O globo, n. 30794, 28/11/2017. País, p. 5
Lava-Jato pede renovação nas urnas: '2018 será batalha final'
Integrantes das forças-tarefas da Lava-Jato no Rio de Janeiro, Paraná e São Paulo defenderam, ontem, que a sociedade se mobilize para incluir o combate à corrupção na pauta eleitoral do ano que vem. Após reunião no Rio para aprimorar a colaboração entre os grupos de trabalho da operação, os procuradores afirmaram que o resultado das eleições vai definir o futuro das investigações — a renovação do Congresso deverá determinar o avanço das investigações no país, disseram. Os investigadores chegaram a pedir aos eleitores que candidatos envolvidos em denúncias de mau uso do dinheiro público sejam rejeitados nas urnas.
O grupo divulgou carta na qual afirma que 144 pessoas já foram condenadas a mais de 2.130 anos de prisão. Ao todo, 416 foram acusados de crimes. Segundo o procurador Deltan Dallagnol, da força-tarefa paranaense, mais de 100 integrantes atuais do Congresso estão envolvidos em denúncias. Além dos parlamentares, a corrida presidencial também tem pré-candidatos no radar das investigações — o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já foi condenado pelo juiz Sérgio Moro; e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), é alvo de um pedido de abertura de inquérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Dallagnol pediu renovação nos cargos políticos do país.
— Tanto pela perspectiva de evitar ataques do Legislativo contra as investigações, como pela perspectiva de avançar reformas, o ano de 2018 é a batalha final da Lava-Jato. A operação não vai ser julgada por quem ela prendeu ou condenou. Será julgada pela capacidade de mobilizar a sociedade e catalisar esforços para que reformas contra a corrupção sejam feitas. Isso depende do Congresso que elegeremos em 2018. Será uma grande vitória se forem eleitos para os cargos de deputado federal e senador candidatos com passado limpo, compromisso com a democracia e agenda anticorrupção. O futuro da Lava-Jato será sombrio se, em 2019, continuarem os mesmos políticos governando nosso país — disse Dallagnol.
O procurador regional da República José Augusto Vagos, do Rio, comparou a corrupção a um câncer — como fez o juiz Marcelo Bretas em entrevista ao GLOBO este mês — e disse que caberá a sociedade oferecer “a cura”.
— Nosso trabalho tem revelado que todo o sistema político está corrompido. Agora, cabe à sociedade avaliar o que deve ser feito. A atuação na repressão penal não vai resolver o problema. No Rio, temos líderes políticos que estão presos e, mesmo assim, ainda detém poder sobre o sistema político do estado e até fora dele. O objetivo é que a sociedade possa, em 2018, desnudado todo esse câncer na sociedade, em metástase, que a gente tem ministrado remédio, que a sociedade possa oferecer a cura — declarou Vagos.
Apesar do alerta para a “batalha final” da operação, os procuradores rejeitaram estabelecer um fim para as investigações. O encontro no Rio, com 20 investigadores dos três estados, serviu de base para troca de informações, o que resultará em operações conjuntas das forças-tarefas no ano que vem. Equipes do Rio e de Curitiba já atuaram juntas em novembro de 2016, na deflagração da Operação Calicute, que levou à prisão o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).
— Um dos objetivos é integrar experiências, trocar informações e expertise de investigações, como forma de integrar todas as investigações e traçar rumos para 2018. No ano que vem, serão deflagradas operações em conjunto pelas forças-tarefas. Será um ano de muito trabalho — afirmou Eduardo El Hage, coordenador do grupo no Rio.
ALERJ É “ALERTA DO QUE ESTÁ POR VIR”
Sem citar nomes, El Hage disse que o grupo de trabalho fluminense já identificou integrantes do governo de Luiz Fernando Pezão, no Rio, em esquemas de corrupção.
— Identificamos que existem, sim, membros do governo atual que estão envolvidos em práticas de corrupção. As apurações estão em curso com relação a pessoas detentoras de foro e não podem ser investigados por nós, que atuamos na primeira instância (do Judiciário). O foro privilegiado é um obstáculo enorme para que possamos avançar nas investigações — disse.
Ao defender o fim do foro privilegiado, os procuradores citaram a decisão da Assembleia Legistaliva do Rio (Alerj) de revogar a prisão dos deputados Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB como um “alerta do que está por vir”.
Coordenador da Lava-Jato em Curitiba, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima defendeu, ainda, a autonomia do Ministério Público de firmar acordos de colaboração com investigados.
— Esses acordos devem ser respeitados pelo Judiciário. Precisamos fazer com que Estado não tenha papel de má-fé com os colaboradores. As colaborações foram úteis, e os colaboradores precisam de proteção. O Estado é um só e não pode ser esquizofrênico — disse.