O globo, n. 30880, 22/02/2018. País, p. 3

 

Candidatura em construção

Débora Bergamasco e Karla Gamba 

22/02/2018

 

 

Temer lança campanha publicitária para defender intervenção e pede agenda positiva a ministros

-BRASÍLIA- Enquanto tenta despistar suas intenções de vir a disputar a reeleição, o presidente Michel Temer começa a fazer movimentos na construção de sua candidatura com ações típicas de quem terá o nome nas urnas em outubro. O Palácio do Planalto está pedindo a todos os ministérios uma relação completa de realizações, possíveis inaugurações e anúncios de balanços positivos para que o presidente possa “faturar” com as ações. O governo iniciou também uma campanha publicitária para dizer que “vai tirar o Rio de Janeiro das mãos da violência”, embora a intervenção federal na Segurança Pública do estado mal tenha começado.

Após reunião da Executiva do PMDB que o reconduziu ontem à presidência do partido, Romero Jucá deixou a discrição de lado e afirmou que Temer é um nome para a eleição presidencial:

— Temer é uma opção do PMDB, se ele assim o entender. O partido defende candidatura própria. Agora, se será ou não Temer, o tempo e a própria decisão dele vão definir.

De acordo com aliados, Temer vem notando que muitos ministros fazem agendas próprias ou voltadas apenas para os seus próprios partidos. Com isso, chegam até a tentar excluir o presidente de eventos para concentrarem os holofotes em si. O drible também tem a intenção de evitar o contágio da alta rejeição de Temer, especialmente em estados do Norte e do Nordeste.

Por enquanto, estão sendo costuradas visitas para os próximos dias a São Paulo, Minas Gerais, Piauí e Pará. Neste último, Temer participará de uma cerimônia para regularização fundiária. Simbolicamente, vai contar a algumas centenas de paraenses que as casas e terras que eles temem perder por falta de documentação regular estarão salvas.

PRÉ-CANDIDATOS REAGEM

A ação na Segurança Pública no Rio é vista como um ponto de virada. O próprio marqueteiro do presidente afirmou que ele jogou “todas as fichas” na intervenção. Durante uma viagem de volta do Rio, Temer compartilhou com alguns ministros que sua ideia é “acompanhar de perto” o trabalho das forças federais. Disse ainda que, se for possível, quer ir semanalmente conferir a ação in loco. Na campanha publicitária iniciada pelo Planalto, o mote é “o governo que está tirando o país da maior recessão da sua história, agora vai tirar o Rio de Janeiro das mãos da violência”.

Tanto aliados quanto adversários passaram a reconhecer Temer como um potencial candidato. Não só por estar no cargo e dispor da máquina federal, mas também por comandar o PMDB, que possui uma forte estrutura partidária. A aprovação presidencial, porém, ainda é muito baixa, de menos de um dígito nas pesquisas.

As movimentações de Temer foram observadas pelos demais pré-candidatos à Presidência. O expresidente Lula disse acreditar que a intervenção no Rio é um sinal de que Temer quer disputar:

— Acho que o Temer está encontrando um jeito de ser candidato a presidente da República. E eu acredito que ele achou que a segurança pública pode ser uma coisa muito importante para pegar um nicho de eleitores do Bolsonaro — disse Lula, em entrevista à “Rádio Itatiaia”.

O deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) postou um vídeo em suas redes sociais afirmando que “Temer já roubou muita coisa aqui, mas o meu discurso não vai roubar, não”. O presidente do PSDB e governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, outro possível rival no pleito, afirmou que Temer tem o direito de ser candidato

Uma das pessoas mais próximas do presidente, o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral) é apontado no Planalto como o futuro coordenador de uma eventual campanha à reeleição. Um dos principais articuladores da intervenção no Rio, foi ele quem fez relatos ao presidente sobre a situação de descontrole na segurança, sobretudo na capital. Escalado por Temer, esteve no Rio para falar com Luiz Fernando Pezão e levou o governador a Brasília para participar da reunião com o presidente que definiu a medida na semana passada.

Entre os militantes do partido, o clima de empolgação em torno da candidatura de Temer tem crescido nas últimas semanas. De grupos no WhatsApp a reuniões de núcleos internos, filiados mais engajados contam que as movimentações têm contagiado a militância.

— Não só os núcleos internos do partido, mas muitos dirigentes da Executiva, deputados e senadores da legenda que antes eram avessos à ideia de Michel ser presidenciável, agora já estão mais abertos, mais simpáticos à proposta — relata um peemedebista.

A provável candidatura tem levado assessores e coordenadores de grupos internos do partido a incentivar os filiados a participarem ativamente de enquetes lançadas em redes sociais para melhorar a imagem do peemedebista. (Colaborou Fernanda Krakovics)​________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

 

Sem resultados para mostrar

Cleide Carvalho

22/02/2018

 

 

Por duas vezes secretário de Segurança em São Paulo, Temer não reduziu índices de violência no estado

-SÃO PAULO- O ano era 1992. No dia 2 de outubro, 111 presos foram mortos dentro do Pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo, fuzilados por policiais militares, no maior massacre de detentos já ocorrido no país. Seis dias depois, Michel Temer assumiu a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a convite do então governador Luís Antônio Fleury Filho. Pouco depois da posse, reuniu os comandantes da PM para transmitir “apoio total” à corporação.

Já empossado, em entrevista, disse que os envolvidos no massacre do Carandiru deveriam descansar.

— Os militares envolvidos em confrontos como os do Pavilhão 9 da Casa de Detenção merecem repousar, merecem descansar e ser submetidos a tratamentos psicológicos. O choque do dia a dia é uma tarefa ingrata e eles precisam de repouso e meditação — disse, na época.

Temer foi secretário de Segurança de São Paulo em duas gestões e, em ambas, teve mais mérito na tentativa de apaziguar os ânimos entre polícia e sociedade do que na redução dos índices de criminalidade. No governo Fleury, ocupou o cargo de outubro de 1992 a novembro de 1993. Segundo dados do Mapa da Violência, elaborado pelo professor Julio Jacobo, em 1992 os homicídios chegaram a 11.073 no estado. Em 1993, foram 11.824. Em 1994, com Temer já fora, foram 11.036 mortes.

Entre janeiro de 1984 a fevereiro de 1986, Temer foi secretário de Segurança no governo de Franco Montoro. Em 1983, São Paulo registrou 6.588 mortes violentas (exceto acidentes de trânsito). Em 1984, foram 8.289. No ano seguinte, 8.213. Os índices continuaram subindo depois.

Especialistas indicam que, à época, o tráfico era disputado por várias quadrilhas e a situação social do país não era boa, com alto índice de desemprego e inflação.

A atuação junto às polícias garantiu a Temer amizades duradouras, como a do coronel João Baptista Lima Filho, citado na delação da J&F como recebedor de recursos em dinheiro. Lima foi seu assessor na primeira gestão à frente da secretaria.

A Presidência informou que em 1985 os homicídios caíram 0,8%, e que Temer foi responsável pelas primeiras delegacias da mulher, de defesa do direito autoral e de combate ao crime racial. A assessoria de Temer também lembra que ele lidou com a “maior crise do sistema prisional”.