O globo, n. 30799, 03/12/2017. Economia, p. 36

 

Proposta de reforma quer trocar dez impostos por apenas dois

Bárbara Nascimento e Cássia Almeida

03/12/2017

 

 

Especialista, porém, critica período de transição de cinco anos

A simplificação do complexo sistema tributário brasileiro é exatamente o objetivo de uma proposta que já está no Congresso. O principal alvo são os impostos que incidem sobre o consumo. Pela proposta, cujo relator é o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), dez impostos deixariam de existir: IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins, Salário-Educação, Cide (que incide sobre os combustíveis), ICMS (estadual) e ISS (municipal). No lugar destes, haveria apenas dois tributos, o Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo (IS). O IS incidiria sobre itens específicos, como petróleo e derivados, combustíveis e lubrificantes, cigarros, energia elétrica, serviços de telecomunicações, bebidas alcoólicas e não alcoólicas, veículos, pneus, partes e peças. Já o IBS incidiria sobre os demais.

 

NO CANADÁ, SISTEMA DUPLO

A proposta ainda leva a CSLL, que incide sobre o lucro líquido das empresas, para dentro do Imposto de Renda, o que acarretaria em um aumento de alíquotas para as pessoas jurídicas. E passa para a União a responsabilidade de arrecadar o ITCMD, o imposto sobre heranças, apesar de toda a arrecadação continuar destinada aos municípios. Para Hauly, isso seria necessário porque grandes patrimônios estão espalhados por vários municípios, então, seria mais consistente aplicar um tributo nacional. Além disso, a União tem mais condições para fiscalizar possíveis sonegações. O IPVA, de veículos, continuaria na órbita estadual, mas também seria direcionado às prefeituras. A votação dessa reforma tributária está parada, à espera de uma definição sobre as mudanças nas regras da Previdências. As negociações, no entanto, continuam ativas. Hauly afirma já ter tido mais de 170 reuniões com o governo e diversos setores da economia. Ele admite que estão em andamento alguns ajustes técnicos à minuta, que foi apresentada em agosto. O relator garante que as alterações não mudam a essência do texto divulgado. Entre as mudanças está, por exemplo, a permissão para que empresas abatam do IS créditos de tributos pagos sobre o consumo de energia elétrica. — Assim, o Imposto Seletivo atende os dois lados. Da forma como estava na minuta, o setor industrial não podia creditar o consumo de energia — explica o deputado. Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, vê com bons olhos a proposta, mas critica o período de transição previsto para a reforma entrar em vigor: cinco anos. — É uma transição muito abrupta. É necessário um período de teste do novo imposto. A transição pode levar um investimento a tornar-se não competitivo do dia para a noite. O ideal é reduzir progressivamente a estrutura anterior e ir aumentando o novo imposto gradativamente. Assim, consegue-se manter a carga tributária constante — afirma Appy. A advogada tributarista e professora da FGV Direito Rio Melina Lukic está no Canadá, estudando o sistema tributário do país. Lá, conta, o sistema é dual. Houve unificação dos impostos em cada esfera de governo, criando-se um só sobre valor agregado e outro que reúne os tributos federais. — Desde a Constituição de 1988, a cada dez anos, tenta-se unificar os impostos federais e estaduais e nunca se consegue, devido à resistência dos estados em abrir mão de sua competência para legislar na área. O que propomos é começar logo pela unificação dos federais. Já seria um enorme avanço — afirma Melina.

LISBOA SUGERE POUCAS EXCEÇÕES

Para o presidente do Insper, Marcos Lisboa, qualquer reforma tributária tem que estabelecer um sistema tributário igual para todos, no qual as alíquotas incidam sobre a receita (menos salário), juros e lucro: — Tem que ter uma alíquota igual para todo mundo, com algumas poucas exceções, umas três ou quatro, no máximo. E o imposto deve ser cobrado no destino (no local onde o produto é consumido). É isso que manda a boa tributação. Não podemos nos desviar do sistema tributário dos países desenvolvidos. A proposta de Hauly ainda tem que passar por um processo de negociação com a equipe econômica do governo. O deputado aguarda uma contraproposta do Ministério da Fazenda. Ele espera levar o texto a plenário no primeiro semestre do ano que vem: — Até lá, já deve ter se resolvido a questão da Previdência e abre espaço para a gente. Deve ser a matéria do primeiro semestre de 2018. O deputado deixou de fora mudanças no financiamento da Previdência Social. Segundo afirmou na justificativa do projeto, houve a intenção de reformular esse ponto, com a criação de uma contribuição semelhante à CPMF, que incide sobre movimentação ou transmissão de valores. Diante da enorme resistência, no entanto, esse ponto foi deixado de lado.

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Benefício na forma de financiamento

03/12/2017

 

 

Programa dá desconto conforme investimento da empresa

O Programa Produzir, do Estado de Goiás, atrai empresas com uma engenharia fiscal que reduz a alíquota de ICMS cobrada de companhias que decidirem investir no estado. A empresa pode financiar 73% do imposto devido, ao juro de 0,2% ao mês, e ainda terá 12 meses de carência para pagar o principal do financiamento, podendo ter um desconto de até 100% do valor devido: — Na essência, a empresa só paga alíquota de 3,2% de ICMS, mais o juro de 0,2% ao mês sobre o restante, sendo que o principal que não foi pago é liberado após 12 meses. No final, foi a mesma coisa que cobrar alíquota de 3% de ICMS, o que não é permitido pela Constituição — diz Paulo Henrique Pêgas, do IBMEC-RJ. Segundo o superintendente executivo da Receita de Goiás, Adonídio Vieira Neto, o programa, criado em 2000, impõe metas para as empresas obterem o desconto, como gerar empregos. Mais da metade das empresas consegue desconto de 100%; o restante, de 30% a 90%. Vieira Neto reconhece que é um benefício fiscal, mas que todos os estados oferecem algum tipo de isenção, o que obriga Goiás a ter um programa para atrair empresas. Para regularizar a situação desses programas, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) vai se reunir no dia 15, em Vitória, para validar práticas não aprovadas pelo Confaz: — É um benefício, mas não há qualquer política nacional para incentivar empresas para vir para o Norte e o Centro-Oeste do Brasil, essa política fez desenvolver a região. Segundo Vieira Neto, pelo acordo que deve se validado no Confaz, os governos se comprometem a reduzir gradativamente a isenção. — Para indústria, por exemplo, o compromisso é que o benefício acabe em 15 anos. Outra estratégia dos governos para fugir das regras de limitação de benefícios, como a alíquota mínima de 2% de ICMS, é reduzir a base de cálculo sobre a qual incide o imposto. (Cássia Almeida)