O globo, n.30798 , 02/12/2017. PAÍS, p.3

GILMAR VOLTA A SOLTAR BARATA

CAROLINA BRÍGIDO

 

 

Padrinho de casamento da filha do empresário, ministro do STF concede 3º habeas corpus

 

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu ontem novo habeas corpus para libertar os empresários do setor de ônibus do Rio Jacob Barata Filho e Lélis Teixeira. Foi o terceiro benefício que o ministro concedeu aos dois neste semestre. Eles foram presos pela primeira vez em julho, na Operação Ponto Final, que apura um esquema de pagamento de propina em troca de vantagens a empresas do setor de transporte coletivo. Foram soltos por Gilmar. Em seguida, a 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro mandou prendê-los de novo. Gilmar voltou a libertá-los. Os empresários, mais uma vez, foram presos em novembro e, agora, ganharam novo benefício. No penúltimo habeas corpus concedido, Gilmar impôs uma série de medidas cautelares aos empresários — como o recolhimento noturno, a proibição de deixar o país e o impedimento de se comunicar com outros investigados. Essas medidas foram confirmadas, em julgamento, pela Segunda Turma do STF, composta por cinco ministros. Depois desse habeas corpus, os empresários foram alvo de decreto de prisão preventiva do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), por conta da Operação Cadeia Velha. Pouco depois, a 7ª Vara Federal Criminal do Rio expediu novo decreto de prisão contra Barata Filho, porque ele estaria descumprindo ao menos uma medida cautelar imposta pelo STF: a proibição de exercer cargos na administração de sociedades e associações ligadas ao transporte coletivo de passageiros. Segundo a decisão da 7ª Vara, documentos apreendidos na casa de Barata comprovam que ele estaria administrando empresas do setor de transporte. A defesa contestou a informação. Disse que os documentos foram mal interpretados. Gilmar concordou com os advogados.

Apesar de a defesa dos empresários ter pedido habeas corpus apenas para a prisão decretada na Operação Ponto Final, o ministro ressaltou que as duas investigações, embora não sejam idênticas, guardam muitas semelhanças. Por isso, considerou que não seria indicado revogar apenas um dos decretos de prisão. “Deve haver um mínimo de coordenação da reação estatal aos supostos delitos. Não é viável a sobreposição não coordenada de medidas cautelares pessoais, simplesmente porque frações dos fatos são apuradas em outros autos, ou mesmo perante outro Juízo”, escreveu Gilmar. Segundo o ministro, as provas da investigação mais recente, a Cadeia Velha, são anteriores à primeira prisão. Isso derrubaria o argumento do TRF-2 de que seria preciso manter os investigados presos em função de as provas serem de delitos recentes. “A atualidade do delito, argumento verdadeiramente novo quanto à necessidade da prisão, remonta a maio deste ano. Ou seja, é anterior à prisão decretada pela 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, reformada nesta ação de habeas corpus”. Para o ministro, o decreto de prisão do TRF-2 foi uma forma de “contornar a decisão do STF” de conceder os habeas corpus aos empresários. Ele também reclamou que a prisão preventiva foi decretada sem que os advogados fossem ouvidos antes. “No caso concreto, a decretação da prisão preventiva substitutiva não foi precedida de contraditório, nem de justificativa quanto à urgência ou ao perigo de ineficácia da medida”. Gilmar concordou com os argumentos da defesa de que os documentos apreendidos eram relativos à administração de empresas de outros setores. “A medida cautelar diversa da prisão não impediu o paciente de manter a administração de outras empresas, não ligadas ao transporte coletivo de passageiros. Logo, não há descumprimento das mencionadas medidas em razão de atuação em empresa que presta serviço a empresas de transporte”, escreveu o ministro.

JANOT PEDIU IMPEDIMENTO DE GILMAR

O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot chegou a pedir ao STF o impedimento de Gilmar para atuar em processos sobre Barata Filho e Lélis Teixeira. Para Janot, Gilmar não teria isenção para atuar nos casos, por ter algum tipo de relação com os investigados. Em 2013, o ministro foi padrinho de casamento de Beatriz Barata, filha de Jacob Barata Filho, com Francisco Feitosa Filho, sobrinho de Guiomar Mendes, casada com Gilmar. A PGR também afirmou que Barata Filho integra a sociedade Autoviação Metropolitana Ltda, ao lado, entre outros, da FF Agropecuária e Empreendimentos S/A, administrada por Francisco Feitosa de Albuquerque Lima, cunhado de Gilmar. Janot ainda apontou que o escritório do advogado Sérgio Bermudes, onde Guiomar trabalha, atuou em processos na Ponto Final, inclusive em ações de interesse de Barata Filho e Lélis Teixeira. A arguição de impedimento está sob análise da substituta de Janot, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que ainda não se manifestou sobre o caso. Em resposta ao ofício de Janot, Gilmar disse que a ação foi um ataque pessoal a ele e a Guiomar. o ministro argumentou que o escritório de Bermudes presta serviços na área cível, e não penal. Por isso, não haveria impedimento. O ministro também afirmou que ser padrinho de casamento da filha do empresário não configura relação próxima. Em nota, a defesa de Barata Filho disse que a decisão “comprova que o STF é o guardião maior das garantias individuais” e que “não surgiu nenhum fato novo” que justificasse outra prisão.