Correio braziliense, n. 20045, 08/04/2018. Política, p. 4
Grupos rivais cercam sede da Polícia Federal
Leonardo Cavalcanti
08/04/2018
UM PAÍS SOB TENSÃO » Rua da diretoria da PF em Curitiba é ocupada por militantes contrários à prisão do ex-presidente e outros que apoiam o encarceramento
Curitiba — Aos poucos, como numa montagem de uma cidadezinha de brinquedo, a área envolta do prédio cinza e preto da diretoria da Polícia Federal foi sendo ocupada. No início da manhã, por volta das 9h, apenas alguns curiosos passeavam tranquilos pelas ruas calmas do simpático bairro Jardim Santa Cândida, na capital paranaense. Apenas jornalistas, cerca de 50 naquele momento, circulavam na frente do portão de ferro do imóvel da PF. Com o passar das horas, porém, o cenário foi ganhando vida.
Às 11h30, o grupo de vermelho, formado por cerca de 100 pessoas contrárias à prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conseguiu ocupar os 150m da pista em frente ao prédio da Polícia Federal. Os poucos manifestantes vestidos de amarelo, entretanto, não se intimidavam e passavam no meio das fileiras vermelhas. Alguns xingamentos, cerca-cerca, começaram a preocupar os mais conscientes. Um ou outro carro da Polícia Militar passava. Às 13h, quatro minutos de encerrado o discurso de Lula, em São Bernardo do Campo (SP), o movimento já era intenso com mais de 200 pessoas.
As provocações começaram a ser maiores e a PM decidiu primeiro isolar a área, depois separar os manifestantes. Como o grupo de vermelho chegou primeiro, e estava em maior número, algo em torno de 400 pessoas, conseguiu manter a ocupação na frente do prédio principal da Polícia Federal. Os amarelos foram deslocados para 30m ladeira abaixo e, até às 17h, ainda eram poucos, não mais do que 100 — ficaram no portão lateral e, ali, fincaram bandeiras do Brasil. Enquanto isso, barracas de sindicatos foram montadas e um caminhão descarregou banheiros químicos para o pessoal.
Comunismo
A administradora Roberta Gomes Mola, 40 anos, se vestiu da cabeça aos pés de verde e amarelo e foi defender a prisão de Lula. “A minha luta é contra o comunismo”, disse ela. Mas o PT implantou o comunismo no Brasil? “Iriam fazer igual à Venezuela. Não aguentamos mais tanta corrupção”, afirmou, apontando Adolf Hitler como um dos maiores comunistas da história mundial. Moradora de Curitiba, ela se disse eleitora do deputado Jair Bolsonaro.
Do outro lado do cordão de isolamento da PM, a socióloga Silmara Quintino disse que foi até a frente da Polícia Federal para contestar o absurdo da prisão de Lula. “Tudo sem provas, algo nunca visto na história política brasileira. Não sou filiada ao PT, mas é impossível ficar em casa sem fazer nada”, disse ela, que prometeu só ir embora depois da chegada de Lula ao Departamento de Polícia Federal.
Enquanto os vizinhos do prédio da PF pareciam resignados com o barulho e faziam apostas sobre a vinda ou não de Lula, a professora de matemática Claudia Santos — que abriu a casa de dois andares para as equipes de TV fazerem as transmissões ao vivo — resolveu fazer sanduíches e sucos para vender e cobrar pelo uso do banheiro. “A nossa intenção é ajudar. Sabemos do momento histórico por que o país passa, assim, permitimos que as pessoas usassem o banheiro, mas ontem a caixa d’água esvaziou e não tivemos escolha a não ser cobrar R$ 2 pelo uso”, ressaltou ela, que garante não ter preferências políticas.
Com o isolamento dos grupos pela polícia, a casa de Claudia ficou na área do pessoal das camisas vermelhas. Deram sorte, pois, do outro lado, nenhum morador se dispôs a fazer lanches para vender. Antes das 17h, os sanduíches e os sucos vendidos pela professora tinham acabado. Mas já não era problema. Donos de quiosques e ambulantes começaram a vender churrasco, água, refrigerante e até cerveja.