Título: Dilma diz que tsunami monetário abala Brasil
Autor: Henrique Braga, Gustavo
Fonte: Correio Braziliense, 02/03/2012, Economia, p. 10

A presidente Dilma Rousseff assegurou ontem que o governo não se intimidará na luta para conter o derretimento do dólar ante o real. Apesar do constante fracasso do Banco Central e do Ministério da Fazenda em evitar que a moeda norte-americana seja negociada abaixo de R$ 1,70, ela garantiu que o Brasil tem cartas na manga para enfrentar a guerra cambial e que novas medidas poderão ser adotadas além das mudanças no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) que passaram a valer ontem.

Dilma classificou a injeção de quase US$ 5 trilhões feita pelos países ricos nos últimos meses na economia como um "tsunami monetário". A crítica ganhou força diante da decisão do Banco Central Europeu (BCE) de liberar, na última quarta-feira, empréstimos de 529,5 bilhões de euros a 800 bancos do continente. O objetivo foi incentivar o crédito, reduzir o risco de calote dos países mergulhados na crise e conter a recessão. Com isso, os recursos despejados pelo BCE chegaram a 1 trilhão de euros em pouco mais de dois meses, o que provocou forte valorização do real neste período.

Pressionada por empresários e sindicalistas a defender a indústria nacional, que está perdendo terreno no comércio internacional, Dilma acusou os países desenvolvidos de praticarem uma política de juros "absolutamente inconsequente". "Nos preocupamos, sim, com esse tsunami monetário dos países desenvolvidos, que não usam políticas fiscais de ampliação da capacidade de investimentos para sair da crise em que estão metidos e que literalmente despejam US$ 4,7 trilhões no mundo", declarou, ressaltando que essa montanha de recursos provoca efeitos perversos, sobretudo nas nações emergentes, que continuam crescendo. "Nós sabemos que, hoje, as condições de concorrência são adversas. Não porque a indústria brasileira não seja produtiva, não porque o trabalhador brasileiro não seja produtivo, mas porque tem uma guerra cambial que cria condições desiguais", emendou. "Então, vamos impedir a canibalização."

Concorrência desleal O discurso da presidente deixou claro que o governo fará de tudo para conter a avalanche de capital estrangeiro no Brasil. Não sem motivo. O Palácio do Planalto já recebeu indicações de que setores importantes da indústria estão suspendendo a produção por total falta de capacidade de competir com os importados barateados pelo dólar fraco. Não se trata de uma onda de desindustrialização como pregam os mais alarmistas, mas se teme que a concorrência desleal acabe tornando esse processo realidade. A indústria já está tendo dificuldade de abrir vagas, mesmo com a demanda das famílias mantendo-se firme. Nas contas dos empresários, de cada 100 produtos consumidos no Brasil, 23 já vêm de fora — um recorde.

As dificuldades dos países emergentes de lidar com a enxurrada de dinheiro vindo de nações mais ricas são tão evidentes que o Fundo Monetário Internacional (FMI), sempre contrário a qualquer restrição a movimentos de capitais, alertou que o Brasil precisa fazer alguma coisa urgente para conter os estragos provocados pela inundação financeira. Os analistas se mostram céticos. "Mexer nos impostos para atacar uma questão cambial não é uma medida muito eficiente", avaliou Rubbens Velloza, especialista em tributação. De qualquer forma, ele explicou que o governo não pode ficar de braços cruzados e ressaltou que a legislação permite ao Ministério da Fazenda elevar o IOF sobre capital estrangeiro para até 25%.