Correio braziliense, n. 20057, 20/04/2018. Política, p. 2

 

Mistério de Barbosa frustra caciques do PSB

Rodolfo Costa e Bernardo Bittar

20/04/2018

 

 

UM PAÍS SOB TENSÃO » Ex-presidente do STF reluta em admitir candidatura ao Palácio do Planalto e expõe divisão interna do partido, a partir de estratégias distintas entre a direção da legenda e os governadores. Magistrado mostrou força na pesquisa de intenção de votos

O lançamento da pré-candidatura de Joaquim Barbosa será mais turbulento do que o previsto. O presidente do partido, Carlos Siqueira, acredita que o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) tenha o perfil necessário para unificar partidos e setores da sociedade. Mas o martelo ainda não foi batido. Na cúpula da legenda, não há unanimidade. Os governadores de São Paulo, Márcio França, de Pernambuco, Paulo Câmara, e da Paraíba, Ricardo Coutinho, não mostram sinais de que apoiarão o ministro aposentado. O perfil mais fechado do magistrado e a busca dos comandantes estaduais por apoio do PSDB, em São Paulo, e do PT, no Nordeste, colocam em xeque a chancela dos caciques. Barbosa, entretanto, mostrou força na última pesquisa Datafolha, chegando até a 10% das intenções de voto, a depender do cenário.
 
Ciente das resistências, nem mesmo Barbosa cravou a própria candidatura ontem, após a primeira reunião da comissão eleitoral do PSB. Nomes da cúpula do partido estiveram presentes ao encontro. Além do próprio ministro aposentado, de Siqueira, França, Câmara e Coutinho, participaram: o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg; o prefeito do Recife, Geraldo Júlio; os líderes da legenda na Câmara dos Deputados, Júlio Delgado (MG), e no Senado, Antônio Carlos Valadares (SE); além do secretário-geral, Renato Casagrande, e do vice-presidente de Relações Governamentais, Beto Albuquerque.
 
O anticlímax após o encerramento da reunião mostrou um Barbosa incerto em relação ao futuro na legenda. Disse não conhecer ainda o partido e declarou que o PSB pode “inclusive optar por escolher outro nome entre filiados”. Discurso que contrasta com a expectativa da ala favorável à pré-candidatura dele. “Há dificuldades dos dois lados. O partido tem sua história, suas dificuldades regionais. Do meu lado, tenho minhas dificuldades de ordem pessoal”, afirmou. Um dos motivos justificados por ele é a família. “Ela não é a favor.”
 
As declarações de Barbosa colocam em banho-maria as pretensões do PSB em alçar voos mais altos no cenário eleitoral. Os defensores da pré-candidatura do ex-presidente do STF têm a convicção de que ele é o nome certo para ocupar um vazio ainda existente em meio à fragmentação da esquerda e do centro. Há uma expectativa de que ele possa conquistar votos não apenas de ambos os espectros econômicos, como, também, de eleitores da direita.
 
O partido, no entanto, não desistirá da pré-candidatura de Barbosa. Mas será necessária uma ampla articulação interna para convencer, sobretudo, governadores como França. Para o gestor de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, é um nome mais “maduro” para disputar a Presidência da República. “Do meu ponto de vista, a opção do Alckmin é a mais madura que existe para o Brasil”, declarou, ao sair da reunião.
 
A declaração de França deixa nítida as incertezas do governador quanto à viabilidade eleitoral de Barbosa. Vice durante a gestão de Alckmin, ele espera obter apoio do tucano nas eleições estaduais, e, por isso, adota um distanciamento momentâneo em relação à pré-candidatura do recém-correligionário. Além disso, há no partido até quem veja o ministro aposentado como individualista e arrogante. Um temperamento que requer atenção, pois ele precisará de palanque nos estados para estruturar a campanha.
 
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O PSB já começa a estudar como trabalhar a imagem do novo filiado. A fama de ser rígido e de poucas palavras é a tônica de quem trabalhou com ele nos 11 anos em que ocupou gabinetes nos anexos e a sala da Presidência na Suprema Corte. Evitava até cumprimentar outras pessoas, conta um ex-assessor. “Ele sempre foi lacônico. Jamais fazia brincadeiras e tentava não se envolver com aquilo que não fosse de sua atribuição. Chegou a ser tachado de grosseiro por nunca receber ninguém”, afirmou.

Para o ex-assessor, o temperamento do magistrado pode ser entrave para os palanques estaduais. “Tem muita coisa que ele simplesmente não topa fazer. Uma delas foi colocar a pré-candidatura numa hora em que havia discussão importante no Supremo, como a prisão após condenação em segunda instância, e ele não quis se envolver. É esse tipo de coisa que pode trazer dificuldades aos aliados”, disse.
 
Plano A

Para Coutinho, o gênio forte de Barbosa não é um problema. “Dizem isso de mim, e eu não sei se é verdade não”, ironizou. O governador da Paraíba, no entanto, não se mostrou propenso a apoiar o ex-magistrado. “Não tenho opinião formada, até porque nem o próprio ministro se disse disposto a, vamos dizer, fazer uma caminhada pelo Brasil defendendo sua postulação”, declarou.

O presidente do PSB evitou falar em plano B caso Barbosa não aceite disputar as eleições, e diminui a divisão interna no partido. “Apostamos na aceitação. E não concordo que há tanta divergência assim. Há cuidados, interrogações. Mas divergências, não. Ninguém disse que não concorda com a candidatura”, destacou Siqueira. Ele enfatizou, também, que as coligações regionais raramente dependem de uma decisão nacional. E negou quaisquer chances de ele ser vice em alguma chapa. “Quem tiver esperança disso pode se desfazer dela, pois não queremos”, afirmou.