O globo, n. 30810, 14/12/2017. País, p. 6

 

Turma do TRF-4 que vai julgar Lula é tida como ‘linha-dura’

Tiago Dantas

14/12/2017

 

 

 

Os três desembargadores muitas vezes aumentaram as penas dadas por Sergio Moro a réus da Lava-Jato

-SÃO PAULO- Em 24 de janeiro, o processo que avalia se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu um tríplex no Guarujá da construtora OAS será julgado pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), corte responsável por analisar, em segunda instância, as decisões do juiz Sergio Moro na Lava-Jato. Tida como linha-dura, a turma que selará o futuro eleitoral do petista é formada pelos desembargadores João Pedro Gebran Neto (relator), Leandro Paulsen (revisor) e Victor Luiz dos Santos Laus. Embora tenha formações diferentes, o trio é descrito como “alinhado”. Muitas vezes, o colegiado aumenta as penas dadas por Moro. Em 98 decisões analisadas pelo GLOBO, o tempo de prisão aumentou para 31 réus e diminuiu para 14.

Relator das ações, Gebran é juiz desde 1993 e fez mestrado em Direito Constitucional. Sua relação de amizade com Moro chegou a ser questionada por advogados. Revisor da turma, Paulsen é considerado um prodígio da magistratura por ter ingressado na carreira aos 23 anos e ter trabalhado como auxiliar da ministra Ellen Gracie, no Supremo Tribunal Federal (STF). Ao longo da carreira, Paulsen lançou 11 livros sobre Direito Tributário. Completa a turma o desembargador Laus, que fez carreira como promotor.

Advogados e fontes consultadas pelo GLOBO avaliam que a composição da 8ª Turma é “qualificada”, “rigorosa” e com perfil distante da tradição garantista:

— São desembargadores técnicos. As decisões são duras, sobretudo no âmbito da Lava-Jato. Contudo, a 8ª Turma já tinha o histórico de ser especialmente dura no julgamento de crimes de colarinho branco — afirma o diretor do curso de Direito da Unisinos, Miguel Wedy.

O advogado criminal Carlos Eduardo Scheid, que não representa nenhum réu envolvido na Lava-Jato, faz coro:

— A 8ª Turma é de uma escola que entende que o estado é hipossuficiente para combater crimes econômicos. O combate efetivo só se daria com alguma flexibilidade das garantias constitucionais.

De acordo com fontes que acompanham o andamento dos processos no tribunal, Gebran, 52 anos, nascido em Curitiba e com carreira na Justiça federal, é o mais “Morista” dos desembargadores e seus votos costumam acompanhar as sentenças do juiz da Lava-Jato, inclusive aplicando penas mais duras contra os réus.

Paulsen, que é revisor dos votos, é descrito como o mais influente entre os desembargadores. Nas duas ocasiões em que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari foi absolvido pela corte, Paulsen divergiu de Gebran e foi seguido por Laus. Natural de Porto Alegre, Paulsen começou a carreira na magistratura federal aos 23 anos, logo após se formar em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul .

Mais experiente da 8ª Turma, Victor Laus, 54 anos, está desde 2003 no TRF-4. Ele foi escolhido pelo quinto constitucional, vagas em tribunais destinadas a membros do Ministério Público. Nascido em Joaçaba (SC), é formado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

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Lula poderá ser candidato mesmo condenado?

14/12/2017

 

 

SILVANA BATINI

PROFESSORA DE DIREITO PENAL E ELEITORAL FGV-RIO

“Isso pode acontecer se ele obtiver liminar no STJ suspendendo eventual inelegibilidade por condenação no TRF-4. A Lei da Ficha Limpa diz que a decisão colegiada só pode ser suspensa por uma liminar também colegiada. Mas, nos últimos anos, o TSE vem decidindo que a inelegibilidade decorrente de decisão colegiada pode ser suspensa por liminar monocrática. Uma jurisprudência que acabou por desnaturar o espírito da Lei da Ficha Limpa. Não digo que isso vá acontecer. Mas é um caminho possível”.

CARLOS GONÇALVES JR.

PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCIONAL DA PUC-S

“Cabem recursos ao STJ e ao STF. Agora, há um ponto importante de se ressaltar. A inelegibilidade não vai ser declarada no contexto do processo penal. A inelegibilidade vai ser declarada apenas no processo eleitoral, no procedimento de registro de candidatura. Então, mesmo que Lula esteja inelegível, isso não o impede de solicitar o registro de candidatura. E a lei eleitoral diz que com a solicitação do pedido de candidatura, o candidato está autorizado a realizar atos de campanha até o trânsito em julgado”.

MARCELO FERREIRA

ESPECIALISTA EM DIREITO ELEITORAL, UFSC

“Sim, é possível. Até o julgamento final do registro de candidatura, ele ficará com o registro sub judice, mas poderá praticar todos os atos de campanha. Não há inelegibilidade automática do Lula em caso de condenação pelo TRF-4, porque a candidatura não existe, ela é constituída perante o juiz eleitoral. Quem vai definir se ele é elegível ou não é o juiz eleitoral. O juiz eleitoral pode, de ofício, dar a inelegibilidade. Mas, via de regra, ele precisa ser provocado para isso, pelo Ministério Público ou outro interessado”.