turno, o maior desafio de Ciro Gomes é tentar buscar aliados no PSB, que, na lógica dos políticos ligados ao ex-governador do Ceará, poderia atrair o PCdoB antes mesmo dos registros das candidaturas, em 20 de agosto. Para a equação ser resolvida, a candidata comunista Manuela D’Ávila precisaria sair da disputa ao Planalto em apoio a Ciro.

A partir daí, além de palanque no Rio Grande do Sul, terra de Manuela, Ciro poderia avançar sobre os estados de Pernambuco, com o apoio do grupo de Renata Campos — ex-mulher de Eduardo Campos —; Minas Gerais, do ex-prefeito Marcio Lacerda; São Paulo, do vice-governador Marcio França; Maranhão, do governador Flávio Dino; e o Distrito Federal, de Rodrigo Rollemberg.

 

Dificuldades

O palanque do Distrito Federal é o mais confuso. O PDT lançou ontem a pré-candidatura do deputado Joe Valle ao GDF. “O governador anterior deixou a cidade em condições trágicas, o anterior a ele foi preso. Pelas suas características, Joe terá condições, inclusive, de pacificar o debate. Se, lá na frente, ele precisar ou desejar conversar — algo que é inerente na política —, estará livre para agir”, disse Ciro. Apesar de o discurso deixar aberta a porta para a coligação com o PSB, os pedetistas do Distrito Federal avaliam que, em caso de desistência, Valle entraria na chapa de Jofran Frejat (PR) para disputar o Senado.

Em Pernambuco, parte do PSB prefere apoiar a candidatura de um petista, mas não fecham a porta para Ciro, já que o PDT faz parte da aliança em torno da reeleição do governador Paulo Câmara. Um almoço ocorrido há pouco mais de um mês entre Câmara e Ciro serviu para abrir as primeiras negociações.

O pedetista poderia avançar, inclusive, no eleitorado conservador que apoia Jair Bolsonaro. “O eleitor do Bolsonaro que vota nele pelo discurso mais enérgico, mas que não necessariamente compartilha das ideias, pode migrar o voto para um candidato com um discurso mais enfático, como o de Ciro”, afirma Antonio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).