O globo, n. 30776, 10/11/2017. País, p. 3
Novo diretor-geral começa a trocar o comando da PF
Jailton de Carvalho
10/11/2017
-BRASÍLIA- Um dia depois de nomeado diretor da Polícia Federal pelo presidente Michel Temer, o delegado Fernando Segóvia começou a troca de todo o comando da instituição. Segundo um interlocutor do diretor-geral, o delegado Sandro Avelar deverá ser o diretor-executivo, o segundo cargo mais importante na hierarquia da polícia. Ex-presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), Avelar foi secretário de Segurança na gestão do ex-governador do Distrito Federal Agnelo Queiroz (PT) e se candidatou a deputado federal pelo PMDB em 2014, mas não se elegeu.
A candidatura de Avelar teve a benção do ex-vice-governador do DF Tadeu Filipelli, ex-assessor especial de Temer, que deixou o governo depois de ser preso numa investigação da Polícia Federal sobre desvio de dinheiro público na construção do estádio Mané Garrincha.
Segóvia também já convidou o delegado Eugênio Ricas, secretário de Transparência do Espírito Santo, para chefiar a diretoria de Combate ao Crime Organizado. A diretoria é responsável pelas grandes operações de combate à corrupção, entre elas a Lava-Jato. Cláudio Gomes, ex-corregedor-geral, deverá chefiar a diretoria de Inteligência.
Em outra frente, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, escolheu o diretorexecutivo da PF, Rogério Galloro, para comandar a Secretaria Nacional de Justiça. O ex-secretário Astério Pereira dos Santos pediu exoneração do cargo na noite de quarta-feira.
A transferência de Galloro para a Secretaria Nacional seria uma compensação ao delegado e ao próprio ministro, que foram preteridos no processo de escolha do novo chefe da PF. Galloro era o nome preferido do ministro para substituir o agora ex-diretor Leandro Daiello, que deve se aposentar ao fim da transição. Temer decidiu, no entanto, indicar Segóvia, que, até recentemente, era adido na África do Sul. A portaria de nomeação foi publicada no Diário Oficial da União ontem mesmo, um dia depois da indicação. A posse está marcada para a manhã de segunda-feira.
Com o caminho livre, Segóvia se reuniu ontem pela manhã com Daiello e começou imediatamente o processo de transição. Numa tentativa de demonstrar que as mudanças não implicarão em ruptura, os dois fizeram uma teleconferência com os superintendentes da PF em todo o país. Um dos superintendentes disse ao GLOBO que a saída de Daiello foi uma surpresa para quase todos os delegados. Embora tenha sido cogitada várias vezes ao longo dos últimos anos, o ex-diretor teria sido informado pelo ministro da Justiça que ficaria no cargo até o último dia do governo Temer.
— Foi uma surpresa para todos nós. Estamos sem saber o que aconteceu — disse o superintendente.
Depois de confirmada a indicação, Segóvia tratou rapidamente de definir os nomes da equipe de auxiliares mais próximos. A escolha de Sandro Avelar para a diretoria-executiva teria sido acertada previamente.
Antes da indicação de Segóvia, Avelar era tido como um dos preferidos do Planalto para chefiar a PF. Os dois teriam feito um acordo de apoio mútuo. O vencedor da disputa convidaria o outro para compor a diretoria.
Ainda ontem, Segóvia disse a interlocutores não ter recebido nenhum pedido especial de Temer ou de qualquer outro político em relação à Lava-Jato. Segóvia fez o comentário ao rebater insinuações de que teria sido indicado para o cargo pelas boas relações com políticos investigados e, por isso, poderia aliviar o peso das investigações.
— Ele acha que está havendo uma distorção nas informações. Ele não recebeu nenhum pedido do presidente — disse um interlocutor do diretor-geral.
ASTÉRIO ALEGOU MOTIVOS PESSOAIS
O ex-secretário Astério Pereira estava no governo desde março deste ano e alegou motivos pessoais para deixar o cargo. Ele deixa o governo uma semana depois de o ministro Torquato Jardim dizer que comandos da Polícia Militar no Rio de Janeiro fazem acerto com deputados estaduais e o crime organizado. A declaração provocou forte reação de policiais militares. Astério foi secretário de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro entre 2003 a 2006, no governo Rosinha Garotinho. Como coordenador de Segurança e Inteligência do Ministério Público do Rio de Janeiro, atuou de 2007 até 2008.
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Câmara aumenta rigor para saída de presos
Patrícia Cagni e Cristiane Jungblut
10/11/2017
-BRASÍLIA- A Câmara aprovou ontem dois projetos de lei do pacote de segurança pública. O primeiro torna mais rígidas as regras para a saída temporária de presos, o chamado “saídão”, e o outro cria um cadastro nacional de pessoas desaparecidas.
Atualmente, para ter direito ao benefício do “saídão”, os detentos devem ter cumprido ao menos um sexto da pena em regime fechado, quando réu primário, e um quarto aos reincidentes com bom comportamento e aos que cumprem pena em regime semiaberto.
No projeto principal, membros da “bancada da bala” queriam extinguir qualquer possibilidade de saída temporária. Entretanto, tiveram que negociar o texto. A proposta aprovada altera o prazo estipulado para que o benefício seja concedido. De um quarto para os reincidentes, este período sobe para metade da pena. No caso de condenação por crimes hediondos — prática da tortura, tráfico de drogas e terrorismo — os prazos passam para dois quintos no caso de réus primários, e três quintos para os reincidentes.
O texto define ainda que, para conceder a vantagem, o juiz precisará de parecer favorável à medida. O documento deve ser emitido pela administração da penitenciária. O tempo fora da cadeia também diminuiu, de sete para quatro dias.
O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) alertou para o fato de que apenas 5% dos detentos liberados em saídas temporárias não retornam ao presídio.
— É uma medida atroz, equivocada, que faz uma maioria ser prejudicada. Temos que ter critério e cuidado. E não simplesmente fazer uma política de arrasa quarteirão. Legislar emocionalmente não é um bom caminho para a busca da diminuição da violência no país — ressaltou, ao detalhar que as saídas auxiliam os detentos na ressocialização.
Além disso, os deputados também concluíram a votação dos destaques apresentados ao projeto de lei do deputado Alberto Fraga (DEM-DF) que obriga o condenado por assassinato ou lesão dolosa gravíssima contra policiais civis, militares, e seus parentes até terceiro grau, a cumprir a pena integralmente em regime fechado. Na prática, isto significa que o acusado não terá direito a progressão do tempo de pena estipulado em julgamento.
— Quem matar policiais vai cumprir a pena em regime fechado. Nosso objetivo era frear os assassinatos, porque tornamos o crime hediondo em 2015 e não adiantou nada. Espero que isso seja um fator inibidor destas mortes — disse Fraga durante a votação da noite da última quarta-feira.
PACOTE DE SEGURANÇA TERMINA
O outro projeto aprovado institui a Política Nacional de Busca de Pessoas e cria o novo Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas. O texto estabelece uma sincronia entre os Poderes, órgãos de investigação e representantes da sociedade civil.
— Temos, desde 2009, a criação do cadastro nacional de pessoas desaparecidas. O programa é importante, mas pelo nosso entendimento, pela falta de política arrojada, de sincronia entre os vários órgãos, o cadastro ficou ineficiente — constatou a relatora do projeto, Eliziane Gama (PPS-MA).
Uma das autoras do projeto, Maria do Rosário (PT-RS), destacou que o texto tem a finalidade de facilitar a busca, localização e identificação, além de “pôr termo às dificuldades burocráticas que impedem tratamento adequado à matéria, em prejuízo a desaparecidos e seus familiares".
As votações do Pacote de Segurança terminaram ontem com a retirada pela oposição do projeto que acaba com os chamados “autos de resistência”, quando policiais relatam a morte de bandidos como consequência de conflito. Também ficou para depois o projeto que trata dos chamados “escudos humanos”, quando criminosos utilizam as vítimas para se proteger.
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Seminário vai debater papel do judiciário na sociedade brasileira
10/11/2017
BRASÍLIA — A reforma trabalhista — aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Michel Temer em julho — entra em vigor amanhã, mas não há garantia de que será aplicada na íntegra. Uma parte dos juízes trabalhistas vem se insurgindo contra a nova norma por entender que ela viola a Constituição e direitos dos trabalhadores. A “rebelião” dos magistrados é um exemplo de um debate que vem ganhando corpo, o do ativismo judicial, e que será discutido em 4 de dezembro de 2017 em um seminário no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O evento “Independência e Ativismo Judicial: Desafios Atuais”, promovido pelo STJ e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), é coordenado pelo ministro Luis Felipe Salomão, que integra a corte, e por Henrique Ávila, que faz parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Serão tratadas questões como as consequências e os impactos econômicos e sociais do ativismo judicial, além de conceitos relacionados à independência dos juízes.
Há duas tendências hoje no Judiciário brasileiro. Uma defende uma atuação mais contida dos juízes, não indo além daquilo previsto na lei. Por essa avaliação, não é bom que a Justiça tenha mais atribuições do que aquelas já definidas nem que se intrometa no que é prerrogativa de outros poderes. A outra corrente entende ser necessário um trabalho mais atuante, em especial quando outros poderes, como o Legislativo, deixam de tomar decisões.
— Esse seminário pretende ser um ponto de partida para um grande debate sobre o adequado papel do Judiciário na sociedade brasileira contemporânea — afirmou Salomão.
Segundo ele, já confirmaram presença o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, entre outros. As inscrições estão abertas a todos no site do STJ e vão até 1º de dezembro.