Título: Ahmadinejad na berlinda
Autor: Vicentin, Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 02/03/2012, Mundo, p. 17

Os iranianos renovam hoje, nas urnas, as 290 cadeiras do Majlis (parlamento), mas a expectativa é de baixa participação dos 48 milhões de eleitores. Com candidatos selecionados pelo grupo de clérigos que controla o país, a escolha se fará apenas entre representantes da facção conservadora do regime islâmico. Um personagem, porém, tem interesse capital no resultado: o presidente Mahmud Ahmadinejad é, ao mesmo tempo, o fator que diferencia os concorrentes e o político que mais tem a ganhar ou a perder.

"Será, na verdade, uma briga entre aliados e opositores de Ahmadinejad", resume o professor Murilo Meihy, especialista em história contemporânea do Irã na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. As principais coligações que participam representam apoiadores do presidente ou setores críticos à sua tentativa de ganhar poder internamente. Nos últimos dois anos, Ahmadinejad — eleito e reeleito graças ao apoio do líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei — passou a adotar uma posição mais forte em relação a vários temas. Por diversas vezes, ensaiou contrariar o líder, criando uma tensão política interna que aumenta as preocupações da comunidade internacional.

O principal temor é de que esse quadro dificulte ainda mais as negociações sobre o programa nuclear. "O Majlis tem muito pouco poder em relação à política externa. Mas, se Khamenei centralizar o poder em torno de seu grupo, é possível que o diálogo com o Ocidente siga estancado", afirma Luciano Zaccara, diretor do Observatório Eleitoral de Países Árabes e Islâmicos. "Nos últimos anos, foi justamente Ahmadinejad quem deu mostras de que deseja negociar com os Estados Unidos, algo a que o líder supremo se opõe", lembra o especialista.

Antes de a campanha começar, o Conselho de Guardiões, que supervisiona os processos eleitorais e legislativos, vetou candidatos mais críticos ao regime e ao governo. A medida atingiu principalmente a facção reformista do regime, que defende mudanças em alguns aspectos da Constituição e optou por boicotar o pleito. Dois de seus principais expoentes, Mir Hossein Mousavi e Mehdi Karrubi, ambos derrotados por Ahmadinejad na eleição presidencial de 2009 — sob denúncias de fraude generalizada —, estão sob prisão domiciliar. Outra razão para um alto índice de abstenção é que os iranianos estão mais preocupados com a economia do que com os rumos políticos do país.

Convocação É possível, no entanto, que o governo acabe pressionando os cidadãos a votarem. "Acho que o líder supremo e muitos conservadores da Guarda Revolucionária instaram a população a ir às urnas", opina a iraniana Haleh Esfandiari, radicada nos EUA e diretora do programa para o Oriente Médio no Woodrow Wilson International Center for Scholars. Na quarta-feira, o ministro do Interior iraniano, Mostafa Najar, afirmou à imprensa que as eleições parlamentares seriam "gloriosas", com alto comparecimento da população. Para Haleh Esfandiari, mesmo que isso não ocorra, o regime islâmico vai mascarar dados para dizer que a eleição foi um sucesso. "Se eles precisarem, vão aumentar os números e divulgar que 60% dos eleitores participaram", disse ela, em entrevista ao Correio. O novo parlamento deve assumir após 21 de março, quando se comemora o ano-novo persa.