Correio braziliense, n. 20064, 27/04/2018. Brasil, p. 6

 

Brasília cresce em ritmo acelerado

Otávio Augusto e Bruno Santa Rita

27/04/2018

 

 

SOCIEDADE » Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua, do IBGE, mostram que o Distrito Federal teve o maior aumento populacional do país entre 2012 e 2017: 11,4%. Hoje, são mais de 3 milhões de pessoas que moram no quadrilátero

Quando Brasília assumiu o posto de capital federal, há 58 anos, acreditava-se que ela não teria mais que meio milhão de habitantes. A teoria ficou no passado. Hoje, 3.036.006 pessoas vivem na cidade: a terceira maior, atrás somente de São Paulo e Rio de Janeiro. A marca é emblemática. Salvador, que tem 469 anos, ficou para trás, com 2,9 milhões de moradores. Entre 2012 e 2017, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad), o Distrito Federal foi a unidade da Federação com o maior crescimento populacional: 11,4%.  Logo atrás no ranking aparecem Amapá (com 11,1%), Roraima (9,3%) e Acre (9%).

A análise do levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), espécie de atlas das características socioeconômicas da sociedade, divulgado ontem, mostra que a população da capital federal cresce mais rapidamente que a do Brasil. A média da cidade é de 2,1% ao ano, enquanto o país aumenta 0,8%. O número de habitantes no DF saltou em mais de 60 mil em comparação com os 2.973.209 de 2016. Ao todo, somos 207 milhões de brasileiros.

O índice populacional do DF é encorpado por dois fatores: nascimentos, já que a população tem forte presença de jovens, e migração, quando pessoas de outros estados vêm ao Planalto Central em busca de emprego, qualidade de vida e estudo. Diferentemente de outras capitais, Brasília está se expandindo internamente, segundo especialistas. As outras cidades não têm áreas disponíveis. O DF ganha mais população do que perde. Ou seja, a soma dos nascimentos, dos migrantes, das mortes e do êxodo é positiva para o crescimento populacional.

A gerente da Pnad, a analista do IBGE Maria Lúcia Vieira, explica que a tendência de crescimento do Distrito Federal é a mesma desde 2012. “As pessoas chegam em busca de mercado de trabalho, rendimento e oportunidade. As características da cidade, como renda e qualidade de vida, atraem moradores de outros lugares”, detalha. As faixas etárias que mais cresceram foi a de pessoas com 18 e 19 anos (21,2%), a de 60 anos ou mais (12,6%) e daqueles entre 14 e 17 anos. A única unidade da Federação que se aproxima do crescimento do DF é o Amapá. Lá, onde vivem 797.722 pessoas, a população é encorpada em 2% ao ano. “O Norte crescer é esperado por conta da taxa de fecundidade, ou seja, número de nascimentos”, conclui.

A diretora de Estudos e Políticas Sociais da Companhia de Planejamento (Codeplan), Ana Maria Nogales, explica que a população ainda está crescendo, mas num ritmo mais lento, como toda a população brasileira. “Tivemos uma redução do fluxo migratório. O DF é uma unidade da Federação que atrai imigrantes, sobretudo jovens, mas, ao mesmo tempo, temos pessoas deixando a cidade por conta da economia centrada no serviço público. Outro aspecto é que, como a população ainda é jovem, ela se reproduz. Ainda é importante o número de nascimentos”, avalia. Ela ressalta que as mulheres do DF estão tendo filhos cada vez mais tarde e em número menor.

O crescimento da cidade é acelerado, mas, ainda assim, está dentro do esperado. Brasília deu sinais de que sua população estava aumentando já no começo da década de 1980, quando o IBGE registrou o primeiro milhão de habitantes. Mais de 20 anos depois, o segundo milhão estava completo, no ano 2000. Levaram outros 16 anos para a cidade contabilizar o terceiro milhão, em agosto de 2017.

Mudança de planos

O estudante universitário Thales Augusto Borborema, 23 anos, deixou Goiânia, distante 207km de Brasília, em busca de estudo no DF. Em 2015, ele decidiu que o curso de engenharia da computação não lhe agradava mais. Como sua mãe e seu irmão já moravam na cidade, ele só fez as malas e preparou a mudança. “A minha família já estava aqui e ficava mais caro me sustentar lá em Goiânia”, explica o agora estudante de jornalismo. Hoje, ele vive na Asa Norte em um apartamento de dois quartos. Estuda na capital, mas conta com a ajuda da mãe, da avó e do padrasto para pagar o aluguel.

Para Ana Maria, chegou o momento de se pensar políticas públicas para uma cidade em movimento. “Estamos num processo de envelhecimento muito acentuado. Temos que pensar numa cidade acolhedora para a população idosa, isso sem ter resolvido os problemas dos jovens. Temos que ter educação e saúde para o jovem ter uma profissão e trabalho”, destaca. Ela emenda. “Precisamos de uma maior integração socioterritorial,  com mais ofertas habitacionais no centro para a população de renda média. Quando as pessoas moram perto do trabalho,  melhora a qualidade de vida e reduz gastos com deslocamento”, conclui.

Frase

“O DF é uma unidade da Federação que atrai imigrantes, sobretudo jovens, mas, ao mesmo tempo, temos pessoas deixando a cidade por conta da economia centrada no serviço público”

Ana Maria Nogales, diretora de Estudos e Políticas Sociais da Codeplan

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Mais pessoas se autodeclaram negras

27/04/2018

 

 

“Isso é aceitação.” A frase é da professora de educação física Fernanda Trajano dos Santos, 26 anos. Ela se autodeclara negra. Junto dela, tem outros 17,8 milhões de pessoas, segundo a Pnad. O número de brasileiros que se declaram negros subiu 6% entre 2016 e 2017. O aumento vem sendo observado desde 2015, quando os brancos deixaram de ser maioria no Brasil. O número de cidadãos que se consideram pardos também aumentou. A alta foi de 1%, totalizando 96,9 milhões. Já o número de brancos caiu 0,6%, para 90,379 milhões. Comparando com o início da realização da pesquisa, em 2012, os autodeclarados pretos cresceram 21,8%. Já o total de pardos aumentou 7,7%, e o de brancos caiu 2,4%.

Nem sempre se assumir negro ou pardo foi fácil. Vítimas de preconceito e discriminação, muitos preferiram um dia mascarar a raça. Fernanda explica o que está ocorrendo. “Isso significa um maior grau de conscientização. Estamos reconhecendo que somos negros”, argumenta. Ela acredita que sempre existirá preconceito contra os negros, porém de forma mais branda. “Temos novas leis, as próprias faculdades estão se politizando para o assunto”, comemora. No DF, 61% das pessoas se declaram negras ou pardas.

Antônio de Pádua, presidente da Rede Urbana de Ações Socioculturais (Ruas), entidade que trabalha questões do movimento negro e de periferias, acredita que a busca por direitos e autoafirmação faz com que mais pessoas se identifiquem como negras. “A militância dos movimentos sociais têm influenciado esse aumento. A difusão da cultura negra na sociedade também colabora, e o jovem tem carregado isso com mais força”, explica.

Para ele, o preconceito é impulsionado pelo coletivo. “Quando se cria um padrão de cabelo, roupa e comportamento, a sociedade automaticamente tem uma reação de renegar o diferente. O mercado do marketing é responsável por isso. É raro ver um modelo negro liderando uma campanha publicitária. Na televisão, não temos artistas negros nem professores negros na universidade”, destaca.

Idosos

A população idosa brasileira cresceu a uma média de 1 milhão por ano de 2012 a 2017. Nos últimos cinco anos, a população com 60 anos ou mais subiu de 25,4 milhões para 30,2 milhões — alta de 18,8%. A maior concentração de idosos foi registrada das regiões Sul e Sudeste, com 16,5% e 16%, respectivamente. No Brasil, essa faixa etária representa 14,6%. As regiões com menor percentual de idosos são o Norte (9,7%) e o Centro-Oeste (12,7%). O Nordeste registrou 13,6% de habitantes acima de 60 anos, de acordo com a pesquisa.

Na capital federal, o número de habitantes com 60 anos ou mais, que estava em declínio desde 2015, voltou a aumentar, chegando a 12% de crescimento. A analista do IBGE Maria Lúcia Vieira, gerente da Pnad, classifica a estatística como “esperada”. “É um fenômeno que está acontecendo no mundo todo. Está havendo o aumento da expectativa de vida, e as pessoas não estão nascendo”, explica.

Para a costureira Maria José de Melo, 65 anos, os investimentos em políticas públicas, como no transporte, precisam aumentar. “Não há uma organização nos ônibus para abrigar os idosos com responsabilidade. Ficamos todos amontoados sem passar a catraca”, reclama. Ela conta que pega ônibus da Asa Sul para a Asa Norte e sempre se depara com essa situação. “A cidade não está preparada para lidar com o aumento do número de idosos”, pondera. (OA e BSR)