O Estado de São Paulo, n. 45371, 06/01/2018. Economia, p.B4

 

 

 

 

 

 

Meirelles admite mudar 'regra de ouro'

Ministro defende sistema 'autoaplicável',mas mudança seria apenas para 2019

Por: Adriana Fernandes

 

Adriana Fernandes / BRASÍLIA

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que a flexibilização da chamada “regra de ouro” é fundamental para a governabilidade do País. Ao contrário de uma suspensão temporária da regra, Meirelles defende a adoção de um sistema de regras autoaplicáveis para ser acionado em caso de violação da trava fiscal que impede a emissão de dívida para o pagamento de despesas correntes.

Esse sistema, na prática, funciona com a adoção de contrapartidas, a serem lançadas no ano seguinte ao descumprimento da regra de ouro. Um modelo parecido ao que está previsto na emenda do teto de gasto (regra que impede que o crescimento das despesas seja superior à inflação).

Entre as contrapartidas, segundo Meirelles, estão a proibição de aumento das despesas discricionárias (que não são obrigatórias), novos subsídios, congelamento de vagas no servi- ço público e dos salários dos servidores. Para o ministro, esse modelo é melhor do que simplesmente a ameaça de punição das autoridades, principalmente, num cenário de forte aumento das despesas obrigatórias.

A regra de ouro está prevista na Constituição e é um dos pilares para o equilíbrio das contas públicas. Ela impede a emissão de dívida pelo governo para o pagamento de despesas correntes, como salários e conta de luz, por exemplo. O ministro disse que na sua visão esse modelo é melhor do que simplesmente suspender temporariamente a regra, como está sendo proposta pela Câmara dos Deputados. Ele negou que a mudança esteja sendo feita para 2018.

Para ele, o aspecto mais importante desse debate é que a regra será cumprida em 2018. Segundo ele, o BNDES vai fazer ao longo do ano o pagamento antecipado de R$ 130 bilhões de empréstimos feitos pelo Tesouro Nacional. Esse dinheiro vai ajudar o cumprimento da meta, além da retomada do pagamento da dívida dos Estados com a União e a rentabilidade da conta única. “A decisão que se coloca não é para esse governo. É para 2019. Estamos totalmente preparados e confortáveis para cumprir a regra de ouro”, disse.

Sem dinheiro. Para o presidente do Insper, Marcos Lisboa, a discussão pelo governo da mudança da regra de ouro mostra que finalmente a “ficha caiu” para a situação insustentável de desequilíbrio das contas do governo e descontrole da dívida publica. “O dinheiro acabou”, diz o economista, que foi secretário de Política Econômica. Para Lisboa, é surpreendente que só agora o assunto está sendo discutido, principalmente, porque as despesas obrigatórias (como o pagamento de salários e aposentadoria) já são maiores dos que as receitas do governo. Ele vê com grande preocupação a trajetória das contas públicas. “O Brasil poder virar um grande Rio de Janeiro”, afirmou.

O economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Manoel Pires, afirmou que é importante ajustar uma regra que não tem dado resultado. “Acho bom mudar. Essa regra não era boa”, disse. Na sua avaliação, em tese, ela deveria proteger os investimentos. Mas na prática, eles têm sido muito baixos. “Quando a dívida cresce, a regra não oferece instrumentos de con- trole do endividamento”, afirmou. Ele acrescentou que as regras fiscais podem e devem ser aperfeiçoadas quando os seus objetivos não estão sendo alcançados ou quando os objetivos também mudam em função das circunstâncias da economia.

O diretor do BNDES, Carlos Thadeu de Freitas, disse que o banco está pronto para fazer o pré-pagamento em 2018. Só não pode perder os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), responsável pelo pagamento do abono salarial e do seguro-desemprego.

 

 

 

 

 

Temer articula derrubar o próprio veto ao Refis do Simples, diz Afif

Presidente do Sebrae costurou o acordo para que o Congresso Nacional derrube o veto ao parcelamento
Por: MARCELO OSAKABE E A.F.

O presidente Michel Temer vetou integralmente o programa de parcelamento de débitos para pequenas e médias empresas, mas, segundo o presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, já está costurando um acordo com a base do governo no Congresso para derrubar o seu próprio veto ao Refis.

O presidente se comprometeu com representantes do setor a cobrar da equipe econômica um cálculo efetivo da perda de receitas com o parcelamento das dívidas dos micro e pequenos empresários.

O Sebrae vai contratar a Fundação Getúlio Vargas (FGV) pa- ra um fazer um cálculo paralelo. Foi a solução encontrada pelo presidente para não provocar uma crise com o setor, que tem forte poder de pressão nas bancadas de todos os partidos no Congresso. Para os empresários, o presidente caiu numa “casca de banana” dos técnicos da área econômica ao vetar o Refis com o argumento de que po- deria cometer crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal porque a renúncia com o programa não está prevista no programa.

Se fosse sancionado, perdão da dívida dos pequenos negócios causaria um impacto de R$ 7,8 bilhões nos cofres públicos nos próximos 15 anos, duração do parcelamento proposta.

“A Fazenda é que deveria ter feito o cálculo. Não fez porque não gosta do Simples”, criticou o presidente do Sebrae, que costurou o acordo com Temer para derrubar o veto. Segundo Afif, que se encontrou por cerca de 40 minutos com o emedebista no escritório, o veto ao Refis não aconteceu por questões políticas, mas “técnicas e econômicas”: “Não houve a previsão das perdas e caberia ao Executivo fazer essa previsão.”

Acordo. “Então na segunda-feira, o presidente vai chamar o ministro da Fazenda e estudar o impacto das perdas para negociar com o Congresso a derrubada do veto de comum acordo, mas já devidamente resolvido o problema do impacto econômico”, disse. Afif lembrou que o Refis foi aprovado de forma unânime pelo Congresso e que salientou que o desejo do presidente é aprovar a medida.

A informação de que Temer vetaria o projeto foi antecipada pelo Estadão/Broadcast no início desta semana. O Refis para micro e pequenas empresas – já contempladas com um sistema diferenciado de tributação, o Simples Nacional – foi aprovado pelo Congresso em meio às negociações para a aprovação a Reforma da Previdência. Por isso, a dificuldade do presidente em vetar a proposta nesse momento em que busca apoio para conseguir aprovação da proposta em fevereiro. O acordo com o Congresso previa que não haveria vetos à proposta.

Segundo o projeto, para aderir ao parcelamento essas empresas teriam de pagar entrada de 5% do valor da dívida, que poderia ser dividida em até cinco parcelas consecutivas. O saldo restante após a entrada poderia ser pago de três formas diferentes: à vista, com desconto de 90% em juros e 70% em multa; parcelado em 145 meses, com abatimentos de 80% e 50%, respectivamente; e em 175 meses, de 50% e 25%. O prazo de adesão será de 90 dias, contados da data de publicação da lei. / MARCELO OSAKABE E A.F.