O Estado de São Paulo, n. 45339, 05/12/2017. Política, p.A8

 

 

 

 

 

PGR denuncia Geddel e Lúcio Vieira

Ex-ministro e deputado são acusados de lavagem de dinheiro e associação criminosa no caso do apartamento com R$ 51 mi em dinheiro

Por: Luiz Vassallo / Breno Pires

 

Luiz Vassallo

Breno Pires / BRASÍLIA

 

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, denunciou o ex-ministro Geddel Vieira Lima e seu irmão, o deputado federal Lúcio Vieira Lima, ambos do PMDB-BA. Os dois são acusados dos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa no caso dos R$ 51 milhões encontrados pela Polícia Federal em um apartamento em Salvador, em setembro.

Apesar de não acusar os peemedebistas de corrupção, a denúncia aponta propinas da Odebrecht, esquemas de devolução de salários dos servidores, pagamentos do corretor Lúcio Funaro e desvios relacionados ao “quadrilhão do PMDB” na Câmara como possíveis origens do dinheiro encontrado no apartamento. Geddel está preso na Penitenciária da Papuda, em Brasília.

A PGR também denunciou a mãe de Geddel e Lúcio, Marluce Vieira Lima, e o aliado político e o ex-assessor dos peemedebistas, Gustavo Ferraz e Job Brandão, respectivamente, além do empreiteiro Luiz Fernando Machado, dono da construtora Cosbat.

 

‘Bunker’. A apreensão dos R$ 51 milhões ocorreu no âmbito da Operação Tesouro Perdido, deflagrada em julho a partir de uma denúncia anônima. A PF encontrou, cerca de três meses depois, as cédulas guardadas em caixas e malas de viagem. Foi o maior montante de dinheiro já apreendido pela corporação.

Na investigação, a polícia encontrou indícios que ligavam o volume de dinheiro aos irmãos Vieira Lima. Em depoimento, o dono apartamento, o empresário Silvio Antonio Cabral Silveira, admitiu que emprestou o imóvel a Lúcio, a pretexto de guardar bens do pai do peemedebista, já falecido.

Além disso, a polícia identificou nas notas impressões digitais de Geddel, de seu aliado político Ferraz, ex-diretor da Defesa Civil de Salvador, e do assessor de Lúcio, Job, além de uma fatura com o pagamento da empregada do parlamentar.

No âmbito das investigações, Job, que foi preso no dia 16 de outubro, mesma data em que o gabinete de Lúcio foi alvo de busca e apreensão, resolveu colaborar com as investigações e tem feito tratativas para firmar acordo de delação premiada.

Seus depoimentos agravaram a situação dos peemedebistas perante à Justiça. Ele disse que por diversas vezes foi acionado pelo ex-ministro e pelo deputado para contar grandes quantidades de dinheiro. Job revelou ainda que devolvia 80% de seu salário aos irmãos.

A reportagem entrou em contato com a defesa de Lúcio, Geddel e a mãe dos dois, Marluce, mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.

 

‘Esperado’. A defesa de Ferraz disse que não teve acesso até o momento à peça de acusação e não iria se manifestar. “Tendo em vista o relatório final da PF, eventual denúncia já era esperada, mas a defesa continua tranquila para provar sua inocência. O que se espera é que seja retirada a prisão domiciliar de Gustavo, que se já não fazia sentido antes, com mais razão não faz agora”, escrevem os advogados Pedro Machado de Almeida Castro e Octavio Orzari.

 

 

 

 

 

Prisão em 2º grau opõe Gilmar e Raquel Dodge

Ministro do STF vê prisão provisória ‘eterna’ na Lava Jato, enquanto PGR defende cumprimento de pena após recurso
Por: Beatriz Bulla / Breno Pires

 

Beatriz Bulla

Breno Pires / BRASÍLIA

 

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e a procurador-geral da República, Raquel Dodge, apresentaram ontem, em eventos diferentes, entendimentos antagônicos sobre a execução da prisão após decisão em segunda instância. Gilmar afirmou que o cumprimento da pena, com a Lava Jato, tornou-se “algo dispensável”, uma vez que a prisão provisória passou a ser “eterna”. Raquel, por sua vez, defendeu a prisão após julgamento do recurso nos tribunais de segundo grau como um dos instrumentos jurídicos de combate à corrupção, sem os quais o Brasil viverá um “duro golpe”.

“Se a corrupção continuar em níveis tão elevados e perdermos os instrumentos jurídicos que realmente nos permitem enfrentá-la, como a execução da pena em segunda instância, a titularidade (do Ministério Público Federal) para celebrar acordo de colaboração premiada, a força do acordo de leniência, o Brasil sofrerá o duro golpe de perder o futuro promissor e ter de viver em um presente marcado pela desonestidade e pela desconfiança”, afirmou Raquel, em sua mais longa manifestação pública sobre o tema, durante um evento em comemoração ao Dia Internacional de Combate à Corrupção.

A previsão de execução da pena após uma decisão de segunda instância – antes do esgotamento de todos os recursos nos tribunais superiores – foi admitida pela maioria do Supremo em outubro do ano passado. Recentemente, no entanto, parte da Corte tem sugerido a possibilidade de reversão desse entendimento, com um novo julgamento.

Em outro evento ontem em Brasília, sobre independência e ativismo judicial, Gilmar afirmou que, sem a revisão do entendimento sobre a prisão em segunda instância, o papel do Supremo e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fica reduzido na garantia dos direitos do cidadão brasileiro. “Se tem quase uma demissão nossa”, disse o ministro.

 

‘Desconfianças’. Raquel admitiu a existência de “desconfianças” sobre seu compromisso com o combate à corrupção e afirmou que o tema na sua gestão é “prioritário”. “São indagações autênticas, verdadeiras e coerentes, algumas carregadas de desconfianças e dúvidas que são em tudo compatíveis com a leitura crítica da história brasileira, marcada por ondas sucessivas de avanços e retrocessos no enfrentamento da corrupção”, afirmou.

Ela foi nomeada procuradora-geral pelo presidente Michel Temer apesar de não ter ficado em primeiro lugar na lista tríplice elaborada pelos integrantes do Ministério Público Federal (MPF) – o primeiro colocado foi Nicolao Dino, aliado do exprocurador-geral Rodrigo Janot. Na época da indicação, o antecessor de Raquel já havia enviado ao STF a primeira denúncia contra Temer, por corrupção passiva, com base nas delações de executivos do Grupo J&F. Raquel e Janot são desafetos no Ministério Público.

 

Compromisso. Nos primeiros discursos após a posse, realizada em 18 de setembro, a procuradora-geral fez breves menções ao combate à corrupção. Ontem, porém, assegurou seu compromisso com o tema. “Considero muito importante dizer a todos com clara sinceridade algumas razões que presidem minha firme atitude contra a corrupção”, afirmou. Raquel disse que o MPF vai continuar a usar instrumentos como delação premiada, leniência, forças-tarefa, execução da pena após a segunda instância e a Lei da Ficha Limpa.

“Algumas quadrilhas foram desbaratadas, mas muitas continuam a agir com desfaçatez, à luz do dia e em conluios que não escapam a registros, a câmeras de vídeo e a colaborações. Outras escondem quantias milionárias, às vezes de modo tão petulante e displicente que nos dão a certeza de que não temem a punição”, afirmou a procuradora-geral, sem mencionar casos concretos.

Segundo Raquel, o mensalão e a Lava Jato são “marcos exitosos” da empreitada do MPF contra a corrupção.

 

Instrumentos jurídicos

“Se a corrupção continuar em níveis tão elevados e perdermos os instrumentos jurídicos (...), o Brasil sofrerá o duro golpe de perder o futuro promissor e ter de viver em um presente marcado pela desonestidade.”

Raquel Dodge

PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA

 

“Se tem quase uma demissão nossa (a não revisão da prisão em segunda instância).”

Gilmar Mendes

MINISTRO DO STF

 

 

 

 

 

PGR pede anulação de habeas corpus

Por: Breno Pires

Na manifestação em que aponta extrapolação de competência, a Procuradoria-Geral da República (PGR) recorreu da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes de soltar pela terceira vez o empresário Jacob Barata Filho, conhecido como “Rei do Ônibus”. Para a PGR, a decisão de Gilmar de revogar ao mesmo tempo duas ordens de prisão deve ser anulada porque não seria ele, e sim o ministro Dias Toffoli, o relator da Operação Cadeia Velha. Na peça de 37 páginas que chegou ao Supremo ontem, Raquel Dodge defende os fundamentos presentes nos dois mandados de prisão que Gilmar revogou./B.P.

 

 

 

 

 

Corrupção é causa de 70% de ações com foro

Por: Beatriz Bulla

 

BRASÍLIA

 

Cerca de 70% das ações que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) envolvendo autoridades com prerrogativa de foro – como parlamentares, ministros e governadores – tratam de crimes relacionados à prática de corrupção. A estimativa foi feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e divulgada ontem pela manhã em evento pelo Dia Internacional de Combate à Corrupção.

Atualmente há 95 ações penais e 439 inquéritos no STF, todos com envolvimento de autoridades que têm o chamado foro privilegiado. Já no STJ – responsável por analisar casos relacionados a governadores e conselheiros de Tribunais de Contas – existem 72 ações penais, 101 inquéritos e 54 sindicâncias.

Ainda de acordo com o balanço divulgado ontem pela PGR, neste ano foram realizadas ao menos 40 operações de combate à corrupção em todo o País.

Os acordos de leniência firmados pelo Ministério Público Federal (MPF) com empresas investigadas em casos de corrupção devem gerar o recebimento de R$ 24 bilhões aos cofres públicos, segundo dados da PGR. O levantamento não traz quais acordos estão incluídos nesse dado.

Pelo balanço divulgado, foram firmados 18 acordos de leniência – espécie de delação premiada feita pelas empresas. A maior multa estabelecida em acordos desse tipo foi a da J&F, de R$ 10,3 bilhões.

O balanço da PGR também define a delação premiada como um “fator importante para aprimoramento do trabalho de combate à corrupção”.

De acordo com os números da Procuradoria-Geral, cerca de 200 pessoas tiveram acordos de delação homologados apenas nos processos referentes à Operação Lava Jato. Somando a atuação da PGR, no Supremo, com a do MPF na Justiça de primeira instância, a Lava Jato tem atualmente 293 acordos de delação. No balanço, a PGR destaca ainda que a delação também foi um “instrumento decisivo” para o aprofundamento das investigações./ B.B.