O Estado de São Paulo, n. 45342, 08/12/2017. Política, p.A6

 

 

 

 

 

 

 

Festa? Que festa?

 

 Eliane Cantanhêde

O PSDB faz sua convenção nacional amanhã, em Brasília, num ambiente de muita insatisfação contra o partido no Planalto, no Congresso, nos partidos aliados e, pior, numa ala responsável por grande parte da imagem tucana ao longo dos anos: os economistas. O resultado é que as críticas se multiplicam na mídia.

Na véspera, o ex-presidente do BC Armínio Fraga foi na linha da economista Elena Landau e declarou que o PSDB “envelheceu”. Para piorar, o STF determinou a quebra de sigilo bancário e fiscal de Aécio Neves, presidente licenciado do partido, ex-governador de Minas e ex-candidato à Presidência. Festa? Que festa?

É assim que o governador Geraldo Alckmin assume a presidência do PSDB e tem seu primeiro grande ato de campanha para o Planalto. Convenhamos, não é uma largada fácil. E, se ele conseguiu um difícil consenso interno, vai conviver com os aliados potenciais em pé de guerra e ameaçando, até mesmo, lançar um “tertius” para 2018.

 

Numa primeira leitura, o “tertius” seria o próprio Alckmin, que se coloca ao centro, entre Lula, à esquerda, e Jair Bolsonaro, à direita. Mas os aliados cada vez mais desalinhados dos tucanos explicam que a terceira via que estão buscando é outra: entre o PSDB de Alckmin e o PT de Lula.

Estamos falando de oito partidos que formam a base do governo Michel Temer e teriam tudo para já estar engajados na candidatura Alckmin, mas, ao contrário, não fazem outra coisa senão criticar duramente o PSDB e até Alckmin, diretamente. O próprio Temer não perdoa a omissão dele na votação das duas denúncias da PGR.

Esses partidos são o DEM, velho parceiro tucano, o PMDB, que oscila desde 1994 entre PSDB e PT, e os integrantes do Centrão – PSD, PP, PR, PRB, PTB e PSC – cada vez mais dentro do governo e empurrando os tucanos porta afora. O coordenador político do Planalto, Antonio Imbassahy, por exemplo, pode sair do governo a qualquer momento, até hoje mesmo.

Esse grupo, porém, continua com o problema de sempre: quer romper com o PSDB e lançar candidato comum, mas não tem um só nome com estatura e força suficientes para não dar vexame em outubro do ano que vem. Eles chegaram a sonhar com João Doria, mas consideram que o prefeito perdeu o fôlego. Falam de Paulo Skaf, da Fiesp, mas, se tiver algum juízo político, até o próprio Skaf deve rir dessa história.

Assim, a articulação deles pode ser apenas ameaça, uma forma de vender dificuldade para colher facilidade. Ainda assim, pode deixar sequelas. O risco do PSDB – ou seja, de Alckmin – é menos um candidato das forças aliadas, mas uma adesão fracionada e de má-vontade. Isso significaria não só perda de preciosos minutos na TV, mas um estouro da boiada nos Estados. Sem um candidato forte que una todos para a Presidência, cada partido vai desenhando suas alianças Estado por Estado. Quando olhar em volta, Alckmin poderá descobrir que o PMDB, por exemplo, lhe escapou pelas mãos, como em Alagoas. E o que falar do PSD? Do PR? Do PTB?

A bem do PSDB, diga-se que essa sensação de que tudo está de pernas para o ar não é uma exclusividade do partido. O PT está cheio de cicatrizes e com um candidato de futuro incerto e não sabido, as alianças nos Estados são as mais esdrúxulas e mais diversas, Bolsonaro virou um fator considerável e o governo não tem ideia para onde vai. Logo Alckmin terá pouco a comemorar na convenção de amanhã, que é apenas um passo numa estrada cheia de ameaças e armadilhas.

 

Arroz de festa. Só nesta semana, o diretor da PF, Fernando Segovia, foi a jantar do DEM, almoço do Itamaraty e show sertanejo em entrega de prêmio para jornalista. Sem deixar de passar pelo Planalto.

 

 

 

 

 

Limite a poder de Assembleia tem 5 votos

Julgamento que estabelece se Legislativo Estadual pode vetar medidas cautelares e prisões impostas pela Justiça a deputados foi adiado

Por: Rafael Moraes Moura / Amanda Pupo

 

Rafael Moraes Moura

Amanda Pupo / BRASÍLIA

 

Cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram contra a possibilidade de Assembleias Legislativas poderem revogar prisões de deputados estaduais decretadas pela Justiça. Porém, a decisão final sobre a imunidade conferida a parlamentares pelas Constituições do Rio, de Mato Grosso e do Rio Grande do Norte foi adiada.

A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, decidiu aguardar a volta dos ministros Ricardo Lewandowski (que está de licença médica) e Luís Roberto Barroso (que cumpre agenda no exterior), para concluir a análise do tema. Não há previsão de quando o julgamento vai ser finalizado, mas a volta de Barroso está prevista para a próxima semana.

A discussão sobre a imunidade de deputados estaduais dividiu o plenário: cinco ministros (Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen) votaram contra a possibilidade da revogação de prisões, enquanto outros quatro integrantes (Marco Aurélio Mello, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Celso de Mello) se posicionaram em outro sentido.

O julgamento terá impacto direto na situação dos deputados Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB fluminense, que tiveram a prisão revogada por uma resolução da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).

“A corrupção está sangrando o País. É preciso que princípios constitucionais digam respeito às instituições e aos princípios democráticos e não permitam que a imunidade se torne impunidade”, disse a presidente do Supremo. Cármen dedicou parte da leitura do voto para diferenciar a situação dos deputados estaduais da realidade dos federais – no caso dos primeiros, eles podem recorrer em variadas instâncias judiciais, enquanto os federais têm prerrogativa de foro perante o STF.

A ministra também distinguiu o que estava em julgamento ontem (a previsão de que deputados estaduais não podem ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável conforme fixado em Constituições Estaduais) do julgamento ocorrido no plenário em outubro, quando o Tribunal decidiu que cabe ao Congresso dar a palavra final sobre a aplicação de medidas cautelares – diversas da prisão – que interfiram no exercício do mandato de deputados federais e senadores.

Dias Toffoli observou que a Constituição Federal prevê que os “membros do Congresso Nacional” não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável.

Na sua visão, a prerrogativa diz respeito ao Congresso como instituição, e não a deputados e senadores como indivíduos, não podendo assim ser estendida a deputados estaduais.

“A vedação de prisão é prerrogativa da instituição, diz respeito a membros do Congresso Nacional. Isso é a defesa da instituição. Nada está na Constituição por acaso”, disse Toffoli.

 

Espelho. Durante a sessão, o ministro Gilmar Mendes fez uma defesa contundente da classe política. Para o ministro, o Judiciário não pode aproveitar um mau momento dos parlamentares para retirar garantias historicamente conferidas tanto em nível federal quanto estadual.

“Quem quiser criticar um outro Poder olhe-se no espelho”, disse Gilmar. Como exemplo para explicar por que o Judiciário não poderia se exceder, devendo “ter respeito à Constituição”, o ministro levantou a questão dos supersalários dos juízes. “Pagam-se remunerações três vezes acima do teto remuneratório”, afirmou.

Para Gilmar, a estabilidade institucional que o Brasil conquistou se deve à habilidade de políticos. “Não consta que tenha sido construída (a estabilidade) pelo Judiciário ou pelo Ministério Público”, disse.

O ministro também criticou quem assume papel de algoz da política para ser “aplaudido” e ter seus “pecadilhos esquecidos”, em uma referência ao Judiciário. Cármen interrompeu o colega: “Quem deve à sociedade tem encontro marcado e necessariamente será julgado, seja ele do Judiciário, do Executivo ou do Legislativo”.

 

Jugalmento. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, passa pelo ministro Edson Fachin, durante sessão no STF

 

Debate

“As imunidades parlamentares não são privilégios individuais, mas garantias para proteção das instituições.”

Cármen Lúcia

PRESIDENTE DO SUPREMO

 

“A vedação de prisão é prerrogativa da instituição, diz respeito a membros do Congresso Nacional. Isso é a defesa da instituição. Nada está na Constituição por acaso.”

Dias Toffoli

MINISTRO DO SUPREMO

 

“Quem quiser criticar um outro Poder olhe-se no espelho.” “

 

Não consta que tenha sido construída (a estabilidade) pelo Judiciário ou pelo Ministério Público.”

Gilmar Mendes

MINISTRO DO SUPREMO

 

PLACAR

As Assembleias Legislativas podem revogar a prisão e medidas judiciais de deputados estaduais?

A FAVOR

4

• Marco Aurélio Mello

• Alexandre de Moraes

• Gilmar Mendes

• Celso de Mello

 

CONTRA

5

• Edson Fachin

• Rosa Weber

• Luiz Fux

• Dias Toffoli

• Cármen Lúcia

 

 

 

 

Pensamentos políticos colidentes

Por: Luciano de Souza Godoy

 

ANÁLISE: Luciano de Souza Godoy

 

Três ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) questionam disposições das Constituições Estaduais de Mato Grosso, Rio Grande do Norte e Rio. Nelas, discute-se a extensão aos deputados estaduais das garantias previstas na Constituição aos deputados federais e senadores.

As ações foram apresentadas após os fatos ocorridos no Rio – a Assembleia determinou a soltura de três deputados estaduais, presos por ordem da Justiça Federal. Há a premissa da similitude: o artigo 27 da Constituição prevê a aplicação das garantias constitucionais dos deputados federais aos estaduais. Os parlamentares são equiparados pela Constituição quanto às garantias – imunidade e inviolabilidade. Protege-se o mandato conferido pelos eleitores, e as cautelares penais devem ser ratificadas (ou não) pelo Parlamento. Esta é a regra.

Contra a similitude, só aos parlamentares do Congresso Nacional aplicam-se essas garantias. O precedente foi decidido na ADI 5526, aplicada originalmente ao caso do Senador Aécio Neves. Pelo artigo 53 § 2.º da Constituição, as garantias se aplicam aos “membros do Congresso Nacional”.

O resultado é incerto. Faltam dois ministros para votar. E há dois pensamentos colidentes. De um lado, decidiu-se na ADI 5526 que as cautelares penais podem ser deferidas, mas, se interferem no mandato parlamentar, precisam ser ratificadas; foi um julgamento destinado aos membros do Congresso. A similitude é um valor da República. Vale a mesma regra para todos os parlamentares? E os vereadores, como ficam? De outro lado, há um sentimento nacional pelo combate à corrupção e contra a impunidade. Dar essa garantia aos deputados estaduais, no calor dos debates do caso do Rio, transmite um recado ruim à sociedade.

 

 

 

 

Cúpula da Alerj é denunciada por corrupção

Por: Constança Rezende

 

Constança Rezende / RIO

 

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça os deputados estaduais Jorge Picciani, presidente afastado da Assembleia Legislativa do Rio, Paulo Melo, ex-presidente, e Edson Albertassi, ex-líder do governo, todos do PMDB, por corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

A ação penal foi protocolada no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), cuja 1.ª Seção vai decidir se acolhe ou não a denúncia.

Além dos deputados, todos presos preventivamente na Cadeia Pública José Frederico Marques, foram denunciadas outras 16 pessoas. O MPF avalia que o esquema de propinas pode ter envolvido outros deputados estaduais, mas não divulgou detalhes.

“A corrupção na Alerj segue viva e em franca atividade”, disse o procurador regional da República no Rio Carlos Aguiar. Segundo a denúncia, atuava no Rio uma “poderosa organização criminosa abrigada no seio do PMDB fluminense, que operou a partir de espaços institucionais conquistados pelo sistema eleitoral”.

Os deputados são acusados de receber subornos para favorecer construtoras e concessionárias de transporte público. A denúncia aponta a existência de suposta caixinha, que, de 2013 a 2016, teria rendido R$ 250 milhões a políticos. O Rio, em grave crise fiscal, teria deixado de receber R$ 183 bilhões por causa de benefícios fiscais em favor de empresas envolvidas no suposto esquema de corrupção existente desde os anos 1990, segundo o MPF.

O advogado Márcio Delambert, defensor de Albertassi, divulgou nota na qual afirmou que a denúncia “fez um juízo equivocado da atuação parlamentar do deputado, com base na palavra isolada de um delator que é réu confesso. As acusações não procedem”. O Estado não conseguiu ouvir as defesas dos demais acusados.