O globo, n. 30885, 27/02/2018. País, p. 6

 

Lobão pediu à Camargo contratação de ‘empresa amiga’, diz delator à PF

Mateus Coutinho

27/02/2018

 

 

Construtora atendeu senador após ter feito doação inferior à solicitada por ele

-BRASÍLIA- Logo após ser reeleito, em 2010, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) pediu que a Camargo Corrêa contratasse uma “empresa amiga”, o que acabou sendo efetivado naquele ano para uma obra da usina hidrelétrica de Jirau, na qual a Camargo atuava. As informações são do mais recente depoimento do ex-presidente da Camargo Corrêa e delator João Ricardo Auler à Polícia Federal, no dia 12 de dezembro.

Segundo a PF, empresas dos sócios da companhia indicada pelo parlamentar fizeram doações eleitorais no mesmo ano para a campanha de dois políticos do PMDB em Rondônia, onde fica a usina. O pedido do senador teria sido feito após a empreiteira doar oficialmente apenas R$ 1 milhão dos R$ 3 milhões que o parlamentar havia solicitado antes para sua campanha à reeleição.

Em seu depoimento, Auler não fala em pedido de propina de Lobão, mas diz que mantinha reuniões com ele na época pois estava dedicado “quase que exclusivamente” ao projeto da de Jirau, no Rio Madeira, que tinha a Camargo no consórcio. Ele confirmou que, em um primeiro momento, o senador fez um pedido a ele para que a Camargo desse uma contribuição de R$ 3 milhões para sua reeleição, depois de já ter deixado o Ministério de Minas e Energia.

Auler, que era diretor da Camargo à época, disse ter levado a demanda ao então presidente da empreiteira Antônio Miguel, que autorizou o repasse de R$ 1 milhão, doado oficialmente. Ao voltar ao senador, junto com o gerente de Relações Institucionais da empresa Gustavo da Costa Marques, Auler contou que ouviu uma reclamação do parlamentar e depois o pedido.

“Houve inicialmente uma frustração por parte do senador em razão da redução do valor. Que na mesma reunião, Edison Lobão entregou ao declarante um cartão de uma empresa que prestava serviços de engenharia, mencionando que gostaria que a Camargo Corrêa contratasse a ‘empresa amiga’”, relatou Auler à PF. O empresário contou que, ao fim da reunião, foi apresentado à pessoa cujo nome constava no cartão, “Ralfe”, mas disse não se recordar da fisionomia dele.

DOAÇÕES AO PMDB DE RONDÔNIA

O pedido foi encaminhado ao seu superior na época, responsável pelas obras de Jirau, Marco Antonio Bucco e, a partir daí, Auler disse não ter tomado conhecimento dos desdobramentos do caso. No depoimento, o delator não citou qual seria a “empresa amiga”, mas disse que em pesquisas internas os advogados da Camargo identificaram a empresa associada a “Ralfe” como sendo a Brasil Central Engenharia, uma empreiteira de Cuiabá. Sua defesa, inclusive, entregou à PF uma cópia do contrato com a empresa no valor de R$ 3,8 milhões para os serviços de “carga, transporte, descarga e espalhamento de material comum” para as obras civis de Jirau.

A Camargo também entregou à PF cópias das notas fiscais emitidas dos serviços que teriam sido prestados pela Brasil Central. Apesar da documentação, a empresa informou à PF que não constatou nenhuma propina referente ao empreendimento de Jirau. Fontes ligadas à investigação confirmaram ao GLOBO que, apesar de estar ligado à usina, o contrato foi parte de um acerto com o senador referente a outras obras do setor elétrico. À PF, Auler disse ainda que a indicação do senador não tinha importância para o andamento de Jirau, pois ele não estava mais no ministério, e que não recebeu nenhuma outra indicação de empresa para ser contratada pela Camargo.

Diante das informações do delator, a PF fez um levantamento sobre a Brasil Central Engenharia e constatou que a empresa está em nome de Mara Gil Dias e Ana Paula Gil Dias, que são respectivamente mulher e filha do empresário Filadelfo dos Reis Dias, que compôs o quadro societário da empresa em 2008.

Chamou a atenção da PF o fato de que os três participaram como sócios de várias empresas de energia e saneamento entre 2009 e 2011, mas em 2010, tais empresas só fizeram doações eleitorais a candidatos de Rondônia. Foram doados oficialmente pela Brasil Central R$ 100 mil para a campanha do senador Valdir Raupp (PMDB), e R$ 200 mil para um candidato a deputado estadual pelo PCdoB.

Por meio da Eletricidade Paraense, que segundo a PF teve como sócias Mara ou Ana Paula Gil, foi feita uma doação de R$ 150 mil à campanha do governador Confúcio Moura, candidato do PMDB que foi eleito em 2010.

O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende Lobão e Raupp, informou que o ex-ministro já negou a versão apresentada por Auler e disse que o depoimento não apresenta nenhuma prova contra seu cliente. Já em relação a Raupp, o advogado afirmou que ele não conhece nenhuma das empresas citadas pela Camargo nem as pessoas ligadas a essas empresas e não entendeu a citação ao seu nome.

Por meio de sua assessoria, o governador Confúcio Moura disse que todas as doações que recebeu foram declaradas à Justiça Eleitoral, que “jamais pediu qualquer ajuda a Edison Lobão” e que “não exerce nem nunca exerceu qualquer influência sobre contratações de qualquer empresa”.

A reportagem procurou Mara e Ana Paula Gil Dias, por telefone e e-mail, mas não obteve resposta. Na Brasil Central Engenharia, uma funcionária informou que iria entrar em contato com Filadelfo Dias, mas não retornou.

A Camargo Corrêa, por sua vez, informou que “segue colaborando com as autoridades de forma permanente e respeitando o sigilo exigido” pela Justiça.

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TJ do Rio é o que mais gasta com alimentação

Jeferson Ribeiro

27/02/2018

 

 

Cada magistrado recebe o benefício de R$ 1.825 por mês para subsidiar refeições

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) é o que mais gasta anualmente com auxílio-alimentação entre todos os tribunais do país. Em 2017, os magistrados fluminenses receberam mais de R$ 18,8 milhões para subsidiar refeições. Cada juiz recebe mensalmente R$ 1.825, o que dividido pelo número de dias úteis do mês daria, em média, R$ 82,95 por dia.

Esse é um dos benefícios adicionais que permitem aos magistrados fluminenses receber salários acima do teto constitucional. Reportagem do GLOBO no início do mês mostrou que o TJ do Rio é o mais benevolente do país no pagamento de verbas indenizatórias aos magistrados, repassando até seis auxílios diferentes. São pagamentos que cobrem gastos com moradia, transporte, alimentação, pré-escola dos filhos, educação e saúde.

Apesar do valor mensal elevado, os magistrados fluminenses recebem menos que os amapaenses e os capixabas. No Amapá, o auxílio-alimentação é de R$ 2.894 e, no Espírito Santo, R$ 1.925,01. Só em dezembro, os tribunais de Justiça gastaram mais de R$ 12,6 milhões com esse benefício para os magistrados, considerando os valores apresentados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O pagamento de auxílio-alimentação foi autorizado pelo CNJ em 2011. Mas, em 2013, o benefício rendeu uma bolada para os magistrados de todo país, depois que os conselheiros permitiram que os tribunais pagassem o valor retroativo aos juízes desde 2004 em alguns casos e, desde 2006, em outros. No Rio, todos os juízes receberam 12 parcelas mensais de R$ 5 mil, entre julho de 2012 e julho de 2013, totalizando R$ 60 mil retroativos a 2004, segundo o TJ.

A decisão do CNJ foi contestada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2013. O ministro Dias Toffoli pediu vista do processo e devolveu seu voto em 2015. Desde então, a ação não foi pautada pelo Supremo, e os TJs continuam repassando o benefício para os magistrados mensalmente.

No início do mês, O GLOBO mostrou que o Rio também era líder em quantidade de benefícios para juízes. Os magistrados fluminenses têm direito a auxílio-moradia, auxílio-saúde, auxílio pré-escola, auxílio-educação, auxílioalimentação e auxílio-transporte. Somente em dezembro, essas indenizações custaram mais de R$ 6,9 milhões aos cofres fluminenses. Do total, R$ 3,7 milhões foram gastos em auxílio-moradia, que, se for multiplicado por 12 meses, chega a R$ 44,4 milhões.