O Estado de São Paulo, n. 45390, 25/01/2018 . Política, p.A6

 

 

 

Turma impõe derrota unânime e restringe recursos 

Desembargadores negam todos os pedidos do advogado de Lula, mantêm condenação imposta por Moro e aumentam pena de prisão

 

Ricardo Brandt 
Ricardo Galhardo 

 

A unanimidade nos votos dos três desembargadores federais da 8.ª Turma Criminal do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), de Porto Alegre, marcou o julgamento do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Eles decidiram juntos negar todos os pedidos do advogado do petista, Cristiano Zanin Martins, manter a condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP) e ainda aumentar a pena de prisão em regime fechado. Com a coesão da decisão, a defesa de Lula poderá apresentar apenas um único recurso ao próprio Tribunal. Os embargos de declaração são cabíveis para questionar a redação do acórdão. Isso diminui o número de apelações – se o resultado tivesse uma divergência, o ex-presidente poderia recorrer aos embargos infringentes, que seriam julgados pelas 7.ª e 8.ª Turmas da Corte. Após os embargos de declaração, caberá ao petista apelar apenas aos tribunais superiores.

O relator João Pedro Gebran Neto, o revisor Leandro Paulsen e o terceiro membro da turma, Victor Laus, destacaram em seus votos que o condenado detinha prestígio e poder por se tratar de um ex-presidente. “Infelizmente está sendo condenado um ex-presidente da República que praticou crimes”, disse Gebran, em exposição que durou aproximadamente três horas. Lula foi condenado pelo juiz Sérgio Moro, da Lava Jato em Curitiba, que entendeu que o imóvel representava uma propina de R$ 2,2 milhões destinada ao petista pela empreiteira OAS. Gebran ainda descartou a suspeição de Moro; a incompetência da 13.ª Vara Federal Criminal da capital paranaense; o suposto cerceamento de defesa na primeira instância; a falta de vínculos da relação entre o expresidente e os desvios na Petrobrás e entre os desfalques na estatal e o apartamento do Guarujá; e a ausência de provas por parte dos delatores.

Em seu voto, o desembargador fez também uma defesa da sentença de Moro. “Como já apontado, não julgamos o nome ou o personagem ou ainda um reconhecido estadista. Julgamos, sim, fatos concretos, os quais foram examinados, julgados, dentro da mais perfeita moldura constitucional da legalidade, das provas e dos limites da minha capacidade”, afirmou o relator da Lava Jato na Corte. Quanto ao mérito da acusação, o desembargador, usando linguagem coloquial em vez do jargão jurídico, procurou usar provas como trocas de e-mails, documentos apreendidos e depoimentos de pessoas que participaram da reforma do triplex, que vão além das delações premiadas, para desmontar a narrativa sobre a falta de provas contra o ex-presidente. Além disso, Gebran recorreu ao depoimento do ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, Léo Pinheiro, para provar a propriedade de Lula sobre o imóvel.

O relator reforçou a tese de que Lula, na condição de presidente, teve participação na montagem do esquema de corrupção na Petrobrás. Mais do que isso, ressaltou o fato de Lula ocupar o posto mais alto da República para justificar o aumento da pena. Gebran aproveitou para mandar um recado a políticos e corruptos: “Mas, como demonstraram os autos, o que atinge a democracia não é o processo penal, nem o julgamento daqueles que tiveram ou pretendem ter atuação política, é o uso dos recursos ilícitos que atingem uma ferramenta de subversão do processo democrático e de fragilização da participação igualitária no pleito eleitoral”.

Unânime. Relator do processo na Corte, Paulsen afirmou, em seu voto, que na Lava Jato “não há vítimas nem vilões” e relembrou o caso do mensalão, que ocorreu durante o governo Lula, em 2005. “Já na época do mensalão havia simbiose entre setor provado e público”, disse. “Mudam-se o nome dos políticos e operadores, mas a estrutura mostra-se constante.” Paulsen destacou que Lula é acusado por crimes com base em leis promulgadas em governos do PT, como a Lei Anticorrupção, das Organizações Criminosas e Delações Premiadas. Nesse sentido, reafirmou a neutralidade dos agentes do processo. “O julgamento é realizado por juízes togados, com formação e experiência para atuar com equidistância e imparcialidade”, disse. “As práticas de compadrio, de barganha, de arregimentação de apoios e de ameaças de retaliações são estranhas ao ambiente judicial. E, se houver, serão criminosas. A linguagem, a lógica, o encaminhamento, não são os do tráfico de influência, da camaradagem, do tapinha nas costas. Aqui, ninguém pode ser condenado por ter costas largas e ser absolvido por ter costas quentes”, afirmou Paulsen.

Visível. Laus, o terceiro desembargador a votar, acompanhou os colegas. Ao negar todos os pedidos da defesa de Lula, ele também afirmou que há provas documentais no processo “para quem quiser ver”. “Por que alguém reforma um imóvel se não tem interesse nele?” O desembargador ainda reforçou que é o “contexto geral” que, unido a elementos, sustenta uma convicção em um caso como o do ex-presidente. Ele disse que todos os depoimentos do processo foram complementares. “Como juiz, tenho que ter segurança para tomar decisão”, afirmou.

Aumento

9 anos
e 6 meses de prisão foi a pena imposta pelo juiz Sérgio Moro ao ex-presidente Lula; sentença foi proferida em julho de 2017.

12 anos
e 1 mês foi a pena imposta ao petista pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em decisão de ontem.