O globo, n. 30855, 28/01/2018. País, p. 6

 

"PT se fortaleceria ao fazer mudanças"

José Eduardo Cardozo e Jeferson Ribeiro

28/01/2018

 

 

Ex-ministro da Justiça e advogado de Dilma no processo de impeachment prega reinvenção do partido, mas diz que isso não acontece porque há ‘tentativas de demonizar a legenda’

Ex-ministro do governo Dilma Rousseff e advogado dela no processo de impeachment, José Eduardo Cardozo nunca foi próximo ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, desde o mensalão, defendeu que o PT passasse por uma refundação e criasse uma corregedoria. Agora, porém, está alinhado à maioria do partido para defender a candidatura de um Lula condenado a mais de 12 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Desde o mensalão o senhor defende a refundação do PT, mas isso nunca aconteceu. Como se sente vendo que a questão ética só se agravou no partido?

Essa é uma questão que tenho colocado no PT, é de convencimento interno. É democrático, temos de convencer a maioria partido, senão não consegue fazer. Eu luto por uma série de modificações. E o que eu puder fazer vou continuar fazendo até que um dia eu convença a maioria.

Mas, mesmo com o cenário de petistas presos, por que não ganha força a tese de refundação e expulsão de quadros que cometeram crimes?

Por uma questão perversa que é justamente essa tentativa de setores de demonizar o PT. Aí se adota uma postura de defesa para não se enfraquecer internamente, quando, a meu ver, se fortaleceria ao fazer as mudanças. Mas hoje qual partido não se envolveu em acusações gravíssimas? A história da demonização do PT não é nova. A corrupção tem que ser combatida a sério, de forma isonômica e sem demonização de partido A, B, C.

Se a refundação da legenda tivesse sido feita, o cenário hoje seria diferente?

Eu acho que sim. Não foi feita (a refundação) por causa dessa pressão externa. Veja o exemplo do PSDB. Fez uma autocrítica na TV, mas o Aécio não foi expulso. Quando passa a ser demonizado como instituição, é difícil fazer isso. Para alguns, seria enfraquecer a defesa do partido. Quando tem disputa política não se avança no combate a corrupção.

Mas, no segundo mandato, Lula havia superado eleitoralmente o mensalão, e ainda não havia Lava-Jato...

Eu tenho a visão de que o PT precisa ser reformulado. Mas isso não aconteceu por força da conjuntura. Quando se é atacado, não se encontra tranquilidade para se discutir isso. O PT é carimbado por certos setores desde 2005. O Lula e a Dilma tiveram que responder a essa demonização desde 2005.

Após a condenação tão firme contra Lula, com a possibilidade de o ex-presidente ser preso, o PT deve continuar com a pré-candidatura custe o que custar?

Essa decisão já era esperada no mundo jurídico por força da atuação do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), numa postura de confirmar decisões do (juiz Sergio) Moro. O próprio tribunal chegou a falar numa decisão que, para combater esse estado de coisas, era até possível existir um estado de exceção. Agora, isso não retira dessa decisão um caráter politicamente desastroso. Está valendo tudo. No fundo é como se fosse um julgamento político, permeado por circunstâncias jurídicas. Esse processo eleitoral sem o Lula, a partir de uma situação bastante discutível, terá sua legitimidade questionada antes de começar. O resultado disso para o país será desastroso se o Lula for impedido de participar dessa forma. Seus adversários deveriam querer derrotá-lo nas urnas. E não com uma decisão judicial que não convence.